Opinião: Uma língua invisível?


Participei numa conferência organizada pela Embaixada de Portugal em Paris, para celebrar os 50 anos da independência dos países africanos de língua portuguesa. Excelente iniciativa!

Estavam cerca de 60 pessoas, na maioria portugueses e alguns Embaixadores de outros países.

Fiquei surpreendido que os 3 oradores portugueses universitários (2 professores e uma investigadora), tenham feito as suas intervenções em inglês, sem outro suporte audiovisual.

No momento final das questões, achei interessante o comentário do Embaixador do Congo (em francês) afirmando que “Portugal foi um dos últimos países europeus a descolonizar e que esta descolonização foi também o resultado do apoio de países africanos. Por exemplo a sede do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), estava situada no Congo. Portugal moderno nasceu também desta luta dos países africanos que contribuíram para a descolonização”.

Gostei imenso da intervenção de um jovem estudante a participar no Programa Erasmus em Paris, e que estando na Embaixada de Portugal se atreveu a falar a “Língua de Camões” colocando a seguinte pergunta aos oradores: “Sabendo que por exemplo em Angola, cerca de 70% da juventude tem menos de 25 anos, como ligar mais os jovens à CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa)?”

E para aumentar a minha surpresa, os oradores (portugueses) responderam na língua de Shakespeare (o maior escritor da língua inglesa).

Falando com vários participantes, constatei que também eles ficaram surpreendidos que esta conferência (na Embaixada de Portugal), não tenha sido feita em português (ou em francês, língua que todos teriam compreendido).

Falando com o Senhor Embaixador, compreendi, que os oradores “não se sentiam confortáveis para fazer as intervenções em francês.”

Então porque não ter optado pela afirmação da nossa língua, com o recurso a uma tradução simultânea para cerca de 10 convidados que não compreendiam o Português? Falta de orçamento? Por que não terem recorrido a um intérprete voluntário ou a outros meios audiovisuais para facilitar a compreensão?

Fui professor de Português em França durante 20 anos para que a nossa língua se torne cada vez mais visível, graças ao apoio do estado português através do Instituto Camões.

Será que vamos assistir à supremacia do inglês e que “a Língua de Camões” se vai tornar cada vez mais invisível?

Gosto sempre de ir à Embaixada de Portugal em Paris, muito ligada à Comunidade portuguesa e empenhada na promoção, diversidade e qualidade da oferta cultural portuguesa e luso-francesa em França.

Esta foi a única vez que fiquei desiludido. Não completamente!

Felizmente que no final houve um “cocktail” com uma saborosa “cachupa” (prato emblemático de Cabo Verde) e os deliciosos pastéis de nata, para compensar a deceção!

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Adelino Oliveira
Professor de português aposentado