Saúde: A influência da alimentação na microbiota durante o primeiro ano de vida


A microbiota, formada por microrganismos que coexistem connosco desde os primeiros momentos de vida, tem uma influência acrescida no primeiro ano de vida.

O primeiro ano de vida de um bebé é marcado por um crescimento e desenvolvimento determinante para a sua vida futura. Estes são condicionados por todos os eventos que ocorrem neste período. A microbiota, formada por microrganismos que coexistem connosco desde os primeiros momentos de vida, tem uma influência acrescida no primeiro ano.

A microbiota intestinal tem um papel crucial na atividade de vários sistemas do corpo humano, nomeadamente do sistema imunitário e do sistema nervoso central, sendo atualmente tema de estudo na comunidade científica. Esta ação torna-se mais importante em determinadas janelas temporais críticas do desenvolvimento, nomeadamente na preconceção, gravidez, vida peri-natal (que decorre entre a 28ª semana de gravidez e o sétimo dia de vida do bebé) e vida pós-natal. Estes períodos são sensíveis e, se perdidas as oportunidades de desenvolvimento da microbiota, as alterações no crescimento e nas funções sistémicas do corpo podem ser irreversíveis.

Há inúmeros fatores que são capazes de modular a composição da microbiota intestinal, nomeadamente: genética do bebé, saúde mental, nutrição, tipo de parto, alimentação, exposição a antibióticos, entre outros. A evidência científica tem demonstrado uma forte ligação entre uma nutrição com qualidade desde os primeiros anos de vida, e a diminuição do risco de desenvolver doenças crónicas a longo prazo.

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Desenvolvimento da microbiota

No nascimento, o intestino do bebé é um ambiente quase estéril. Este ambiente desenvolve-se durante o primeiro ano de vida, formando-se uma microbiota simples e altamente variável. É apenas por volta dos três anos de vida que se atinge uma microbiota densa, complexa e estável.

Assim sendo, a composição e a função da microbiota infantil sofrem diversas mudanças em resposta a vários fatores internos e externos. Ao longo da vida, a homeostase da microbiota é afetada inúmeras vezes, devido ao uso de antibióticos, a estados de inflamação, processos de envelhecimento, stress psicológico, nutrição, estilo de vida e outros fatores ambientais, como o tabagismo e a poluição.

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Influência da microbiota na saúde

Vários estudos demonstraram que perturbações na composição da microbiota infantil estão relacionadas com o risco de desenvolver determinadas doenças, nomeadamente:

– Asma;

– Alergias alimentares;

– Doenças inflamatórias intestinais (Colite Ulcerosa e Doença de Crohn);

– Diabetes mellitus tipo 1 e tipo 2;

– Transtorno do espetro do autismo;

– Défices comportamentais;

– Ansiedade;

– Depressão.

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Interação entre a alimentação e a microbiota

A alimentação e a nutrição são fatores-chave para a composição e a função da microbiota intestinal. A alimentação do bebé inicia-se logo após o nascimento e pode ser através de aleitamento materno ou fórmulas infantis.

O aleitamento materno é considerado o padrão de ouro para a nutrição infantil, uma vez que:

– Fornece macro e micronutrientes essenciais para o desenvolvimento do recém-nascido;

– Contém entre 100 e 10.000 bactérias viáveis por mililitro que afetam diretamente o estabelecimento da microbiota;

– Melhora o desenvolvimento neurológico e estimula o sistema imunitário;

– Contém compostos prebióticos, os oligossacáridos do leite materno ou também chamados de HMOs, que influenciam a maturação das células intestinais, favorecem o crescimento de bactérias benéficas e influenciam o sistema imunitário;

– Contém anticorpos e outras moléculas com propriedades antimicrobianas;

– Está associado à diminuição do risco de obesidade infantil e diabetes mellitus tipo 2.

Por sua vez, as fórmulas infantis são regulamentadas e produzidas de maneira a se assemelharem o máximo possível ao leite materno. Na produção destas fórmulas, há determinados aspetos que requerem maior atenção, nomeadamente a composição nutricional, componentes bioativos, sabor, textura e a suplementação prebiótica.

Os HMOs podem ter mais de 200 estruturas distintas de indivíduo para indivíduo. No entanto, a indústria não tem a capacidade de reproduzir todas estas estruturas. Assim, as fórmulas infantis podem ser suplementadas com outros compostos prebióticos com estruturas mais simples e parcialmente substituir os HMOs do leite materno e os seus benefícios.

A suplementação prebiótica tem sido cada vez mais considerada e surgiu de modo a aproximar ainda mais este modo de alimentação ao aleitamento materno. Quando comparada a microbiota de lactentes com fórmulas infantis sem suplementação e lactentes com fórmulas infantis com suplementação, conclui-se que estes últimos têm uma microbiota muito mais parecida aos lactentes com aleitamento materno.

Quando o bebé inicia a diversificação alimentar, a sua microbiota sofre alterações de acordo com os alimentos introduzidos entre os 4 e os 12 meses de idade, sendo que as mudanças mais significativas ocorrem entre os 4 e os 9 meses de idade.

A introdução precoce de alimentos que são considerados potenciais alergénicos, como por exemplo os ovos e os amendoins, tem-se mostrado benéfica na prevenção de alergias e intolerâncias alimentares.

A microbiota infantil progride em composição e função durante o primeiro ano de vida, de acordo com inúmeros fatores intrínsecos e externos, nomeadamente a alimentação. Compreender a ligação entre a tríade nutrição pós-natal, neuro desenvolvimento e microbiota intestinal é essencial para desvendar os mecanismos de doenças que se acredita estarem enraizadas no início da vida.

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Dra. Beatriz Vieira

Nutricionista

Hospital Lusíadas Amadora

LusoJornal