Novo livro de Cyril Pedrosa é “fábula política” sobre a utopia na Idade Média

O desenhador francês lusodescendente Cyril Pedrosa, autor do livro de banda desenhada “Portugal”, lançou, a 06 de setembro, em Paris, o primeiro volume de uma nova obra que descreve como “uma fábula política”.

O livro, que assina com Roxanne Moreil, chama-se “L’Âge d’Or” e vai contar com dois volumes: o primeiro chegou às livrarias francesas a 07 de setembro – um dia depois do lançamento na Librairie La Régulière, em Paris – e o segundo está previsto para março de 2020.

A história é uma “fábula política”, situada na Idade Média, em que uma princesa é afastada do trono, após a morte do pai, condenada ao exílio e refugia-se numa comunidade feminina, onde descobre que o seu destino está ligado a um livro mágico intitulado “L’Âge d’Or”.

“Considerámos que podíamos falar da utopia e da possibilidade de mudar o mundo mas situando-a noutra época. É uma fábula política, em que o tema é a utopia e como mudar o mundo, mas fizemo-lo com uma história com aventura, fantasia, magia e combates. Queríamos que fosse divertido e não simplesmente teórico”, descreveu à Lusa o desenhador e coargumentista do livro.

Ao princípio, Cyril Pedrosa e Roxanne Moreil “queriam escrever uma história sobre a Esquerda francesa” porque estavam “num momento de desânimo em relação à política em geral e com a impressão que era quase impossível imaginar que o mundo se tornasse melhor”, mas foi ao ler um livro sobre as revoltas camponesas no fim da Idade Média que a possibilidade de escrever sobre a utopia se cimentou. “Pensámos que se falássemos sobre a utopia na época medieval – em que as pessoas pensavam que o mundo nunca ia mudar, que existiriam sempre reis e rainhas, que estariam sempre ao serviço dos nobres e que as terras nunca lhes pertenceriam – talvez conseguíssemos fazer compreender às pessoas que é possível as coisas mudarem”, continuou o lusodescendente.

O percurso da princesa Tilda, que quer reconquistar o trono patriarcal, cruza-se com uma comunidade feminina que é um exemplo de autogestão sem qualquer hierarquia e com revoltas populares contra o feudalismo em busca da igualdade social.

No seio da intriga, a lenda sobre a ‘Idade do Ouro’, uma época em que todos eram iguais, veiculada pelos textos de um livro misterioso capaz de mudar o mundo, numa alegoria ao poder do conhecimento e ao seu peso no despertar de consciências.

Em termos gráficos, Cyril Pedrosa quis desenhar uma história “fluida” e não quis ficar preso às referências que o influenciaram, como o universo pictórico medieval e renascentista e o imaginário do pintor flamengo Pieter Bruegel. “Fui à procura de ideias nas iluminuras, nas tapeçarias, nos retábulos, nos trípticos religiosos, nos vitrais. Por exemplo, nos vitrais, os Evangelhos foram desenhados de maneira a que a massa dos crentes que não sabia ler pudesse compreender a história. Há personagens representadas várias vezes na mesma cena e é bastante expressivo”, contou.

Como nos vitrais medievais, o livro tem imagens em que as mesmas personagens se desdobram numa só paisagem, outras em que joga com a perspetiva renascentista e outras em que se multiplicam efeitos cinematográficos de campo-contracampo, planos panorâmicos, largos, apertados e grandes planos.

Há também páginas duplas e imersivas, muitas expressionistas e outras quase abstratas, e as cores luminosas contrastam com os fundos escuros, “como num bordado”, numa paleta que não busca o realismo e que joga com as composições dos tons “para criar um ambiente feérico”.

Cyril Pedrosa gostaria que “L’Âge d’Or”, publicado pelas Éditions Dupuis em França, fosse editado em Portugal, à semelhança de “Portugal” e “Três Sombras”, os trabalhos premiados no Festival Internacional de Banda Desenhada de Angoulême e traduzidos em mais de uma dezena de países.

Várias pranchas originais do primeiro volume de “L’Âge d’Or” vão estar em exposição na Galerie du 9ème Art, em Paris, entre 19 de outubro e 10 de novembro.

Cyril Pedrosa, de 45 anos, nasceu em Poitiers, é neto de portugueses e, em 2011, lançou “Portugal”, uma BD de quase 260 páginas de um percurso “aos ziguezagues” pela história dos seus avós emigrantes. Em 2015, o desenhador publicou “Equinoxes”, que não foi ainda traduzido em Portugal, e em 2016 lançou um ‘leporello’ (livro em acordeão), com Tangui Jossic, que era uma reinterpretação de quatro quadros de Pieter Bruegel e que foi o primeiro de uma coleção de livros que adaptam pintores clássicos para o mundo da banda desenhada.

 

 

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