Opinião: Crónica de um insucesso influenciado


Confiante na decisão da Comissão Política Nacional do Partido Socialista (PS) no dia 2 de abril, que decidiu designar os candidatos pelos círculos da Europa e Fora da Europa para estas eleições legislativas de 2025, sendo eles próprios residentes no estrangeiro, aceitei o desafio que me foi oferecido de fazer parte da lista dos quatro candidatos da Europa.

Pensei, e com certeza como o pensaram muitos outros, que desta vez o PS tinha enfim respeitado o desejo dos Portugueses do estrangeiro de serem representados por eles mesmos na Assembleia da República. As Secções que não contavam que o PS faria uma escolha desta natureza, manifestaram por unanimidade o seu apoio a esta ideia.

Mas então interroguei-me: porque é que Nathalie de Oliveira, que queria muito ser candidata, e igualmente residente do estrangeiro, não foi contemplada? Não tive conhecimento da razão, apenas fugazmente pensei que deveria estar a sofrer o mesmo distanciamento que também lhe parece estar a dedicar o PS francês.

Mas a resposta apareceu-me quase imediatamente, porque às 22h23 precisas no dia 2 de abril recebi a seguinte mensagem dessa tal Nathalie: “Se fosses minha mãe e soubesses que uma mulher da tua idade era chamada no lugar da tua filha, que tanto lutou como militante, achavas justo?”

Decidi pôr de lado o aspeto discriminatório sobre a idade e o facto de essa pessoa ser muito mais velha que a minha filha. Também desconsiderei o facto de sentir-se superior como militante, quando eu já milito no PS português há mais de 30 anos e no francês há mais de 15.

Na mesma mensagem também dizia: “Espero que não sejas ajudada pelo Paulo Pisco ou algo parecido porque vais perder o assento”.

Confesso que não dei atenção a tal afirmação, porque sempre estive ao lado de Pisco desde que se lançou como candidato pela Europa e participei em todas as campanhas que fez em Paris e até em minha casa, criando supostamente laços de amizade.

Mas enganei-me e fiquei pasmada quando Pisco se recusou a ajudar a campanha do PS, e olhos nos olhos, me disse: “não estejas à espera do meu apoio porque estou tão zangado com a decisão de Pedro Nuno Santos de ter recusado eu ser candidato, que não vou participar na tua campanha”.

Ainda outras pessoas lhe ligaram, sem sucesso.

Durante a campanha, Pisco viajou muito pela Europa, mas não para fazer campanha. A amizade que parecia ter por mim não tinha fundamento, não prestou qualquer declaração que me pudesse dar uma ajudinha na campanha, nem que fosse para apoiar o PS, como deveria ser o seu dever, pois do partido recebeu a oportunidade de ser Deputado durante décadas.

Só insistia em manifestar o seu rancor contra o PS, por não ter permitido que a sua carreira de Deputado continuasse por mais uns quantos anos. Não tomar posição publicamente já é por si uma tomada de posição: aquela de não dizer nada. Decidir de não proporcionar apoio, é um ato altamente político: esta citação define a meu ver a posição política de Pisco nestas circunstâncias ao decidir de não me manifestar apoio nesta campanha e que achei pouco louvável da sua parte, embora não haja registo de nenhum apelo seu contra, ou a favor, do voto no PS.

Já esse não foi o caso da Nathalie, que fez uma verdadeira anti-campanha contra mim e o voto no PS, e por vários meios acusou-me de incompetente e inexperiente política.

Salvo erro, ocupou as mesmas funções autárquicas em França que eu tenho ocupado até agora, e eu mantenho a confiança do PS francês para continuar as minhas missões muito brevemente. Mas o mesmo não se pode dizer da parte da Nathalie, devido a insucessos eleitorais recentes e da sua personalidade que transtorna. Ela foi deputada portuguesa durante alguns meses, mas não me lembro de alguma ação de relevo que tenha conseguido para a diáspora. E eu fui eleita para o Conselho das Comunidades Portugueses em 2023 e continuo a defender intensamente os interesses duma faixa da população da diáspora, que são os reformados portugueses do estrangeiro.

Será que estas pessoas são dignas da confiança do PS para fazer parte da sua elite, ou para intrometer-se na desejada federação dos socialistas da Europa?

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Com estas contrariedades, até parecia que o começo de campanha não se mostrou com os melhores auspícios!

Mas não quebrou nem o meu, nem o entusiasmo dos outros candidatos da lista do PS, para nos arrojarmos a fazer tudo em nosso poder, tendo pela frente apenas 6 semanas de campanha. Com a ajuda das equipas de campanha de Lisboa e de Paris, da Secção do PS de Paris, elaboramos um programa de ações focalizando cada um de nós quatro em cada um do seu próprio país, e sendo acompanhados gradualmente pelos nossos mandatários e pelas Secções PS de outras cidades de França e do resto da Europa, como à Bélgica e ao Luxemburgo.

Mas a triste realidade foi que nos círculos da Europa e fora da Europa os resultados foram na mesma onda dos votos em território nacional no dia 18 de maio. A extrema-direita conseguiu superar na Europa os votos da AD e do PS juntos, e o PS sofreu uma baixa global de 3% e foi privado pela primeira vez dum posto de Deputado.

