Humberto Delgado: Obviamente, comemoramos

«As eleições presidenciais de 1958 constituíram o facto mais importante de toda a História do Estado Novo e o único episódio de ruptura» disse Bernard de Menthon, Embaixador de França em Lisboa.

Duas manifestações marcaram, a semana passada, a comemoração do 60° aniversário das Eleições Presidenciais de 1958.

A primeira teve lugar, a 2 de maio, no Centro Cultural Calouste Gulbenkian, em Paris. Graças ao apoio desta instituição, mais de 130 alunos das Secções Internacionais Portuguesas de Paris e da Região Parisiense encontraram-se com o Professor universitário Frederico Delgado Rosa, neto e biógrafo do «General Sem Medo».

O conferencista teve o mérito de despertar o interesse dos jovens pela figura de Humberto Delgado e pelo autêntico «Tufão Sobre Portugal» que foi a campanha eleitoral de 1958.

Durante mais de hora e meia as perguntas surgiram sobre a conferência de imprensa de 10 de maio – a do «Obviamente, demito-o» -, a apoteótica jornada do Porto – 14 de maio -, a repressão sofrida pelo povo de Lisboa dois dias depois, as eleições falseadas de 8 de junho e, já durante o exílio, a atitude da França que nunca autorizou a entrada do General no território desta «Pátria dos Direitos do Homem».

A segunda manifestação comemorativa realizou-se no dia seguinte, dia 3 de maio, na Casa de Portugal André de Gouveia, na Cité Internationale Universitaire de Paris [CIUP]. Foi organizada sob a impulsão do livreiro João Heitor com o apoio de duas associações: «Gaivota», a que preside Maria José Henriques, e «Hirond’ailles», associação de beneficiência dirigida por Suzette Fernandes.

Este encontro com Frederico Delgado Rosa juntou cerca de 200 pessoas, não obstante as dificuldades decorrentes da greve de transportes. Presentes também o Embaixador de Portugal Jorge Torres Pereira e o Presidente da Assembleia Municipal de Mêda, João Jorge Ferreira Lourenço.

Do programa constava, como momento fundamental, a projeção do filme «Operação Outono», nome código atribuído pela tenebrosa PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado) à conspiração que levaria ao assassínio do «General Sem Medo» e da sua secretária, a brasileira Arajaryr Campos.

No fim do filme e após intervenção do Embaixador de Portugal, o público presente entrou em diálogo com Frederico Delgado Rosa.

Foram abordados vários aspetos da vida do candidato democrático, declarado vencido pela máquina eleitoral salazarista. Questionado por um dos presentes, o neto do «General Sem Medo» esclareceu a atitude falaciosa da Justiça portuguesa. Com efeito, ao afastar do processo judicial os relatórios de autópsia dos cadáveres de Humberto Delgado e Ajararyr Campos, redigidos pelas autoridades espanholas em 1965, o Tribunal português concluiu pela inculpação de apenas um dos membros da brigada assassina, Casimiro Monteiro, de seu nome, julgado à revelia.

Tal conclusão permitiu ilibar não apenas os restantes sicários, como ainda a própria hierarquia da PIDE até à(s) mais alta(s) figura(s) do Estado Novo.

Enfim, uma mancha na História da Justiça portuguesa do pós-25 de Abril, como afirmou um dia o Presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.

O encontro terminou com um caloroso convívio onde, graças à muito portuguesa generosidade das associações acima referidas e do enviado da cidade de Mêda, não faltaram nem deliciosos acepipes, nem essa autêntica ambrosia que é o chamado «vinho fino» da olímpica região do Douro.

Geograficamente longe da Pátria os Portugueses, conhecem o valor da História. Sabem o que custou a Liberdade. Não esquecem o «General Sem Medo», precursor do 25 de Abril.

Democracia e Liberdade não são dados adquiridos «ad aeternum». Há que cultivá-los. Por isso mesmo, os Portugueses de França, comemoram. Obviamente.

 

José Carlos Janela e João Heitor

 

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LusoJornal