Portugal em destaque no Festival de cinema de animação de Annecy que começou ontem


Um dos festivais mais concentuados na área – o Festival de cinema de animação de Annecy – começou ontem e Portugal é um dos países em destaque, com uma presença inédita de filmes, projetos, realizadores, produtores, estudantes, e com Regina Pessoa entre as personalidades convidadas. É a primeira vez que o cinema português de animação tem uma representação substancial neste festival.

Regina Pessoa, que já foi premiada em Annecy em 2006 e em 2019, terá uma ‘masterclasse’ para estudantes, um pequeno filme na competição oficial, uma exposição, tendo ainda desenhado o cartaz oficial do festival, no qual surgem cravos vermelhos, numa referência aos 50 anos da Revolução do 25 de Abril de 1974.

Foi desenhada uma programação com sete momentos distintos, que permite recuar aos primeiros filmes de animação, feitos há cem anos, revelar a mais recente produção, com diferentes abordagens artísticas e estéticas, e dar a conhecer as obras que estão ainda em projeto.

Entre esses momentos de programação está uma retrospetiva dedicada à cooperativa de animação BAP Animation e outra sobre os cineastas Regina Pessoa e Abi Feijó.

Sendo Annecy um ponto obrigatório do calendário internacional do cinema de animação, acontecerá ainda o mercado do filme (MIFA), no qual Portugal estará presente com um espaço próprio, coordenado pelo Instituto do Cinema e do Audiovisual, com a presença de 18 dos quase 50 estúdios e produtoras que trabalham em Portugal.

Estão previstos painéis de debates e sessões de apresentação de projetos portugueses, dois em particular na seleção oficial: “Speransa”, a próxima longa-metragem de Nuno Beato, e “A flor e o peixe”, curta-metragem de José Miguel Ribeiro.

Este realizador, que também terá o cinema dele em retrospetiva, fará parte de um dos júris oficiais de Annecy. Nos júris estarão também o realizador David Doutel e a atriz Leonor Silveira.

Além da programação dedicada a Portugal – que sucede ao México como país convidado – há ainda cinema português nas competições oficiais, nomeadamente “Percebes”, de Alexandra Ramires e Laura Gonçalves, “Amanhã não dão chuva”, de Maria Trigo Teixeira, e a série televisiva “O diário de Alice”, de Diogo Viegas.

A eles juntam-se ainda a animação promocional “Chantelouve”, de Regina Pessoa, a coprodução “Mont noir”, de Jean-Baptiste Peltier e Erika Haglund, e os filmes de escola, coproduzidos pela Universidade Lusófona, “Être une graine”, de Julia Granillo Tostado, e “Is this how the time should let you go?”, de Yi-Chin Tsai.

Na galeria Art by Friends estará a exposição “Pão Pão, Queijo Queijo” com 15 talentos das artes e cultura urbana portuguesa, nomeadamente Ana Malta, Flavius, HalfStudio, Margarida Fleming e Kruella d’Enfer.

O 48º festival de Annecy abriu com “La plus précieuse des marchandises”, do realizador francês de Michel Hazanavicius, que tem o Holocausto como pano de fundo.

Em Annecy, com sessões já esgotadas, serão apresentadas as próximas novidades do cinema de animação, como os filmes “The Lord of the Rings: The War of the Rohirrim” (Warner), “O robot selvagem” (Dreamworks), a série “Twilight of the Gods”, o próximo filme “Wallace & Gromit” (Netflix), e ainda as primeiras imagens do filme “Vaiana 2” (Disney).

O realizador Terry Gilliam recebe um prémio de carreira, o cineasta Wes Anderson fará uma ‘masterclasse’ e o designer de moda Jean-Paul Gaultier anunciará o projeto de filme de animação que prepara para 2027.

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“ANIMA VAN” projeta filmes ao ar livre

O estúdio de animação Amarela Mecânica começou na segunda-feira da semana passada uma viagem numa carrinha, que é um cinema ambulante, com destino ao Festival de Cinema de Animação de Annecy. “A ideia foi juntar três autores e propor uma jornada cinemática que pudesse refletir sobre o estado do cinema de animação em Portugal, tendo em conta este momento em que será alvo de especial atenção no Festival de Annecy”, explicou o produtor Nuno Oliveira à Lusa.

