LusoJornal | Carlos PereiraParis: Adeline Afonso apresenta tese sobre “Os primeiros anos de Portugal nas Comunidades Europeias”Carlos Pereira·Ensino·17 Novembro, 2025 A lusodescendente Adeline Morais Afonso vai defender na próxima sexta-feira, dia 28 de novembro, a tese de doutoramento em História e Relações Internacionais, intitulada “Os primeiros anos de Portugal nas Comunidades Europeias – O surgimento do euro-atlantismo (1986-1992)”. A apresentação vai ser feita no Campus de Malesherbes da Sorbonne Université, entre as 9h00 e as 12h00. Adeline Afonso nasceu na cidade de Vienne (38), a cerca de 30 quilómetros de Lyon. A partir de 2009 viveu em Portugal porque os pais decidiram regressar a Vila Flor, em Trás-dos-Montes. Ficou lá 5 anos, acabou o ensino secundário e voltou para Paris, para estudar História na Sorbonne e acabou por se especializar em História das Relações Internacionais, História Contemporânea.Numa entrevista ao LusoJornal, falou do assunto da tese e explicou como tudo começou. . Como chegou a este tema para a sua tese? Comecei com uma tese de mestrado focada no papel de Portugal nas relações entre a União Europeia e o Brasil, entre os anos 90 e os anos 2000. E a partir dessa investigação, quis ir mais longe no estudo da política externa portuguesa e da ligação de Portugal com a Europa. Foi assim que, no doutoramento, acabei por me lançar numa tese sobre os primeiros anos da participação de Portugal nas Comunidades Europeias, e tentei perceber a emergência do Euro-Atlantismo nesses primeiros anos de desenvolvimento. O que é o Euro-Atlantismo? É aquilo que caracteriza hoje a política externa portuguesa, que é uma orientação europeia com características atlânticas. O que eu tento demonstrar com a tese é que a nossa política externa esteve durante cinco séculos orientada para o Atlântico, com ligações com a Europa relativamente pouco desenvolvidas, em comparação com o Império Colonial, por exemplo, ou até em relação aos Estados Unidos e ao Reino Unido. Só que depois tivemos a Revolução do 25 de Abril e a partir daí iniciou-se uma espécie de transição desse modelo tradicional da política externa portuguesa para um modelo que conhecemos hoje. Eu tento demonstrar com a minha tese que esse período de transição entre os dois modelos de política externa vai além de 1986 [ndr: data de entrada oficial de Portugal na Comunidade Económica Europeia]. Nos primeiros anos da participação de Portugal na CEE, ainda há uma espécie de ambiguidade entre o antigo modelo e o atual modelo de política externa. É por isso que eu falo da emergência do Euro-Atlantismo, que é uma espécie de complementaridade entre essa orientação europeia com algumas características ainda daquilo que foi a nossa política externa tradicional – as relações com os Estados Unidos e com o Reino Unido, mas também a ligação com os antigos países que eram colonizados, que hoje são os países da CPLP. E para além desta transição o que mais traz de novo esta tese? Os dados que dou a conhecer, são novos. Até ao momento, a literatura científica interessou-se, sobretudo, pelas negociações da Adesão. E, na verdade, ainda não há estudos detalhados sobre os primeiros anos da Adesão de Portugal. Então, o que eu trago de diferente, nem que seja pela metodologia, é um estudo histórico em que me baseei em muitos arquivos, não só portugueses, nomeadamente do Ministério dos Negócios Estrangeiros, os Arquivos diplomáticos, mas também arquivos de outros países e também da própria União Europeia. Por exemplo, estive em Florença, onde se encontram os arquivos históricos da União Europeia. Baseei-me nesses documentos, mas também em documentos dos Arquivos Nacionais do Reino Unido e alguns documentos aqui de França, para tentar perceber qual é foi a perceção dos outros países, dos outros Estados-membros, relativamente a esses primeiros anos da participação de Portugal nas Comunidades europeias. Então, digamos que não estou aqui a contradizer aquilo que já foi dito, apenas trago algumas informações adicionais, como, por exemplo, a Adesão acabou por distanciar a aliança antiga entre Portugal e o Reino Unido. O que nós observamos é que dentro das Comunidades Europeias, logo de início, percebe-se que Portugal, que sempre foi aliado do Reino Unido a nível de política externa, muitas vezes continuava a alinhar-se com o Reino Unido, e o que observamos é que Portugal vai ter tendência a afastar-se das posições do Reino Unido e começar a aliar-se com outros países com quem, tradicionalmente, Portugal nem tinha grande afinidade. De que países está a falar? O exemplo, o mais significativo é a Espanha. Logo de início, relativamente à política de coesão, Portugal acaba por se alinhar com a Espanha, mas também às vezes com a Itália, e sobretudo com a Grécia e com a Irlanda, nessa questão de coesão, e, nomeadamente, para conseguir mais fundos estruturais. Este é um bom exemplo de como Portugal acaba por se afastar do Reino Unido, porque o Reino Unido não quer aumentar o orçamento da União Europeia, em particular os fundos europeus, quando outros países com quem Portugal até aí não tinha grande afinidade, acabam por se aliar e isso acaba por também modificar um pouco a postura da política externa de Portugal. Esta é uma tese comum entre a Sorbonne e a Universidade Nova de Lisboa. Isto quer dizer que é um diploma duplo? Nós estabelecemos um protocolo de cotutela internacional, ou seja, no fim, são dois diplomas, um diploma da Sorbonne e um diploma da Universidade Nova de Lisboa. Aqui, em Paris, estou inscrita em História e em Lisboa estou inscrita em Relações Internacionais, ou seja, também tive de combinar duas metodologias, a metodologia histórica e a metodologia das Relações Internacionais, que é muito mais teórica. Então, também foi muito interessante, a nível metodológico, ter uma abordagem interdisciplinar, combinando estas duas disciplinas. Isto também faz parte da originalidade, de alguma forma, da minha tese. A direção da tese também é dupla, com Laurent Warlouzet da Sorbonne Université e com Nuno Severiano Teixeira da Universidade Nova de Lisboa. No final, temos só um manuscrito, mas vão ser dois diplomas. E agora? Depois da tese, o que vai fazer? Eu tenho um projeto de criação de uma editora, em que o objetivo é a promoção do bilinguismo e do multilinguismo literário. Comecei já a trabalhar sobre isso, só que tive de fazer uma pausa para redigir a tese. Mas há algumas semanas voltei a relançar a máquina, como se diz, e espero que em 2026 vou poder começar a trabalhar com autores em novos projetos editoriais e espero que em breve haverá mais novidades.