LusoJornal | Carlos PereiraExposição de Mélanie Alves: a lusodescendente que quer contar o 25 de abril no femininoCarlos Pereira·Cultura·4 Janeiro, 2025 A exposição da artista portuguesa Mélanie Alves que está atualmente na Casa de Portugal na Cidade universitária internacional de Paris, sobre os 50 anos do 25 de abril, presta homenagem a 10 mulheres que também “marcaram” a Revolução dos Cravos. Mélanie Alves é luso-americana, mas estudou em Bordeaux e depois em Paris.. A Mélanie é luso-americana, mas foi muito cedo para Portugal, não é? Eu sou aquilo que se pode chamar de nómada. Sou luso-americana, nasci nos Estados Unidos, os meus pais são os dois portugueses, mas eram emigrantes em São Francisco. Eu tinha 3 anos quando eles voltaram para Portugal e fui criada entre Setúbal e Palmela. Aos 17 anos, entrei nas Belas-Artes do Porto, depois vim para França, estive um ano a estudar em Bordeaux e depois vim para as Belas-Artes de Paris. Quando acabei o curso, continuava a querer ser uma cidadã do mundo e fui viver para Londres. Estive a explorar outras coisas e também a ver como era viver fora do país e depois de acabar a bolha da faculdade e começar realmente a trabalhar. Passados seis anos, fui para São Francisco e acho que em São Francisco é que começou a haver uma mudança grande em mim e comecei a focar-me mais na necessidade de ter uma mensagem que fale das sociedades e dos problemas atuais. Eu acho também que o facto de termos visto uma mudança política na América, com a Presidência de Donald Trump, isso fez com que eu quisesse, cada vez mais, focar-me nas Comunidades e unir com histórias, contar histórias, mostrar que nós somos todos diferentes, mas que na verdade temos muitas coisas semelhantes e cada um de nós tem histórias interessantes para contar. A Mélanie utiliza várias técnicas nas suas obras. Como surge esta polivalência? Eu nunca tinha pensado nisto, mas é verdade que a minha mudança do Porto para Bordeaux, abriu um pouco os meus horizontes e comecei a experimentar novas técnicas. Na minha licenciatura de 5 anos em pintura, no Porto, eu mostrava uma certa revolta pelo academismo. Claro que eu acho super importante termos as bases clássicas e académicas, mas não conseguia decidir se ia fazer pintura ou escultura. Eu queria fazer tudo e não nos deixavam. Ou fazíamos uma coisa ou outra, ou a escultura ou a pintura, estavam sempre separadas e quando eu cheguei a Bordeaux, comecei realmente a experimentar outros materiais e a utilizar materiais têxteis. Eu tinha de apanhar o comboio durante uma hora todos os dias para ir para a escola, em Bordeaux. Nesse trajeto aprendi a fazer croché e comecei a fazer um cachecol. Quando regressei ao Porto, fez parte da minha exposição um cachecol com mais de 2 metros de comprimento que fiz durante as minhas viagens diárias e no final bordei à mão o nome de todas as pessoas que conheci em Bordeaux. Por isso, realmente é verdade que a minha exploração por outras técnicas e quebrar os limites de pensar que nós podemos só desenhar ou pintar, foi em França que começou e depois nunca mais parei. Mas qual a etiqueta que mais prefere? Eu não gosto muito de etiquetas. Eu sou mais uma artista multidisciplinar. Para mim, o conceito é o principal. Eu tento manter-me no eixo de algumas técnicas que domino melhor e quero explorar ainda mais. Eu sempre tive dificuldade em rótulos e quando começo a pensar em tudo o que já aconteceu, lembro-me de um professor no Porto, uma vez, dizer-me logo no segundo ano, ‘Se a menina continuar a pintar da maneira que está a pintar, tem aqui um estilo para o resto da vida’ e eu saí de lá horrorizada. Mas que horror, como é que um artista vai fazer o mesmo para o resto da vida? Para mim é importante sermos curiosos e experimentar. Eu, pessoalmente, tenho interesse em quebrar estas barreiras. Porque se intitula de ‘artivista’? Isso começou em São Francisco, quando comecei a explorar mais a street-art, quando comecei a fazer murais, intervenções de rua, alguns pedidos, outros não. Notei também que, mesmo de vinha de estudos clássicos e mais académicos, eu sempre tive interesse pelas novas tecnologias e pela arte urbana, pela videoarte, pela fotografia… Quando expomos numa galeria, nem toda a gente tem acesso, no museu é a mesma coisa, nem toda a gente tem a possibilidade de ir, mas quando é na rua, mais gente tem acesso. E porque decidiu trabalhar sobre o 25 de abril? Eu até nem queria. Eram os 50 anos, fazia sentido, mas eu sentia que, pessoalmente, tinha quase uma dormência em relação ao 25 de Abril. Toda a minha vida ouvi sempre as mesmas histórias, então quase que normalizamos o 25 de Abril, como se fosse uma coisa até de certa forma abstrata. Não queria fazer porque sentia que as histórias eram todas contadas no masculino. Só que depois eu perguntei: mas então onde estavam as mulheres no 25 de Abril? E comecei a pensar – porque eu nisto sou muito romântica e poética, então começo a ter monólogos na minha cabeça, conversas comigo própria. Então, se por detrás de um grande homem está sempre uma grande mulher, onde estão estas grandes mulheres na sombra do 25 de Abril? Comecei a pesquisar e comecei a notar que afinal há imensas histórias de mulheres. Aqui falo de 10, mas podia ter falado de muitas mais. Eu até pensava que era ignorância pessoal, que eu não as conhecia, mas quanto mais falava com colegas, com amigas e com familiares à minha volta, reparei que muita gente, a maioria, não conhece as mulheres do 25 de Abril. Entretanto, qual foi o processo até chegar à exposição? Eu adoro histórias, adoro sentar-me com as pessoas, conhecê-las melhor e como contadora de histórias, eu gosto de me sentar, entrevistar fotografar filmar e fazer perguntas. Neste caso, infelizmente, eu só consegui entrevistar a Helena Pato, que é uma mulher imensa e fantástica, e a filha da Catarina Eufémia que também é um amor. Eu começo quase como uma repórter, uma investigadora e depois pego na informação real e crio um mundo próprio, uma linguagem própria. Depois o assunto transforma-se em algo muito mais subjetivo e criativo. O meu objetivo é manter as pessoas curiosas e intrigadas. Quero que sintam vontade de aprenderem um bocadinho mais, mas não são obras informativas. Eu quero motivar as pessoas a pesquisarem mais. Por que razão fazer esta exposição em Paris? Este era o meu primeiro objetivo, mas desde o início, o meu desejo foi sempre de ir para outros caminhos, porque a quantos mais sítios for, mais pessoas vão conhecer e dar a conhecer e vão t