LusoJornal | Carlos Pereira LusoJornal | Carlos Pereira LusoJornal | Carlos Pereira LusoJornal | Carlos Pereira LusoJornal | Carlos Pereira LusoJornal | Carlos Pereira LusoJornal | Carlos Pereira LusoJornal | Carlos Pereira Home Cultura Exposição de Mélanie Alves apresenta 10 Marias de Abril na Casa de Portugal em ParisCarlos Pereira·4 Janeiro, 2025Cultura A artista portuguesa Mélanie Alves tem atualmente uma exposição na Casa de Portugal André de Gouveia, na Cidade universitária internacional de Paris, intitulada “Marias de Abril”. A exposição está patente ao público até 9 de fevereiro. Mélanie Alves nasceu nos Estados Unidos, filha de uma família de emigrantes portugueses, mas regressou a Portugal com a família quando tinha apenas 3 anos de idade. Estudou nas Belas Artes do Porto, com uma passagem por Bordeaux e por Paris. Depois do curso, viveu em Londres e em S. Francisco. Nesta exposição que está agora patente na Casa de Portugal, concebida para este espaço, presta homenagem às mulheres que também fizeram o 25 de abril. “Eu sempre ouvi contar histórias do 25 de Abril no masculino” diz ao LusoJornal. Por isso escolheu 10 mulheres que, de uma forma ou de outra, estiveram também relacionadas com a Revolução dos Cravos: As três Marias das Novas Cartas Portuguesas, Catarina Eufémia, Celeste Caeiro, Helena Pato, Natália Correia, Manuela Tavares, Conceição Ramos… A peça central desta exposição acaba por ser “A primeira ceia” que junta à mesma mesa as 10 mulheres homenageadas, com um corpo feminino representado no meio da mesa, sem rosto, e com 8 pratos à volta, porque para as três Marias da Novas Cartas Portuguesas – Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa – como elas nunca se denunciaram umas às outras, são representadas por um só prato. A ideia da peça surge de um poema do livro que diz “Não há pão para nós na mesa dos homens” e Mélanie Alves decidiu dar-lhes esse lugar à mesa. “Esta é a mesa onde elas expõem as suas dores, os seus sucessos também, mas as suas angústias e as suas entranhas” explica a artista ao LusoJornal. Mélanie Alves gosta de recuperar os materiais que utiliza nas suas obras, numa lógica sustentável. E em cima da mesa há objetos de cerâmica, peças de vidro de antigos candelabros que lhe foram oferecidos, formas para bolos de um Conde francês, crochés feitos à mão,… “eu vou guardando tudo no meu estúdio, em Marvila, é um autêntico caos” confessa. As Novas Cartas Portuguesas também estão representadas com uma estrutura entrelaçada de gravatas, chamada “Nó de gravata” e representando o “sufoco patriarcal sobre o sexo feminino”, no entanto, por entre as “fissuras” das gravatas, estão delicadamente a esvoaçar poemas das Novas Cartas Portuguesas. Em frente está a cadeira confessional de Natália Correia, onde as pessoas se podem ajoelhar e olhar para a obra que representa precisamente o livro que, na altura, foi polémico. “A Natália Correia disse que foi ela a responsável pela edição do livro” conta a artista. “Foi uma mulher fascinante, parece que não viveu no seu tempo, ela conseguia ser mais moderna do que a mulher atual, aliás chamavam-lhe o furacão dos Açores. Ela tinha as suas vontades, os seus desejos, as suas ambições e era super destemida, confiante”. Mas com esta obra está também a “mulher pecado”, desejada por tantos, criticada por muitos, em forma de cadeira de confessionário. De um lado a obra é feita em veludo vermelho, e do outro com um tapete, que no fundo, é espezinhado. Tudo é símbolo! Na sala polivalente da Casa de Portugal está um quadro intitulado “Eufémia Antígona” de homenagem a Catarina Eufémia. “Esta é a minha tragédia grega” diz Mélanie Alves numa longa entrevista ao LusoJornal. A artista conversou com a filha de Catarina Eugénia e ficaram amigas. Aliás expõe uma foice que pertenceu à ativista que foi assassinada à queima-roupa em Baleizão, no Alentejo por um guarda. Com a morte da mãe, a filha de Catarina Eufémia foi criada num Convento, depois casou e veio uns tempos viver em França antes de regressar e se instalar definitivamente em Baleizão. Mora a poucos metros do busto da mãe. “Eu vim de lá muito marcada com este momento e decidi que esta peça tinha que retratar isso”. No quadro está representada a Catarina Eufémia com o bebé de 18 meses, quando a mãe é abatida e o bebé cai ao chão. “Entretanto, a energia e a vida está a sair de si mesma e a concentrar-se no bebé. Eu agora até parece que vivi esse momento. Toi com tanta intensidade que a filha retratou este momento que até parece que eu estava lá e tenho uma tristeza enorme ao pensar que este bebé ficou desamparado e a Catarina também”. Outra das peças da exposição é o “ramo de cravos” da Celeste Caeiro, a “mulher dos cravos”. “Esta foi a última peça que eu fiz. Andava a pensar o que havia de fazer com ela porque eu sentia que havia aqui uma revolta em relação à vida que a Celeste teve. Quando vinha o 25 de Abril, ela era capa de revista, era a estrela de cinema, era a mais requisitada para ser fotografada, para estar presente, mas muita gente não sabe que ela vivia em pobres condições, na sua casa, com infiltrações, tinha problemas de saúde, tinha uma reforma miserável e tinha grandes dificuldades” contou a artista. Nessa altura, Mélanie Alves ouviu dizer que quando uma mulher falecia, os sinos da igreja, dobravam menos vezes do que para um homem. “E isso tinha tudo a ver com o que eu sentia em relação à história da Celeste”. Decidiu então lançar o desafio de encontrar 50 sinos de porcelana “para que os sinos possam dobrar, durante 12 meses por ano”. E no dia em que Mélanie Alves conseguiu ter o último dos 50 sinos de porcelana do “ramo”, uma amiga disse-lhe que Celeste Caeiro tinha falecido. “Isto deu-me ainda mais força” e espera agora que os sinos dobrem sempre para a Celeste Caeiro. A exposição foi feita propositadamente para a Casa de Portugal em Paris, mas Mélanie Alves quer agora que ela siga para Lisboa e possa ser também mostrada, pelo menos, ao público lisboeta.