Francesa Léa Dant encena peça com mulheres portuguesas em Santa Maria da Feira


A criadora francesa Léa Dant está a desenvolver para o Imaginarius – Festival Internacional de Teatro de Rua de Santa Maria da Feira um espetáculo em que mulheres do município estarão em cena com as suas “vitórias íntimas de libertação”.

A performance será assim protagonizada por mulheres “dos 16 aos 105 anos”, com ou sem experiência artística, que até 8 de março, Dia Internacional da Mulher, se voluntariem para partilhar vivências pessoais com colegas e público, compondo em várias sessões de trabalho prévio o espetáculo que, de 23 a 25 de maio, terá três exibições no referido festival do distrito de Aveiro e da Área Metropolitana do Porto – este ano dedicado ao tema da “Liberdade”, numa evocação dos 50 anos do 25 de Abril.

A coordenação do projeto cabe à artista, dramaturga e encenadora franco-americana que, tendo crescido em Washington e em Rabat, vive desde os 15 anos em França, onde em 1999 criou a companhia Théâtre du Voyage Intérieur e desde 2018 se vem especializando em performances para o espaço público, seja proporcionando encontros poéticos apenas entre ator e transeunte, seja envolvendo grandes grupos de mulheres em rituais urbanos de determinado contexto cultural e citadino.

É esse o caso da performance de dança e teatro que Léa Dant está a preparar para a 23ª edição do Imaginarius: o espetáculo intitula-se-se “De femme à FEMMES”, cruza poesia e política, será levado à cena na Praça da República e terá como protagonistas as mulheres que se voluntariem para cocnretizar uma manifestação coletiva do que há de transversal e universal no universo feminino.

“Os símbolos que essas mulheres trazem consigo são os da solidariedade e da autoafirmação, refletindo uma sensibilidade feminina em que o conjunto é composto pelo que cada mulher específica tem de único”, diz Léa Dante em entrevista à Lusa.

O processo criativo que precede o espetáculo prevê 13 conversas e ‘workshops’ com as participantes e isso permitirá a constituição de “um grupo muito sólido de performers”, gerando “grande emoção através da partilha íntima”.

“Isto é tornar a irmandade visível. É destilar poesia e sensibilidade no espaço urbano, em sociedade. É criar espaço para a intimidade, no coração da cidade. É partilhar sentimentos e experiências como mulheres que capacitam outras mulheres para se unirem através da arte”, enumera Léa Dant.

A encenadora anuncia que a performance será “muito simples”, mas proporcionará ao público “imagens fortes e, ao mesmo tempo, delicadas, não enquanto forma de protesto, mas como expressão de beleza, sensibilidade e poesia”.

O objetivo é questionar a própria visão da sociedade sobre as mulheres: “Em frente à Câmara Municipal, a performance irá expressar algo sobre libertação e a forma como as mulheres em cena a experienciaram nas suas vidas. Tentarei criar um elo entre libertação pessoal, vitórias íntimas e o evento histórico pelo qual Portugal se libertou da ditadura há 50 anos”.

Nesse esforço, Léa Dant espera que o público possa “descobrir ou relembrar” que as mulheres “são capazes de demonstrar uma grande solidariedade e sabem tomar conta umas das outras, o que é fonte de um grande poder”, e dá como exemplo desse potencial a sua própria experiência, recordando a estreia do conceito “De femme à FEMMES” em Rouen, em frente à catedral onde Jeanne D’Arc foi executada na fogueira.

“Foi uma escolha pensada para mostrar a solidariedade e afirmação das mulheres num local de dominação e patriarcado. Essa primeira edição, proporcionada por um importante teatro da cidade, foi tão poderosa entre as participantes que elas próprias me encorajaram a alargar a experiência a outros grupos. Era suposto ser apenas uma vez, mas entretanto já desenvolvi o projeto noutras cidades francesas e também na Dinamarca e nos Países Baixos”, lembra a encenadora.

“O conceito está destinado a viajar e espero que o faça também em países como Marrocos, Índia e Chile, onde sinto que as mulheres têm muito a expressar”, conclui.

LusoJornal