Emmanuel Demarcy-Mota: “Nunca convidei Portugueses para o Théâtre de La Ville por ser português”

O encenador e Diretor do Théâtre de La Ville, em Paris, Emmanuel Demarcy-Mota, defende que a sua motivação para incluir artistas portugueses na cena teatral francesa foram as “grandes qualidades” de uma nova geração, em período de crise.

Com mais de 60 espéctaculos e cerca de 300 artistas portugueses ao longo dos dez anos na iniciativa Chantiers d’Europe, que organiza todos os anos no Théâtre de La Ville, uma das salas de referência capital francesa, Demarcy-Mota afirma nunca ter puxado pela sua dupla nacionalidade.

“Nunca convidei os Portugueses por ser português. Foi porque vi grandes qualidades e uma geração que estava a aparecer com quem é ótimo estar em diálogo, aqui em Paris e noutros pontos do Mundo”, afirmou o encenador, em entrevista à Lusa.

Entre os artistas convidados por Emmanuel Demarcy-Mota contam-se o ator, encenador Tiago Rodrigues, Diretor artístico do Teatro Nacional D. Maria II (e Prémio Pessoa 2019), companhias como Teatro Praga e Hotel Europa, os músicos Camané, Cristina Branco e Gisela João, entre outros.

A comemorar uma década desta iniciativa, que começou em 2010 e leva o público parisiense a ver peças oriundas de vários pontos da Europa, Demarcy-Mota – filho da atriz portuguesa Teresa Mota e do encenador francês Richard Demarcy – recorda que tudo começou com um convite a artistas italianos, mas a emergência política e económica na Europa fez o projeto progredir.

“O Chantiers d’Europe começou com os Italianos, não com os Portugueses. Depois dessa primeira ligação em 2010, já estávamos a sentir um problema político em Itália. E isso tornou-se uma prioridade. […] Um ano depois pensei que tínhamos de trabalhar com artistas de vários países da Europa e pareceu-me muito claro que havia uma criatividade muito forte que estava a nascer em Portugal”, contou o franco-português.

Envolveu-se então na parceria que já existia entre as autarquias de Lisboa e de Paris, considerando que Portugal viveu “um momento muito duro”, tendo depois chamado outros artistas de países em crise, como a Grécia, a mostrar as suas criações na capital francesa.

“A França também sentiu a crise de 2008, tínhamos de criar um tempo que era o do Chantier d’Europe, que é um movimento de Europa em construção”, explicou, dando à palavra um duplo sentido já que ‘chantier’, em francês, é literalmente ‘estaleiro’, um local em obras.

Quanto à atual situação em Portugal, Demarcy-Mota tem uma visão positiva da gestão política do país. “Acho que dentro do espaço europeu, o trabalho que foi feito em Portugal ao nível político é de uma estabilidade exemplar, em que há capacidade de diálogo. Mesmo se os Portugueses acham que não, eu comparo com o espaço europeu, e é evidente que as coisas podem ser melhores. Mas o que se passa em França com a questão da Marine Le Pen, o que se passa na Hungria, na Polónia, mostra que houve um equilíbrio importante”, referiu.

Também responsável pelo Festival de Outono, o maior festival artístico de Paris, Demarcy-Mota diz estar a preparar a abertura dos seus espectadores, fazendo-os experimentar o teatro, a música ou a dança, através de artistas vindos de todo o Mundo.

“Temos de saber exatamente que estamos a viver um momento absolutamente único e temos a responsabilidade de trabalhar sobre a abertura de cada espetador e do público sobre as diferentes artes do mundo, e isso é um trabalho quotidiano. Até a aposta na infância faz sentido dentro disso, porque trouxemos espetáculos portugueses para crianças de 4 anos e foram momentos maravilhosos ao ver crianças francesas nessas representações”, indicou.

Quanto ao seu próprio futuro, Demarcy-Mota não faz muitas coagitações. Aceitou no final de 2019 ser Presidente da Temporada cruzada entre Portugal e França, que vai acontecer entre 2021 e 2022, e está “feliz” no comando no Théâtre de La Ville, desde 2009. “Estou muito feliz por ter conseguido que o Théâtre de la Ville seja um sítio onde há um programa de arte e ciência, onde há programas para a juventude, um programa europeu e internacional. Com 250 mil espetadores por ano, ou seja, cerca de 2,5 milhões de pessoas desde que aqui cheguei”, concluiu.

 

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LusoJornal