Saúde: As Doenças sexualmente transmissíveis estão a aumentar


As Doenças sexualmente transmissíveis (DST) estão a aumentar na Europa e em Portugal, afetando principalmente os jovens entre 20 e 24 anos, revela o Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC).

Este aumento pode estar relacionado com vários fatores, incluindo a diminuição do uso de preservativos e mudanças nos comportamentos sexuais.

As DST mais frequentes, como a gonorreia, a clamídia e a sífilis, podem ter várias explicações para a sua prevalência. Estas doenças são frequentemente assintomáticas, o que dificulta a sua deteção e tratamento atempado, contribuindo para a sua disseminação.

Na Europa, registaram-se em 2022, 70.881 casos de gonorreia; um aumento de 48% comparando com 2021 e de 59% face a 2018.

Em Portugal, subiram de 55 casos em 2021 para 63 em 2022. Em relação à sífilis congénita (causada pela transmissão da mãe para o feto) também aumentou, embora em Portugal tenha caído de 15 casos em 2021 para 14 em 2022.

Em Portugal, a notificação de casos de gonorreia aumentou de 1.252 em 2021, para 2253 em 2022. A notificação de casos de clamídia subiu de 914 casos em 2021 para 1.501, em 2022.

A sífilis também aumentou de 1.144 casos em 2021, para 1.534 em 2022. Em relação a Portugal, o ECDC alerta que a maioria das notificações de clamídia envolvem mulheres com idades entre os 20 e os 24 anos, em casos estudados entre 2018 e 2022. Mas o maior aumento de transmissão deu-se entre homens que fazem sexo com homens, tendo o número de casos notificados aumentado em 72%.

Os jovens não usam preservativo

O problema é mesmo esse, a desinformação.

Há quem pense que as DST são tratáveis, dando até a ideia de que são curáveis. Os jovens têm uma maior confiança na medicina e, por isso, têm atitudes de maior risco. Há uma falsa sensação de segurança, os jovens percebem que existe tratamentos e prevenções, que passam por vacina e medicamentos, e acham que o uso de preservativo é secundário e pode ser ignorado.

Entretanto, com o aparecimento das terapêuticas antirretrovirais, o VIH tornou-se uma infeção crónica e fomos assistindo a um retomar dos comportamentos de risco.

Mas este aumento recente também pode decorrer do número dos exames e dos rastreios. Os dados de 2022, são em parte devidos ao aumento dos diagnósticos e notificações.

Não se tem valorizado a proteção, nomeadamente o uso do preservativo, e aumentaram algumas práticas de risco, sobretudo nos jovens ou quem tenha relações sexuais com múltiplos parceiros.

Mais velhos também não escapam

O aumento das DST na terceira idade está relacionado com o aumento da expectativa de vida da população, com os fármacos que ajudam no desempenho sexual e a reposição hormonal que aumentou a qualidade e a frequência das relações sexuais. Além de uma notória falta de estratégias de prevenção das DST direcionada a este público em concreto.

Nesta faixa etária, é verificado com frequência o abandono do uso de preservativo, pelo medo de perder a ereção.

Além disso, as mulheres são mais vulneráveis por características biológicas; a superfície vaginal exposta ao sémen é relativamente extensa, e no caso da transmissão do HIV o sémen apresenta maior concentração de HIV do que o líquido vaginal. No caso das mulheres é possível verificar que o cuidado em relação ao sexo seguro vincula-se principalmente à possibilidade de uma gravidez, porém na velhice esse receio deixa de ocorrer, favorecendo uma maior liberdade para o exercício da sexualidade sem restrições em termos de prevenção.

A gonorreia, a clamídia e a sífilis são as DST mais frequentes

As três DST mais comuns reportadas transmitem-se através do contacto sexual vaginal, anal ou oral com alguém que esteja infetado. Transmissão essa que é facilitada se não se usar preservativo e se se tiver vários parceiros sexuais.

Em Portugal, segundo a DGS, o maior número de casos regista-se em jovens adultos, maioritariamente do sexo masculino e residentes nas regiões de Lisboa e Vale do Tejo e do Norte.

Muitas vezes não demonstram sintomas, mas os sinais e sintomas mais habituais são corrimento anormal na vagina, pénis ou ânus, ardor ou dor a urinar, dor durante o ato sexual. Se não forem tratadas – o que é feito, nestes três casos, com antibióticos -, algumas destas infeções podem provocar complicações, como infertilidade.

Em caso de infeção, deve procurar o médico e fazer as análises e os tratamentos recomendados e deve informar os seus parceiros e/ou parceiras para que procurem uma consulta médica onde serão aconselhados e tratados, e é recomendado o uso de preservativo em todas as relações sexuais.

Clamidia

A infeção bacteriológica por Chlamydia trachomatis é uma das DST mais comuns na Europa e a sua taxa de infeção aumenta todos os anos

Afeta frequentemente homens e mulheres jovens, com idades entre os 16 e os 25 anos.

Transmite-se através do sexo vaginal, anal ou oral, e inclusivamente de mãe para filho durante a gravidez.

É chamada a “infeção silenciosa” já que normalmente não apresenta sintomas.

Pode infetar o colo do útero, a uretra e o reto. Os principais sintomas são: fluxo abundante, sangramento anormal e dores ao ter relações sexuais ou a urinar.

Quando não tratada, esta infeção pode levar a problemas mais graves. No caso das mulheres, a bactéria pode progredir em direção ao útero, trompas e ovários, provocando infertilidade e uma grave infeção designada por doença inflamatória pélvica. Nos homens a complicação mais comum é a prostatite, infeção da próstata.

