“Captifs au Paradis” publié par Gallimard: Um huis clos tropical de Carlos Marcelo

“Captifs au Paradis” – o primeiro romance do jornalista e escritor brasileiro Carlos Marcelo (1970) que foi publicado no Brasil com o título de “Presos no Paraíso” – acaba de ser publicado pela Gallimard.

Carlos Marcelo, que foi finalista do Prémio Jabuti de Reportagem com o livro “O Fole Roncou! Uma história do Forró”, oferece ao leitor um policial alicerçado (e aprisionado) na insularidade de Fernando de Noronha. Este arquipélago de 21 ilhas situado ao largo do Pernambuco e descoberto pelos Portugueses em 1500 tem uma história movimentada. História e cultura que será bem explorada pelo autor.

Invadido (e efemeramente conquistado) por Ingleses, Franceses e Holandeses, e sempre reconquistado pelos Portugueses, o arquipélago passou de prisão – que de colonial passou a brasileira – a uma das mais importantes reservas naturais do país.

É então neste universo hermético, nesta ilha-reserva – cujas paisagens inacreditáveis são muito bem captadas pelo autor – que decorre a intriga de “Captifs au Paradis”. Um estratagema – colocar personagens fechados numa ilha – já muito usado tanto pela Literatura como pelo Cinema, mas que Carlos Marcelo consegue inovar de certa forma.

O romance abre pelo meio da história – uma técnica pouco comum em policiais em língua portuguesa, mas que, por isso mesmo, é de saudar. E começa assim: um problema de aviação acaba por interditar o aeroporto de Fernando de Noronha por alguns dias, isolando a ilha do mundo e, claro, mantendo a sua população e os turistas prisioneiros. Este início em forma de diálogo consegue imediatamente cativar o leitor.

Um dos passageiros, Tobias, um historiador que está ali em viagem de trabalho (ele escreve guias de viagem), é o protagonista. Tudo estaria bem – afinal ficar retido uns dias mais num paraíso tropical não é algo que chateie em demasia – se não tivesse sido descoberto um duplo homicídio. Uma investigação a cargo do delegado Nelsão, um raro policial incorruptível cuja maior preocupação é equilibrar o desejo de comer com a vontade de emagrecer. O depoimento de Tobias terá um papel muito relevante na resolução do caso. Ao delegado e a Tobias podemos juntar outro personagem muito interessante: Dias Nunes, um autoritário coronel reformado que tem o condão de dar tensão à história.

Uma estrutura complexa que nunca prejudica a dinâmica e a fluidez do romance. A narração de Tobias que se alterna com um narrador na terceira pessoa (cuja identidade ficará apenas clara perto do final) e uma linha narrativa carregada de flashbacks. Esta mistura de vozes e linhas temporais permite, tal como em todos os bons romances policiais, criar a dúvida e a incerteza na cabeça do leitor, levando-o a colecionar os personagens (que se vão complexificando) e a juntar as peças do puzzle sem nunca, contudo, conseguir montá-las como deve ser. É essa a maior mestria do autor.

Uma obra e um autor que confirmam uma vez mais o potencial da Literatura brasileira. Os Franceses, pouco a pouco, lá a vão descobrindo, enquanto muitos Portugueses, enfiados em bolorentos complexos de superioridade pós-coloniais e julgando-se os donos da nossa língua comum, lá continuarão certamente a ignorá-la até serem ultrapassados pela imparável criatividade que pulsa naquele país de 200 milhões de habitantes.

 

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LusoJornal