Biografia de Emídio Guerreiro com novos dados Resistência francesa, LUAR, PPD e vida em Paris

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A biografia de Emídio Guerreiro (1899-2005), do historiador Luís Farinha, revela novos dados sobre o homem que lutou contra sete ditaduras, foi líder do PPD, manteve “até ao fim” o nome simbólico de “Lenine” e realizou uma conferência de “matemática” chamada LUAR.

“É importante os portugueses conhecerem a vida deste homem que está sempre no mundo democrático e social, mas não está nem no socialismo revolucionário do Partido Comunista nem no socialismo em liberdade do PS mas sim no que designou ‘socialismo humanista’”, sustentou, em declarações à Lusa, o historiador Luís Farinha, autor do livro “Emídio Guerreiro – Sob o Despotismo da Liberdade”, que será lançado em janeiro numa edição da Assembleia da República.

Segundo o investigador, Emídio Guerreiro, formado em matemática, é desde jovem “um republicano mas com as aspirações a uma República democrática” e isso “vai notar-se quando se coloca à frente da Associação Académica do Porto formando o Centro Académico do Porto e em que se relaciona com ‘um certo tipo da maçonaria’, empenhada em captar elementos do Exército na resistência à ditadura”, numa referência à época em que ajudou a estabelecer a Loja Comuna, no Porto.

“Para ele ,trata-se de uma espécie de ‘maçonaria de dupla filiação’: é curioso que o nome simbólico de Emídio Guerreiro na Loja Comuna do Porto, formada em 1928, é ‘Lenine’ (Vladimir Ilitch Ulianov, líder dos comunistas da URSS). Penso que haverá poucos ‘Lenines’ como nome simbólico na maçonaria, mas ele vai manter esse nome simbólico sempre”, recorda o historiador.

De acordo com Luís Farinha, o académico e antifascista Emídio Guerreiro faz parte de uma juventude que tem uma admiração “inicial” sobre o que está a acontecer na União Soviética porque é a primeira geração que faz a receção do marxismo em Portugal, apesar de, mais tarde, acabar por se opor ao totalitarismo de Moscovo.

Nos anos 1920, o ambiente do mundo militar, a academia do Porto e o pensamento de alguns setores da esquerda republicana mais “modernizantes” tornam-se na base da formação deste jovem republicano, com tendências “cada vez mais democratas e sociais”.

“Emídio Guerreiro assume o marxismo como método crítico, utiliza o marxismo como forma de análise do capitalismo, mas não envereda pelo marxismo doutrinário”, sublinha Luís Farinha.

Emídio Guerreiro, como combatente na Guerra Civil de Espanha (1936-1939) do lado da República, chega a inscrever-se no Partido Comunista, mas rapidamente é expulso por ser considerado “indisciplinado”.

Em 1939, “Guerreiro é um homem no ‘fio da navalha’” e com o apoio de socialistas e maçons franceses consegue escapar dos campos de internamento de refugiados republicanos, no sul de França, após a derrota na Guerra Civil de Espanha.

Instala-se na região de Montauban e adota a partir de 1939 uma posição “corajosa” juntando-se à Resistência armada contra o nazismo e o regime colaboracionista de Vichy.

“É uma posição diferente. Os outros portugueses preferiram regressar a Portugal e ser presos. Quase todos os republicanos portugueses voltaram e foram presos, como Bernardino Machado ou Jaime Cortesão. Os próprios comunistas voltaram a Portugal e muitos foram enviados para o Tarrafal como é o caso de Manuel dos Reis, mas ele ficou para combater a ‘terceira ditadura’”, frisa o historiador.

Emídio Guerreiro passa a ser o Capitão “Hélio” das Forças Francesas do Interior (Grupo Louis Sabatié das FFI) tendo participado em ações armadas e de sabotagem na região de Toulouse e em Mautanban, onde é ferido.

“Pega em armas, tem uma experiência dura, já tinha pegado em armas nas revoltas republicanas em Portugal, também no norte de Espanha. Tem experiência de combate sendo que em França manteve também cargos de orientação política”, diz Luís Farinha.

No pós-guerra, Emídio Guerreiro volta a reunir em Paris a Frente dos Exilados Portugueses que tinha sido proibida pelos franceses em 1939 e volta a estar em contacto com republicanos e “alguns comunistas” para estabelecer pontes para combater a ditadura em Portugal.

A partir do início dos anos 1960 estabelece estreitas ligações com o General Humberto Delgado e toma partido dos “delgadistas”, passando a apoiar todas as soluções que possam ser capazes de unir democratas e militares num braço armado contra o Estado Novo.

Nesta altura surge a ligação ao núcleo dos futuros social-democratas do norte de Portugal: Artur Santos Silva e Artur Andrade (primeiro Presidente da Câmara Municipal do Porto após o 25 de Abril).

O General Humberto Delgado, que concorreu contra Américo Tomás nas eleições presidenciais em 1958, acabando por ser assassinado por uma brigada da polícia política chefiada por Rosa Casaco, em Espanha, em 1965, é uma das figuras mais marcantes na vida de Emídio Guerreiro.

O livro aprofunda a relação com Humberto Delgado, as reuniões em Paris, e os avisos sobre a emboscada da PIDE que conseguiu atrair o general para Espanha com o intuito de um encontro com militares dispostos a agir contra o regime.

“É Emídio Guerreiro quem anuncia à família de Delgado e a Mário Soares, que era o advogado do General, e à imprensa em geral, que Humberto Delgado ‘ou estava morto ou estava preso’”, em março de 1965, porque não recebe os sinais que esperava do “encontro” de Badajoz que decorreu no mês anterior.

Sobre a LUAR, Liga de Unidade Ação Revolucionária, grupo de ação armada formado após a morte de Humberto Delgado, o livro aborda os primeiros contactos com Hermínio da Palma Inácio (1922-2009) e um misterioso encontro de “aliciamento” em Paris numa conferência sobre “A Dialética das Matemáticas Modernas”.

“Preparado ou não o programa da conferência aparentemente centrada sobre Aritmética Racional era, na verdade, um plano de aliciamento de elementos para a LUAR, eufemisticamente identificada como de ‘Lógica Universal da Aritmética Racional’. É ‘uma palestra’ com ‘aviso prévio’ onde se anunciava a matéria como especialmente interessante ‘para espíritos livres’” (página 106) do livro.

A reunião realizou-se na Rue Recamier, em Paris, no dia 05 de junho de 1967 sendo que a a Liga de Unidade de Ação Revolucionária (aliás Lógica Universal de Aritmética Racional) tinha assaltado o Banco de Portugal na Figueira da Foz no dia 22 de maio do mesmo ano, numa operação contra o Estado Novo.

A investigação aborda igualmente o papel de Emídio Guerreiro como Secretário-geral do PPD em 1975 e as intervenções como Deputado da Assembleia Constituinte.

O livro “Emídio Guerreiro – Sob o Despotismo da Liberdade” do historiador Luís Farinha (Coleção Parlamento/Assembleia da República, 359 páginas) deve ser apresentado em Lisboa e Guimarães no próximo mês de janeiro.

 

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LusoJornal