Opinião: O que pensar da vida associativa dos Portugueses de França?


Tenho acompanhado a criação e a evolução de muitas associações francesas dirigidas por Portugueses, mas atualmente não é fácil para mim averiguar, com transparência e clareza, o que se faz nestas ditas associações.

Muitas delas contêm no seu nome “Associação desportiva, cultural e recreativa dos Portugueses”… mas as suas atividades não correspondem em nada ao título de registo na “Préfecture” ou na “Chambre de Commerce” – pois há algumas que também se transformaram em “sociedades”.

Muitas destas associações intitulam-se de “desportivas”, mas não têm nenhuma atividade permanente ou periódica que o possa justificar. E se falarmos no aspeto “cultural”, temos de fazer um grande esforço para pensarmos que só preservar as tradições regionais folclóricas e outras atividades como a gastronomia regional, são estas a suas atividades plenamente culturais. Na parte recreativa, também é difícil de se encontrar aqui atividades criativas que justifiquem esse nome.

O Governo português a está a convidar, de novo, os dirigentes a participarem num tempo de formação para melhor gerirem as associações e para serem também uma plataforma e um veículo cultural no futuro, em diversos aspetos.

Creio que serão poucos os que se vão inscrever para participarem, mesmo se as despesas são todas pagas. Pois os requisitos que lhes vão ser pedidos para participarem, a maioria não os possui, então não será possível participarem nestes encontros de formação. Mas só assim o Governo português pode justificar esta ação que está a ser feita às associações portuguesas no estrangeiro.

Quantas são as associações que estarão inscritas no Ministério dos Negócios Estrangeiros, em Portugal? E também na Prefeitura, em França, com as questões administrativas e fiscais em dia?

Devem ser muito poucas as associações que estão devidamente informadas de todos os requisitos necessários para poderem usufruir de subsídios e ajudas, aos quais se poderiam candidatar para a organização de eventos e outras atividades culturais.

Dezenas de anos decorreram, mas a evolução do funcionamento das associações não mudou – pelo contrário, só se transformaram pouco a pouco em pequenas “tascas”, e de onde mesmo o folclore vai desaparecendo por múltiplas razões, mas quase sempre por interesses pessoais de certos dirigentes e outros responsáveis. Conflitos de interesses, e muitas vezes questões numerárias, que levaram até à dissolução de associações.

Em certos casos, o título de associação até já não faz sentido, nem os valores, visto que o conteúdo e a organização da dita associação, não passa de uma organização comercial camuflada, mas sempre com o “estatuto” de associação, coberta pela Lei francesa de 1901 que gere as organizações sem fins lucrativos.

Estranho é que as autoridades francesas aceitem esta situação, mas é talvez para estarem “em paz e em sossego” com a Comunidade.

Estas situações são hoje uma realidade, onde um grupo de pessoas fazem os seus negócios, durante meses e anos seguidos, e ao abrigo da fiscalidade da Lei associativa de 1901, o que lhes permite, no final, o “desvio dos montantes” angariados por eles, em eventos festivos e outros mais, mas que os ditos valores, desaparecem sem deixar “rasto” ao longo dos anos.

Claro que muitas associações são exemplares no seu funcionamento, pois acolhem os recém-chegados, dando-lhes a informação que eles procuram, e também ajudas e acompanhamento. São lugares de encontro de amigos, onde se passam bons momentos de confraternização e onde se “apaga” um pouco a chamada Saudade. Vamos considerar que são pequenos cantinhos de Portugal, e onde sabe bem viver e com a alegria de se conviver em português.

Na sua maioria, as associações são autónomas no funcionamento, os locais e os seus custos, são custeados pelas cotas dos sócios e pelas receitas do quotidiano, com o funcionamento do bar e de outras atividades de restauração. Uma gestão rigorosa, e uma transparência regular dos dirigentes fazem com que estas associações tenham uma perenidade quase garantida, e também o seu lugar na vida associativa francesa e portuguesa.

Um bom relacionamento com as autarquias, provocado pelo acolhimento e os convites aos membros da municipalidade nos seus eventos, atividades e locais, durante o ano, favorecem um reconhecimento muito positivo da parte das autoridades, e em alguns casos favorecem as autorizações e ajudas, pondo ao dispor o material e os locais para que os eventos possam ser realizados nas melhores condições de segurança e muitas das vezes gratuitamente.

Assim vai a vida no “mundo associativo” português, em muitas regiões de França e de Navarra, mas mesmo tendo “histórias tristes” e “histórias alegres”, não deixam de serem associações de utilidade pública, de uma certa maneira para alguns e de outra maneira para outros.

Fico-me por aqui com os comentários, pois haveria muitas histórias para contar.

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Jorge Campos

Conselheiro das Comunidades Portuguesas

Eleito no círculo eleitoral das áreas Consulares de Lyon e de Marseille

LusoJornal