Lusa | Paulo Novais

Opinião: Um país que esquece os seus: a vergonha do Estado perante os portugueses residentes no estrangeiro


Quero começar por saudar e agradecer a intervenção clara e corajosa do Secretário-Geral do Partido Socialista, no Parlamento, logo após o seu regresso de Paris, onde esteve junto da Comunidade portuguesa. Na sua declaração [ler artigo do LusoJornal AQUI], reafirmou a disponibilidade do PS para promover uma apreciação parlamentar da legislação que permita corrigir a injustiça gritante cometida contra os Portugueses residentes no estrangeiro, eu repito, portugueses e não “emigrantes” porque portugueses somos todos, no que diz respeito à reconstrução das suas casas destruídas pelos incêndios.

A polémica tem origem numa frase proferida pelo Ministro Manuel Castro Almeida, que ficará tristemente registada na memória coletiva: ” A casa é para a pessoa ter onde dormir, é essa a lógica. Nós não vamos repor o património”.

Esta frase não é apenas infeliz, é ofensiva e humilhante. Revela uma visão mesquinha e desrespeitosa de um Estado que reduz a casa ao mero teto que protege do frio, esquecendo que, para milhares de Portugueses no estrangeiro, essas casas representam sacrifício, identidade, raízes e dignidade.

Durante décadas, foram precisamente esses Portugueses que o Estado insiste em tratar como “emigrantes”, como se fossem cidadãos de segunda que sustentaram a economia nacional. Foram eles que enviaram remessas, que investiram em Portugal, que mantiveram viva a ligação a uma pátria que muitas vezes os obrigou a partir por causa da miséria e da falta de oportunidades.

E agora, quando as chamas consomem a única casa que ainda possuem em solo português, muitas vezes o lar construído com suor e saudade para voltar na velhice, o Estado vira-lhes as costas. Não há apoio, não há reconhecimento, não há justiça. Há apenas frieza burocrática e desprezo político.

Dizer que “não se repõe património” é cuspir na cara de quem nunca deixou de acreditar neste país. É ignorar que, para muitos, aquela casa não é apenas uma segunda residência: é o símbolo da ligação que nunca foi quebrada, o único pedaço de Portugal que sempre esteve à espera do seu regresso.

O Estado português mostra-se, mais uma vez, ingrato e hipócrita: abre os braços para receber o dinheiro das remessas, mas fecha-os quando chega a hora de proteger o esforço e a história dessas pessoas. E fá-lo com a arrogância de quem acha que um cidadão português vale mais se dormir todos os dias no território nacional do que se viver em França, Luxemburgo, Suíça ou Canadá.

Esta política é um erro moral e político grave. Revela um Governo fraco, incapaz de reconhecer o valor de quem sempre esteve presente, mesmo estando longe. Revela um Ministro sem sensibilidade e sem visão.

Por isso, a intervenção do Secretário-Geral do PS merece ser sublinhada e aplaudida: porque coloca o dedo na ferida e chama a atenção para uma injustiça que não pode ser ignorada. É tempo de o Parlamento corrigir esta lei injusta e devolver dignidade e respeito a quem nunca deixou de ser português.

Um país que abandona os seus é um país pobre. Um Governo que despreza os que mais contribuíram para a sua sobrevivência é um Governo sem memória e sem vergonha.

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Olímpio Sobral

Professor