José de Barros: de Clermont-Ferrand para a Direção da Lauak em Setúbal

Com 47 anos de idade, José de Barros é o Diretor Geral da Lauak em Setúbal, uma fábrica francesa de componentes para a aeronáutica, criada em 2004 na antiga fábrica da Renault. Mora há 6 anos em Portugal depois de ter passado praticamente toda a vida em França.

José de Barros nasceu em Vieira do Minho, no Minho, mas acompanhou os pais que emigraram para França quando tinha apenas 3 meses de idade. “Como toda a gente da minha geração, eu também vinha a Portugal todos os anos de férias no mês de agosto”. Numa entrevista ao LusoJornal conduzida por Vítor Oliveira, José de Barros explicou que o pai foi trabalhar nas fábricas da Michelin em Clermont-Ferrand e a mãe era empregada doméstica “como a maior parte das Portuguesas da geração dos meus pais”.

“Os meus pais educaram-me com o gosto pelo trabalho e é por isso que hoje agradeço muito aos meus pais por me terem dado este gosto pelo trabalho, porque a minha carreira só foi feita com base no trabalho”.

José de Barros trabalhou sempre para grandes grupos internacionais. Há 14 anos que estava na mesma empresa, no nordeste da França, mais propriamente em Metz, quando, em 2011, foi de férias a Portugal com a família. “Eu disse à minha esposa que viver aqui em Portugal devia ser muito simpático. Nós tínhamos acabado de comprar uma casa, era complicado mudar, mas aquilo ficou na cabeça. Um dia, quando estava a ver as ofertas de emprego nas redes sociais, porque estava há muito tempo numa empresa e precisava de mudança, li que estavam à procura de um Diretor para ajudar o Diretor-Geral a reorganizar a Lauak em Portugal” explicou ao LusoJornal. “Falei com a minha esposa, ela aderiu, vendemos a casa, o carro, vendemos tudo em França e viemos para cá, sem mais nenhuma ligação com a França. Aliás, a única ligação que eu tenho com a França hoje são os meus pais, porque eles ficaram lá” diz a sorrir.

 

Uma adaptação fácil

José de Barros considera que teve uma adaptação fácil. Falava português com os pais e frequentou a escola portuguesa à quarta-feira, nos arredores de Clermont-Ferrand. “Eu tenho a quarta classe. Eu sei que isso não vale nada hoje, mas nos anos 80 eu fiz a quarta classe em português, passada em França” diz a sorrir. A questão linguística foi, pois, ultrapassada facilmente. “O mais difícil foi do ponto vista administrativo. Isto aqui é mais lento, não temos a mesma visão da Administração que temos em França, foi mais complicado”.

Os filhos ainda eram crianças, tinham menos de 10 anos, e adaptaram-se rapidamente. “A minha esposa começou a aprender português e encontrou rapidamente um emprego em Portugal. Tivemos sorte. Por isso a adaptação foi fácil”.

Para mudar de país, José de Barros considera que é necessário um “projeto de vida”. Disse ao LusoJornal que “a cultura não é tão diferente entre a França e Portugal. Temos uma cultura judaico-cristã, a língua também não é uma grande dificuldade para aprender, é próxima da língua francesa, e quem tiver um projeto de vida vai conseguir”. Mas alerta também que “vir para cá só porque Portugal tem sol, isso não vai resultar. Tem de haver um projeto de vida, um projeto de família e um projeto profissional”.

“Os meus filhos têm uma ligação muito grande com Portugal. Se eu lhes perguntar se querem regressar a França, eles vão dizer que não, claramente. Poderão ir estudar em França mais tarde, mas querem vir para cá, porque é aqui que têm amigos, o clima é bom, já se habituaram aqui, podem sair à rua sem medo, e nós também não temos medo, é um país muito seguro, e este é um facto importante para nós, que somos pais. É importante que as nossas crianças possam estar lá fora e que não vai acontecer nada”. Visivelmente feliz, a família De Barros não está a prever regressar a França.

