Opinião: Presidenciais 2021 – um voto contra a barbárie

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Antes de abordarmos o tema da indigência intelectual, política e moral da extrema-direita portuguesa (e, em boa verdade, de todas as extremas-direitas) começarei pelo essencial: as razões que me levam a apoiar a candidatura de João Ferreira nas Presidenciais de 2021.

João Ferreira é um humanista que acredita na Democracia portuguesa, na sua Constituição e – é essencialmente isto que o diferencia de todos os outros candidatos e candidatas – no direito inalienável de cada ser humano a uma vida digna e de cada povo à sua autodeterminação sem ser vítima de ingerências externas que quase sempre pioram a situação (basta olhar para o Médio Oriente e o Norte de África para vermos a forma como a intervenções militares externas das potências neocolonizadoras ocidentais conduziram à ascensão do Daesh, do islamofascismo e da sua Jihad de extermínio).

João Ferreira acredita que cada cidadão, independentemente da sua origem, crença ou modo de vida – se é rico ou pobre, negro ou branco ou cigano, imigrante ou emigrante, português ou estrangeiro, homem ou mulher, crente ou ateu, heterossexual ou homossexual – tem direito:

– A cuidados de saúde de qualidade gratuitos em hospitais públicos de primeiro mundo;

– A uma escola pública de grande qualidade, universal e gratuita, pois percebe que a escola pública (e eu sei do que falo…) é o melhor elevador social na hora de ajudar uma criança pobre a romper o muro da miséria e da pobreza em que nasceu.

– Ao acesso à cultura e ao exercício digno de atividades culturais;

– A uma habitação digna;

– A um trabalho e a um salário dignos, pois não existe nada de mais desumano do que um cidadão que trabalha 40 horas por semana e não consegue sair da pobreza;

– À justiça e solidariedade fiscal de acordo com a equação “quem mais tem mais paga”;

– A uma política de combate às alterações climáticas, ao aquecimento global e à poluição;

– A, caso viva no estrangeiro, a ser tratado como um português como os outros, nomeadamente as crianças lusodescendentes, que, para o bem futuro do nosso país, devem ser apoiadas na hora de aprender a nossa língua.

Eis alguns – existem muitos outros – dos motivos que me levam a votar em João Ferreira.

 

Falemos então da indigência intelectual, política e moral da – por enquanto parrachita – extrema-direita portuguesa.

A extrema-direita sempre existiu no Portugal pós-1974. Ela não apareceu agora e de repente sob a forma de um “comentador” que grita banalidades sobre futebol, que pagou a uma Vanity Press para publicar os piores romances da história da humanidade e a quem Deus, à maneira medieval, lhe aparece em sonhos confiando-lhe, diz o alucinado candidato de extrema-direita, “a difícil mas honrosa missão de transformar Portugal”. Esta afirmação de que o Todo-Poderoso, em vez de estar a resolver os problemas dos refugiados e migrantes, que sobrevivem em condições infra-humanas no Darfur ou em Lampedusa, está a perder tempo a fazer anúncios messiânicos a “comentadores” de futebol deveria pôr os cabelos em pé a qualquer cristão e fazer rir até à exaustão todos aqueles que possuem um cérebro funcional.

É então este venenoso caldinho – composto de futebolês berrado à décima potência, de Chiado Editora, esse cancro do mundo editorial, e rasteiro messianismo à la Jeanne d’Arc – que dá corpo ao grito do Ipiranga do neofascismo português, que, enfim, lá ganhou coragem para sair das sombras, pois ele, convém repeti-lo, sempre existiu (resistindo tal qual aquelas bactérias hiper-resistentes que vivem no fundo dos poços de enxofre), algo envergonhado, nas fileiras do PSD (chamar “social-democrata” a esse Partido é outra aberração lusitana) e do praticamente extinto CDS. E os antifascistas, antirracistas e humanistas devem agradecer essa coragem de sair das sombras, pois é mais fácil combater quem dá a cara.

E ela, a extrema-direita, está por todo lado: nas teses conspiracionistas – como a teoria racista e xenófoba do “Grand Remplacement” -, no negacionismo climático e científico, no movimento antifeminista que deseja reduzir a mulher portuguesa e europeia a uma condição “saudita”. A extrema-direita está nas redes sociais, esse esgoto a céu aberto, onde a mentira e a manipulação de massas imperam, onde as fake news percorrem aqueles intestinos virtuais à velocidade da luz enquanto a verdade fica reduzida à insignificância. Dir-se-á que atingimos a tempestade perfeita, aquela que tornou inevitável a revolução fascista. Não é uma questão de “se” mas, sim, de “quando” terá lugar o retrocesso civilizacional fascista.