O tratamento é efetuado com recurso a antibióticos.

Gonorreia

É uma infeção bacteriológica, pela Neisseria gonorrhoeae, que pode infetar principalmente a uretra, o colo do útero, o reto e o ânus.

A transmissão também pode ser feita entre mãe e filho durante o parto.

Pode ser transmitida mesmo que a pessoa infetada não apresente sintomas.

Os sintomas normalmente surgem entre 1 e 14 dias após a relação sexual.

Os sintomas podem ser corrimento uretral, ardor ao urinar, fluxo vaginal amarelado e irritação do ânus.

A gonorreia pode ser totalmente curada, desde que seja diagnosticada corretamente e tratada.

O tratamento é efetuado com recurso a antibióticos.

Porém, quando não tratada, a gonorreia pode levar a complicações como infertilidade ou doença inflamatória pélvica.

Sifilis

Causada pela bactéria Treponema pallidum, que penetra no organismo através das membranas mucosas, como as da vagina, da boca ou através da pele.

É transmitida via sexo oral, vaginal e anal, ou em alguns casos, através do contacto com a pele de alguém infetado

O período de incubação dura de 9 a 90 dias (a média são 2 a 4 semanas).

Pode também afetar o feto durante a gravidez, causando defeitos congénitos ou outros problemas.

Inicialmente surge uma úlcera (ferida), em geral única, dura, tipicamente indolor. A úlcera localiza-se, na mulher, na vagina e, sobretudo no colo uterino (em regra sem sintomas). No homem, esta úlcera encontra-se, mais vezes, no sulco balanoprepucial (sobre o pénis).

Os sintomas são semelhantes aos da gripe, tornando-se por vezes difícil de identificar.

Quando chega aos gânglios linfáticos, propaga-se por todo o organismo através do sangue.

A pele é o órgão mais atingido em 90% dos casos, surgindo uma erupção cutânea muito característica, que atinge as palmas das mãos e as plantas dos pés.

A penicilina, administrada por via intramuscular, é o antibiótico normalmente utilizado

Gonorreia regista maior aumento entre mulheres com 20/24 anos

A maior incidência de infeção gonocócica ocorre entre adultos de 20 a 24 anos, tanto em homens quanto em mulheres. Isto provavelmente deve-se ao aumento do número de parceiros sexuais, diminuição do acesso ou utilização de cuidados de saúde e á não utilização do preservativo.

Apesar de poder estar assintomático, o portador da infeção continua a transmiti-la. Em caso de transmissão a bactéria ascende da vagina para o colo do útero e trompas de Falópio. Esta transferência do pus para a cavidade vaginal tem como consequência mais grave a infertilidade.

Se, durante o parto, a mãe estiver infetada com gonorreia, sem o saber, o recém-nascido é contaminado e apresentará sinais de conjuntivite gonocócica que podem em casos extremos, ser até de cegueira.

Quando se trata de um homem, a contaminação ascende pelo pénis, podendo causar infeção no testículo ou na próstata, podendo levar à infertilidade.

Como é que os jovens se podem prevenir?

As medidas eficazes para prevenir estas doenças são o uso do preservativo, educação sexual aos jovens e a vacinação contra as infeções para as quais existem vacinas, como a do HPV e a da Hepatite B, bem como fazer o rastreio.

O controlo destas infeções tem sido sempre muito difícil e que, ao longo dos anos, as medidas para as controlar têm tido uma eficácia muito relativa. Portugal não tem um plano de prevenção das doenças sexualmente transmissíveis.

O preservativo usado de forma consistente em todas as relações permite a diminuição das infeções de transmissão sexual só que tem sido difícil que seja normalizada a sua utilização.

Logo, são importantes campanhas de sensibilização e de prevenção para todas as idades. Reforçar a educação para o sexo seguro e saudável.

Essencialmente, é necessário redefinir estratégias, numa altura em que se tem descurado a proteção, nomeadamente o uso do preservativo.

Educação sexual nas escolas

As escolas em Portugal têm clara escassez de educação sexual.

É urgente que haja uma reforma no ensino, na medida em que esta disciplina deve ser introduzida nos horários escolares, das idades mais novas às mais velhas, de forma acessível e gratuita em todo o país.

A educação sexual é uma disciplina de afetividade, de conhecimento e de exploração do próprio corpo e da saúde, tentando evoluir progressivamente de valores mais conservadores e antiquados ainda muito enraizados em certos sectores da sociedade, que impedem estas aprendizagens e desenvolvem tabus em torno das mesmas.

Sensibilizar os filhos

Acho que a altura em que cada um começa a ter curiosidade é a altura ideal.

Lembro-me de um dia em que fui a uma escola ensinar e informar uns meninos de cinco anos de como se faziam bebés. Porque esse era o projeto dos cinco anos.

Não precisamos de ter um momento solene e nem adianta fazer um discurso ou uma aula sobre o tema, achando que já está resolvido.

Estarmos atentos às oportunidades para abordar o assunto da forma mais natural possível.

O mais importante é lidar com os assuntos de forma consistente e natural.

Segundo um estudo, os jovens que têm conversas sobre sexo em casa desde cedo tendem a ter mais cuidado com a segurança e saúde quando começam a vida sexual.

Em todas as fases, os pais precisam de ser honestos e objetivos, respondendo às perguntas com linguagem adequada ao universo infantil.

Livros didáticos sobre o corpo humano, voltados para o público infantil, podem ajudar a explicar a reprodução humana.

.

Dra. Irina Ramilo

Médica ginecologista/obstetra

Hospital Lusíadas Lisboa