Nuno Oliveira, Paulo D’Alva e António Pinto, da produtora Amarela Mecânica, sediada em Braga, desenvolveram o “ANIMA VAN”, um projeto de cinema itinerante numa carrinha, destinado a promover e a divulgar cinema de animação, em particular para escolas.

É com este projeto, com uma proposta de exibição pública, ao ar livre, de 101 filmes portugueses, que os três autores viajaram até Annecy, percorrendo localidades em Portugal, Espanha e França.

“Fazemo-lo recorrendo a uma metáfora literalmente da imagem em movimento neste veículo híbrido, camaleónico”, que tem incorporada uma tela para a projeção de cinema, disse Nuno Oliveira.

Depois de Avanca e Viseu, a carrinha passou por Pinhel (Guarda), seguindo depois para San Sebastian e Valladolid (Espanha), entrando em França, com paragem em Bordeaux e em Lyon, antes de estacionar em Annecy.

As 101 curtas-metragens portuguesas escolhidas são de profissionais e de estudantes de animação, criando uma “paleta o mais diverso possível para divulgar o que tem vindo a ser feito no país”.

“Achamos que é uma boa provocação: Estamos a dar espaço a muitas das obras que eventualmente não tenham encontrado espaço na curadoria da delegação portuguesa que vai estar presente” em Annecy, afirmou Nuno Oliveira.

Em Annecy, onde são esperadas milhares de pessoas, a “ANIMA VAN” está em espaços públicos, para exibição das curtas-metragens e para conversas com quem parar para assistir.

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Série de Diogo Viegas na competição de televisão

“O diário de Alice”, do brasileiro Diogo Viegas, está na competição de televisão. É uma série infantil produzida pela Sardinha em Lata, em coprodução com Brasil e Espanha, e já em exibição na RTP. Com episódios de quatro minutos, a série é protagonizada por uma menina de 5 anos que conta o seu dia-a-dia através do diário.

Na competição de animações por encomenda está uma obra da realizadora Regina Pessoa, uma animação promocional de vinte segundos feita para a empresa francesa Chantelouve.

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Longa-metragem de animação de Nuno Beato no programa oficial de apresentações

O produtor e realizador Nuno Beato trouxe uma pequena amostra de “Speransa” ao Festival de Cinema de Animação de Annecy, porque o projeto foi selecionado para o programa oficial de apresentações (‘pitching’) a profissionais.

“Speransa” é uma longa-metragem de animação, um filme de época sobre escravatura, colonialismo e liberdade, contou o realizador à Lusa.

“Speransa” (“Esperança”, em crioulo) é o título do projeto ainda em desenvolvimento pela produtora Sardinha em Lata, com argumento de Gisela Casimiro e Rafael Calça, realização de Nuno Beato e que será feito em animação 2D e ‘stop motion’.

Segundo Nuno Beato, o filme aborda “um lado da História de Portugal que é menos contado e que até tem estado um pouco nas notícias”, sobre a relação de Portugal com os países colonizados.

Segundo a sinopse, “Speransa” conta a história de “uma corajosa menina de nove anos, originária de uma ‘tabanka’ no que seria a atual Guiné-Bissau”, que é separada da família e levada num navio de escravos, onde se juntará a outros escravizados numa luta pela liberdade e pela sobrevivência.

A história é ficcional, mas remete para um tempo histórico no século XVI, em particular nos territórios da Guiné-Bissau, onde foi construído o forte de Cacheu, “estratégico para o tráfico negreiro praticado pela Coroa Portuguesa”, refere a sinopse da Sardinha em Lata.

No trabalho de pesquisa, a produção contou com apoio do Centro de Estudos Africanos, em Lisboa, até porque “é um tema sensível e não há muita informação sobre África. Há muita informação do lado europeu, no caso do lado português, mas há poucas informações sobre como é que a sociedade estava organizada, sobre as pessoas”, disse Nuno Beato.