Quem é Laurence Ferreira Barbosa, a realizadora que leva a Comunidade portuguesa para os cinemas franceses?

Laurence Ferreira Barbosa, realizadora do filme “Todos os Sonhos do Mundo” que leva a Comunidade portuguesa de França ao grande ecrã e que se estreou ontem em França, dia 18 de outubro, afirma-se como alguém agarrada à “liberdade artística”.

Realizadora de seis longas-metragens, produzidas por Paulo Branco, Laurence Ferreira Barbosa, de 59 anos, tem feito um percurso singular e reconhecido no cinema de autor francês, tendo revelado a atriz Valeria Bruni Tedeschi e trabalhado com nomes como Isabelle Huppert e Jeanne Balibar.

“A minha liberdade artística é muito importante. Não pertenço a um grupo, não criei a minha rede, não geri os relacionamentos com o sistema, não fiz forçosamente o que esperavam de mim. Tenho um lado obstinado e não consigo fazer concessões. Nesse sentido, senti-me sempre um pouco inadaptada”, contou a realizadora à Lusa.

Desde as primeiras curtas-metragens, Laurence Ferreira Barbosa imprimiu um “tom pessoal”, palpável nos diálogos, nos argumentos e na escolha de personagens “com uma certa forma de inadaptação” ao ambiente que as envolve.

A primeira curta, “Paris – Ficelle” obteve o prémio especial do júri no Festival de Belfort em 1983, tendo-se seguido “Adèle Frelon est-elle là?” que ganhou o Grande Prémio no Festival de Curtas-Metragens de Clermont-Ferrand, em 1986, e “Sur les tálus”, nomeado para um César de Melhor Curta-Metragem, em 1987.

“Quando comecei, não conhecia nada, estava na faculdade de cinema e pensei que tinha de fazer um filme. Escrevi uma história na qual punha muitas coisas pessoais e penso que já tinha um estilo e um tom. O tom vem dos diálogos, das personagens, da minha maneira de ver as coisas, da minha visão. Penso que as minhas curtas-metragens mostraram que havia uma visão e um estilo”, afirmou.

Aos 20 anos, conheceu e trabalhou “um ano e meio, dois anos” com Paulo Branco quando ele era ainda responsável pela gestão de salas de cinema em Paris e, depois, perdeu-o de vista “durante dez anos”. Quando se reencontraram, assinou com ele o primeiro filme “As pessoas normais não têm nada de especial” (1993) e seguiram-se cinco longas-metragens, numa colaboração permanente apenas interrompida por dois telefilmes para o canal televisivo franco-alemão Arte.

“A produção do meu primeiro filme foi longa e complicada, mudei várias vezes de produtor e finalmente fui ver o Paulo Branco e ele produziu o filme com muito brio. Sou-lhe muito grata porque, não sei… Consegui fazer filmes e viver do meu trabalho de cineasta e consegui ser cineasta também porque encontrei o Paulo Branco. Claro que a história é longa, mas ele deixou-me sempre livre e sempre teve confiança em mim”, contou.

Em 1994, “As pessoas normais não têm nada de especial” recebeu uma menção especial do Prémio do Júri Ecuménico no Festival de Locarno, foi nomeado para um César de melhor primeira obra e valeu à atriz Valeria Bruni Tedeschi o César de Melhor Esperança Feminina.

A segunda longa-metragem, “Detesto o Amor” foi selecionada para a secção “Cinémas en France” – antecessora da Quinzena dos Realizadores – no Festival de Cannes em 1997, sendo protagonizada por Jeanne Balibar, a atriz do documentário “Ne Change Rien” de Pedro Costa (2010) e do ‘biopic’ “Barbara” de Mathieu Amalric, atualmente nos cinemas franceses.

Em “A Vida Moderna” (1999), Laurence Ferreira Barbosa dirigiu Isabelle Huppert e “foi como ter um Stradivarius nas mãos”, com a conhecida atriz francesa a mostrar “respeito e total confiança” no trabalho da realizadora.

Laurence Ferreira Barbosa fez, ainda, “Ordo”, que esteve na competição internacional no Festival de Locarno em 2004 e “Ou morro, ou fico melhor” (2008).

A cineasta também coassinou o documentário “Volta à Terra”, de João Pedro Plácido, que passou na mostra da associação de cinéfilos ACID do Festival de Cannes em 2015, obteve o prémio Escolas/IADE para melhor longa-metragem da competição portuguesa no Doclisboa em 2014, o prémio Ulysse do documentário e o Prémio Estudante no festival de cinema de Montpellier Cinemed, assim como o Prémio Gold Hugo do Chicago Film Festival em 2015.

“Volta à Terra” mergulhou-a no mundo rural português e transportou-a até ao país do avô que não conheceu e que lhe deixou como herança um apelido estrangeiro que nunca a fez sentir-se como portuguesa, mas que criou “uma ligação que se acentuou com os anos”.

O mais recente filme, “Todos os Sonhos do Mundo”, atualmente em cartaz, leva à tela a Comunidade portuguesa em França, retratando a emancipação de uma jovem lusodescendente da cultura familiar. Um filme “muito diferente” do que fez até agora.

“É muito diferente porque é a primeira vez que filmo só com não profissionais. É diferente porque inspirei-me realmente em Paméla, porque inicialmente queria fazer um documentário, queria dizer coisas sobre a comunidade portuguesa. Não é assim que trabalho habitualmente. Aqui há uma matéria de documentário e uma personagem que inspirou a personagem principal e que contaminou todo o filme”, revelou.

Laurence Ferreira Barbosa já terminou de escrever a próxima longa-metragem, “Où Niche l’Hibou” (“Onde mora o mocho”), uma comédia que vai ser produzida também pela Alfama Films de Paulo Branco e cujo início vai ter cenas rodadas em Portugal.

 

 

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LusoJornal