Livros: “Tout le bleu du ciel” de Mélissa da Costa

Mélissa da Costa, 28 anos, entrou de rompante no mundo literário francês com o seu primeiro romance publicado: “Tout le bleu du ciel”.

Formada em Economia e Gestão e responsável de comunicação no domínio da energia e do clima, esta nova autora chegou ao meio editorial dito tradicional (o seu romance de quase 700 páginas é publicado pela também jovem editora independente ‘Carnets du Nord’) depois de experimentar novas formas de autopublicação.

“Eu já autoeditei dois romances na Amazon, mas que cedo se perderam no meio da massa de livros que lá existe”, explicou a jovem autora. “Para este livro, eu descobri a plataforma monbestseller.com e perguntei-me: bem porque não experimentar? Mesmo sem o terminar, carreguei a primeira parte na internet, nessa plataforma, e, através de um sistema de notas e comentários online, o livro foi aos poucos subindo nas tendências chegando ao conhecimento do comité de leitura do site”.

Depois de sobreviver ao quase sempre fatal mundo da autopublicação, “Tout le bleu du ciel” encontrou enfim o seu caminho para fazer as alegrias dos leitores que apreciam histórias de grande profundidade sentimental, algo púdicas e marcadamente femininas, narradas com simplicidade poética, lentidão positiva e realismo, cheias de detalhes, felizes pequenos nada e citações. “Tout le bleu du ciel” é uma viagem interior no meio de uma viagem exterior.

Émile, o protagonista, 26 anos, descobre que sofre de uma doença rara e incurável, o Alzheimer precoce, que lhe dá apenas dois anos de vida. Determinado em não seguir qualquer terapia paliativa e a não viver da piedade e compaixão dos outros – “por orgulho”, diz Mélissa, “não quer impor a doença aos seus próximos” – ele, que pouco antes rompeu a relação com a namorada, decide tomar a sua vida em mãos e iniciar uma última viagem nos Pirenéus. Ele sabe, todavia, que, devido à doença, não pode partir sozinho. Então, decide publicar na internet um anúncio procurando um companheiro de aventura. E, contrariando todas as expetativas, recebe uma resposta. Joanne, 28 anos, uma jovem que carrega consigo um segredo, será a sua parceira nesse road-trip. Émile parte sem se despedir dos pais ou dos amigos, “fazendo as suas despedidas em segredo”, explica Mélissa da Costa.

Os dois jovens encontram-se numa estação de serviço de autoestrada e partem na caravana de Émile, também comprada em segredo, rumo às montanhas. Aos poucos, longe da civilização e da tecnologia que nos consome os dias, mergulhados na natureza que a tudo atribui sentido, Émile e Joanne vão-se conhecendo cada vez melhor e a entreajuda nasce dessa amizade que irá marcar todo o romance.

Ao longo do livro, a autora constrói uma filigrana de pequenas histórias que recorrem ao passados de Émile e Joanne para lhes dar corpo e consistência. Mélissa da Costa descreve com mestria a degeneração do corpo e da mente de Émile, os seus pensamentos mais profundos, os medos e as ansiedades, ao mesmo tempo que mergulha os personagens num carpe diem desesperado que visa encontrar o sentido da existência. É este contraste entre a sombra da premência da morte e a luz da alegria de viver os poucos dias que restam que dão a este romance a densidade e a tensão emocionais de um grande melodrama moderno.

A ler, sem dúvida.

LusoJornal