“Partir, revenir et faire circuler, Mobilités des gens de Santo Antão”, de Élisabeth Defreyne – Um estudo sobre o eterno movimento cabo-verdiano



Enquadrado na excelente coleção “Anthropologie Prospective”, da editora l’Harmattan, encontra-se uma obra dedicada ao constante movimento do povo de Cabo Verde. Da autoria de Élisabeth Defreyne, doutorada em Antropologia, e atualmente, após vários anos a trabalhar no domínio da exclusão social, investigadora na Universidade Católica de Lovaina, este livro conduz o leitor pelas terras vulcânicas ao encontro de um povo para quem a emigração, a partida, a ausência e, por vezes, o regresso fazem parte da cultura e do dia a dia. Como prova esta sua publicação, o trabalho de Defreyne incide sobre a mobilidade, a família, as relações com o ambiente no contexto das alterações climáticas e, Cabo Verde é o melhor exemplo, a insularidade.

O arquipélago de Cabo Verde, antiga colónia portuguesa situado ao largo das costas senegalesa e mauritana, a menos de 500 quilómetros do continente, tem a sua população espalhada um pouco por todo o mundo. Segundo dados relativos a 2020, Cabo Verde tem 187 mil emigrantes, o que representa 32% da população de Cabo Verde. A emigração feminina, 102 mil mulheres, representa 55% do total de emigrantes e é superior à masculina, 85 mil homens, o que compõe os restantes 45%. Os principais países de destino dos emigrantes cabo-verdianos são Portugal, para onde vão 36%, seguido dos Estados Unidos, 19%, e da França, 14%. Não se deverá esquecer o caso do Luxemburgo, pois a relevante emigração cabo-verdiana no Grão-Ducado é a mais importante se levarmos em conta os países fora da União Europeia.

Partir, regressar e circular é, portanto, uma realidade perfeitamente normalizada no arquipélago, transformando Cabo Verde num caso de estudo emblemático no que diz respeito ao movimento populacional. Na ilha de Santo Antão, 45 mil habitantes, esta tendência atinge proporções impressionantes. A vida da população de Santo Antão, ilha a norte do arquipélago, é feita em constante movimento.

Através de uma experiência etnográfica realizada ao longo de vários anos e em vários locais (Cabo Verde, Luxemburgo e Bélgica), a autora mergulha-nos num mundo onde a migração é transmitida como uma herança que atinge todas as famílias e todos os estratos sociais. E onde a deslocação se torna uma condição indispensável para a perpetuação dos laços entre os indivíduos, quer ao nível da família, quer ao nível da sociedade no seu conjunto.

Uma primeira estadia em 2008, ao longo de cinco meses consecutivos, na ilha de Santo Antão, no quadro de um inquérito sobre o ainda embrionário turismo na ilha, permitiu a Defreyne tomar contacto com esta realidade de perpétuo movimento e, em 2011, ela regressou à ilha já com um estudo de doutoramento sobre esta temática em mente.

Uma leitura extraordinária durante a qual se sente o amor da autora por Cabo Verde e que permite ao leitor compreender melhor uma sociedade e uma cultura tão próxima, mas ainda tão desconhecida dos restantes povos lusófonos.

LusoJornal