Ontem, no debate entre João Ferreira e “o comentador de futebol que fala com Deus” viu-se também claramente que Portugal não pode contar (surpresa, surpresa…) com os grandes meios de comunicação para ajudar a combater o vírus do populismo fascizante e os seus ímpetos revolucionários. Mas isso é outra história.

Como vivo em França há algum tempo, conheço o impacto que uma extrema-direita forte – o Front National (podem mudar mil vezes de nome, mas para mim será sempre o FN de índole nazi-fascista do velho Jean-Marie le Pen) – a roçar os 20%, pode ter na radicalização sociopolítica de um país. A violência crescente, o racismo galopante que começa, por exemplo, a controlar largas franjas das polícias, a insegurança que se sente, o discurso cada vez mais nacionalista e identitário proferido até pelo centro-direita representado pelo atual Presidente francês…

O que está a acontecer aqui em França, apesar do meu eterno otimismo, pode também acontecer em Portugal, um dos países mais estáveis e seguros do mundo. Para isso basta que o “comentador de futebol que fala com Deus” chegue aos 10% nas próximas eleições. É isso que tem de ser evitado. Caso o “comentador de futebol que fala com Deus” chegue a essa percentagem, ele e a sua tribo de facínoras sentir-se-ão legitimados para o agudizar da guerrilha fascista contra a nossa Democracia, a nossa sociedade plural e multiétnica, a nossa política de solidariedade social, o nosso modo de vida humanista. Portugal tornar-se-á mais intolerante, mais racista, mais desigual, mais misógino, pois as mulheres – as nossas filhas, as nossas esposas e companheiras – e os nossos compatriotas afrodescendentes ou ciganos serão quem mais sofrerão com este caminho em direção à barbárie. Os pobres serão os outros perdedores. “O comentador de futebol que fala com Deus”, financiado pelo grandes poderes económicos, não esconde o seu ódio pouquíssimo cristão em relação aos pobres, àqueles que infelizmente precisam de receber uma insignificante ajuda do nosso Estado para conseguir alimentar e manter os filhos na escola ou pagar a renda do teto que os protege do frio e da chuva.

E não exagero quando falo em barbárie ou em retrocesso civilizacional. A História do século XX (e do século XXI, basta olhar para Trump ou Bolsonaro) ensina-nos o que acontece quando gente da índole do “comentador de futebol que fala com Deus” se aproxima do poder. É a destruição total, o desmantelamento absoluto do Estado Social que demorou gerações a destruir, o caos e a guerra.

Vejamos, então, com base no programa do Partido do “comentador de futebol que fala com Deus”, como seria esse Portugal dominado pela extrema-direita populista e fascizante.

– Seria o fim do Serviço Nacional de Saúde tal como o conhecemos. O que significa que o acesso universal, gratuito e de qualidade aos cuidados de saúde desapareceria. Logo, os cidadãos sem meios (mais de metade da população) passariam a viver menos tempo e a ter menos qualidade de vida. Imaginem a mercantilização da nossa saúde… Só quem tem dinheiro teria direito, por exemplo, a tratamento oncológico…

– Seria o fim da Escola Pública. Isso significaria que o principal elevador social deixaria de funcionar, significando isso que Portugal se tornaria numa espécie de sociedade de castas à maneira indiana.

– Existiria uma espécie de criminalização da pobreza, nomeadamente a pobreza dos idosos. Portugal passaria a ser como um qualquer país da América latina onde predomina o Darwinismo Social, onde apenas os mais endinheirados teriam direito à dignidade.

– Seria a legitimação das hordas xenófobas e racistas. Abrir-se-iam as portas à caça ao negro e ao cigano perpetrada por aqueles que negam o Holocausto e tatuam suásticas no peito. Viveríamos um regresso aos tempos da Inquisição, pois, afinal, Deus entregou “a difícil mas honrosa missão de transformar Portugal” ao “comentador de futebol”.

É para evitar a preparação deste pesadelo que eu apoio e votarei em João Ferreira, o candidato que é o exato oposto de “o comentador de futebol que fala com Deus”. Mas, mesmo que não se vote em João Ferreira, o mais importante, como se diz em França, é “fazer barragem” ao fascismo, ao racismo, à misoginia e à criminalização da pobreza.

Chegou a hora de, também em Portugal, gritar: NÃO PASSARÃO!

 

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LusoJornal