É uma situação mais que lamentável, sobretudo porque recaiu evidentemente sobre mim este insucesso, que assumo lucidamente, mas com a convicção de um trabalho afincado, por mim e por todos e todas que me apoiaram com empenho e com responsabilidade.

Embora esteja convencida que qualquer que fosse o candidato socialista o resultado seria igual, ganhar o posto de Deputado à AD podia ter sido por pouco (a diferença foi de 2.800 sobre 255.305 votos), mas este pouco nas condições da queda rude do PS no território nacional, o aumento assombroso da extrema-direita no eleitorado da diáspora, e da contraposição dos ex-Deputados socialistas, deu menos hipóteses ao PS de conservar o seu posto de Deputado na diáspora.

A mobilização dos camaradas e simpatizantes do PS foi exemplar, fazendo um enorme trabalho no terreno, indo ao encontro do máximo de portugueses, distribuindo folhetos e explicando o programa especialmente elaborado pelo PS para a diáspora. Evidentemente que não pudemos superar a onda de choque da extrema-direita, mas conseguimos bons resultados na França, na Alemanha, na Espanha e no Reino Unido. Não cito a lista de todos os restantes países da Europa que escolheram o PS em 1° lugar, mas agradeço-lhes a confiança do fundo do coração.

Recebemos imensas mensagens e ações de apoio de Presidentes de câmaras de França e de Portugal, de luso-eleitos, de associações, professores, artistas, escritores, empresários, comércios, cafés e restaurantes, de luso-indianos, de luso-guineenses, e sobretudo dos camaradas e simpatizantes mais motivados, construtivos, edificantes, por toda a Europa…

Estivemos presentes em comemorações, celebrações, reuniões, comícios, almoços e jantares, festas, missas, encontros e variados eventos dos portugueses, que se multiplicaram em todos os países durante estas seis escassas semanas, e inundamos as redes sociais com todos estes acontecimentos e focos sobre as medidas do nosso programa.

Asseguramos todas e todos, cada um assumindo o seu papel, o nosso labor quotidiano durante os 45 dias da campanha.

Eu tive a oportunidade de ser entrevistada por praticamente todas as emissões de radio locais, de participar em reuniões zoom, podcasts e televisão, agências de informação, em todo o território francês e noutros países como no Luxemburgo, na Bélgica, na Alemanha, na Espanha, em Portugal…

Fui falar com os numerosos emigrantes a passar as férias da Páscoa em Portugal, participei no desfile do 25 de Abril em Lisboa, fui visitar os camaradas e associações em Lyon, Luxemburgo e Bélgica. Redobrei as conversas com as pessoas e guardo como a melhor emoção desta campanha todos aqueles e aquelas que me estenderam os braços, me ajudaram, me apoiaram, me deram alento.

Continuo convencida que a escolha do PS de ter designado portugueses residentes no estrangeiro para serem os seus representantes na Assembleia da República é a mais justa e apropriada às realidades das Comunidades. Somente as ideias populistas e as manipulações foram tão provocantes por parte da extrema-direita, que os candidatos como nós, mais moderados nos nossos discursos e apenas focalizados em abordar e explicar os interesses da diáspora, não conseguimos ademais persuadir do bem fundado das soluções aos nossos problemas e não pudemos desviar o medo da suposta invasão imigrante em Portugal, que contaminou uma grande parte dos portugueses da Europa.

O que é mais triste de constatar, é terem desconsiderado que eles próprios invadiram outros países à procura de pão, trabalho e paz.

E faço votos para que o PS continue com o mesmo desígnio e comece a preparar desde já a nova geração de socialistas das Secções do PS da diáspora para as próximas eleições legislativas.

Eu vou continuar com a minha missão para a qual fui eleita no Conselho das Comunidades Portuguesas, em 2023, pressionar o Governo sobre o tema dos reformados do estrangeiro. É uma temática que arrasto desde já há muitos anos, foi a minha primeira intervenção junto do último Secretário de Estado das Comunidades, nas várias moções e recomendações que apresentei e defendi no CCP Europa.

Agora que esta temática foi levada a sério e fez parte dos programas eleitorais de vários partidos, fico contente com a convergência enfim manifestada para resolver o estatuto de residente fiscal dos Portugueses reformados do estrangeiro, não com meias medidas, mas com medidas corajosas que visam nivelar os escalões de IRS para incitar os portugueses reformados a instalarem-se de novo em Portugal. E desenvolver um verdadeiro programa orquestrado pela Direção Geral das Comunidades Portuguesas, nos consulados, nos Gabinetes de Apoio aos Emigrantes, nos municípios, nas Lojas do Cidadão, para prepararem a adaptação de que os reformados necessitam para se reinserirem no seu país e que dizem respeito aos trâmites burocráticos, ao acesso aos serviços de saúde, à legalização de viatura, etc…

Vasto programa, para lá vou.

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Emília Ribeiro

Candidata do PS às eleições Legislativas’25 pelo círculo da Europa