Saúde: Depressão Pós-Parto: dar voz às mulheres além da maternidade


O período da gravidez assim como o pós-parto, continuam ainda a ser amplamente fantasiados como um período de prosperidade e de grande felicidade. E talvez seja assim em muitas famílias e para muitas mulheres, mas sabemos no âmbito clínico que não o é para todas.

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A grande prevalência e o efeito transgeracional da depressão pós-parto, fazem com esta psicopatologia constitua um problema de saúde mental que merece a nossa atenção. A depressão pós-parto é uma patologia multifatorial, cuja etiologia exata não foi ainda estabelecida. Sabemos que a gestação e o puerpério são períodos na vida da mulher que envolvem inúmeras e significativas alterações físicas, hormonais, psíquicas e relacionais (no âmbito sociofamiliar) mas muitas vezes ignoramos as suas potenciais repercussões na saúde mental das mesmas e que se podem prolongar no tempo.

Os dados referentes à incidência e prevalência desta psicopatologia em Portugal continuam a ser escassos e pouco claros. Estima-se que relativamente à prevalência, a depressão pós-parto atinja cerca de 10-20% das mulheres. Pensa-se igualmente que este distúrbio é três vezes mais comum nos países em desenvolvimento em comparação com os países desenvolvidos. Normalmente surge durante o primeiro ano após o nascimento, salientando-se uma maior incidência entre o 6º e o 8º mês após o parto.

Estima-se que relativamente à prevalência, a depressão pós-parto atinja cerca de 10-20% das mulheres

Relativamente às causas e etiologia, Beck numa meta análise identificou 13 fatores de risco. Nos dez fatores de risco, que possuem um efeito moderado incluem-se:

– depressão pré-natal;

– baixa autoestima;

– stresse associado aos cuidados da criança;

– ansiedade pré-natal;

– stresse diário;

– baixo suporte social;

– má qualidade da relação conjugal;

– história prévia de depressão;

– o comportamento problemático da criança;

– “postpartum blues”.

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Os outros 3 fatores são o facto de a mãe ser solteira, o baixo nível sócio-económico e a gravidez não planeada, possuindo um menor efeito na depressão pós-parto.

Outros fatores de risco como a má relação conjugal, o divórcio e a poligamia, bem como a monoparentalidade, assim como o baixo peso à nascença do bebé, intercorrências neonatais, malformações congénitas, e ausência de amamentação são apontados também por outros estudos.

É importante que se diga que devido ao estigma e sobretudo ao peso “de ser uma boa mãe”, “uma mulher forte” ou “se as outras conseguiram eu também consigo”, infelizmente a procura de ajuda vem atrasada, ou um diagnóstico preciso deixa de ser realizado devido à má interpretação da sintomatologia.

Aliás, não é pouco comum a grávida deixar de existir no seu papel de mulher, para existir apenas no seu papel de mãe. Todas as atenções, todas as preocupações se voltam apenas para o bebé. E esta negligência que acontece muitas vezes de uma forma disfarçada, parte muitas vezes da própria comunidade médica e terapêutica (mas também da família e dos amigos) ou não é por acaso que cada vez mais se fale em violência obstétrica.

A depressão pós-parto existe! Ela é uma perturbação depressiva séria, identificável, tratável e provavelmente uma complicação comum decorrente do parto para qualquer mulher.

A grande maioria dos estudos identifica 3 perturbações de ajustamento pós-parto: a “tristeza pós-parto” referida como “postpartum blues”, a depressão pós-parto (a qual nos debruçamos neste artigo) e por fim, a psicose pós-parto.

Resumidamente e porque o esclarecimento de informação é nosso objetivo e um dever: o “postpartum blues” ou “tristeza pós-parto” resume-se a uma forma mais moderada de depressão com sintomatologia transitória e que normalmente se resolve espontaneamente sem qualquer tratamento, durante os primeiros dez dias após o nascimento, verificando-se em cerca de 39-85% das mulheres. Já a psicose pós-parto representa a expressão mais severa destas três perturbações sendo que as mulheres têm uma probabilidade 22 vezes mais elevada de experienciar um episódio psicótico ou maníaco inicial no primeiro mês pós-parto do que em qualquer outra altura da vida.

Já a depressão pós-parto constitui um episódio depressivo que vai de encontro com os critérios de diagnóstico estabelecidos para a depressão minor ou major, com início no período após o parto. Os sintomas são semelhantes aos de uma depressão e incluem: o humor irritável e/ou severamente deprimido com crises de choro fácil, alterações do sono (normalmente insónia), fadiga, ansiedade (que podem incluir ataques de pânico e psicossomatizações), falta de concentração e preocupação excessiva sobre o bem-estar do bebé e das habilidades de cuidar como mãe.

A intervenção e acompanhamento ao longo do tempo por uma equipa multidisciplinar que acompanhe a mulher é fundamental pois em cerca de 50% dos casos, a depressão pós-parto ainda se encontra presente além dos seis meses após o parto podendo prolongar-se pelos quatro anos seguintes, evoluindo para uma perturbação depressiva crónica.

Ser mãe é talvez um dos papeis mais importantes da vida de uma mulher, mas não deixa de ser um papel. Na sua essência a mulher é um ser humano que precisa de tempo e espaço para a expressão do seu sofrimento, sobretudo numa fase tão desafiante.

A psicoterapia de apoio, cria oportunidades para esse espaço e para o alargamento da rede de suporte social da mulher dando-lhe ferramentas para lidar com as alterações físicas, psicológicas e sociofamiliares decorrentes da gravidez, assim como ressignificar o nascimento do bebé talvez como uma bela oportunidade para se fazer renascer a si mesma.

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Dra. Catarina Monteiro

Psicóloga na Clínica Dra Rosa Basto

LusoJornal