 

Uma ‘cultura do trabalho’ diferente

José de Barros faz uma diferença importante entre a relação que a geração dos pais, que emigrou para França, tinha em relação ao trabalho e os Portugueses com quem agora trabalha. “Quando os emigrantes saíram nos anos 60 e 70, saíram de Portugal porque não tinham emprego aqui. Em França, tinham de provar tudo, tinham de mostrar tudo. Os Portugueses que estão aqui, na terra deles, não têm de provar nada, e essa é a grande diferença. Isto não é um julgamento de valor, é a diferença que eu encontrei”.

O Diretor da Lauak em Setúbal sempre trabalhou para grandes grupos franceses, onde tudo é planeado, tudo é organizado. “O Português tem a cultura do desenrasca. Consegue fazer tudo, mas é sempre à última da hora. Com a cultura do desenrasca, nós conseguimos fazer milagres no trabalho. Muitas vezes eu digo, ‘não vamos conseguir’, mas acabamos por conseguir, podemos trabalhar dia e noite, aqui a noção do compromisso é algo muito importante. As pessoas não contam as horas para conseguirem”.

Quem trabalhou tantos anos em França e próximo da Alemanha, traz certamente metodologias de organização do trabalho, mas José de Barros considera que “também temos de ter em conta a especificidade do país”.

“Ainda não estamos com uma organização como em França e provavelmente nunca estaremos como em França, porque sempre vamos continuar a ter esta especificidade portuguesa que dá resultados”.

 

Portugal dá cartas no setor da aeronáutica

O Grupo Lauak trabalha com praticamente todos os construtores no setor da aeronáutica. Em Portugal o grupo tem-se desenvolvido pelas mãos de Armando Gomes. “Ele criou a empresa em 2004 com 2 pessoas, quando eu cheguei, há 6 anos, tinha 200 colaboradores e no início deste ano éramos 800” explica José de Barros. “Tivemos um crescimento gigante. Eu acreditei no projeto de Armando Gomes quando ele me disse que aqui em Portugal, nós iríamos fazer crescer este grupo. E teve razão”.

“Portugal é a maior empresa do Grupo e continua a investir. Nós somos um bocadinho mais baratos e temos essa noção do compromisso” explica ao LusoJornal. A maior parte dos players do setor da aeronáutica regressaram à Europa, para estarem mais próximos dos construtores. “Muitos instalaram-se aqui em Portugal. Há 15 anos não havia ninguém, havia apenas a OGMA que trabalhava apenas para o setor militar. Só a nossa fábrica, em 6 anos multiplicou por 3 o número de colaboradores, e isto aconteceu com todas as empresas, o que resulta em muitos milhares de empregos ligados a aeronáutica”.

 

Crise na aeronáutica vai durar uns anos

José de Barros mostrou sinais de pessimismo atual no setor da aeronáutica. A pandemia de Covid-19 reduziu consideravelmente o setor do turismo. “Vai ser necessário mais 2 ou 3 anos até que as pessoas voltem a ter confiança para viajar” disse ao LusoJornal. Por outro lado, as empresas também não estão a investir nas viagens dos colaboradores. “A aviação funcionava essencialmente com o turismo e com as viagens de negócio. As companhias vão vender menos bilhetes e por isso não são necessários tantos aviões” resume José de Barros. Por isso prevê que o setor da aviação tenha um impacto que pode estender-se por uns 10 anos.

No entanto, José de Barros está consciente que “o Português sabe criar oportunidades e há muitas oportunidades em vários setores, não apenas na aeronáutica, mas também no turismo, na maquinaria, há oportunidades porque há competência. Quando eu era mais novo, não pensava que Portugal fosse um país industrial, é claro que não está ainda completamente desenvolvido, mas o Governo está a fazer cada vez mais coisas para que os investidores venham para Portugal e dar as condições necessárias para eles virem, através de financiamentos, através de ajudas, através da administração”.

 

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LusoJornal