Lusa | António Cotrim

Tiago Rodrigues destaca “momentos fundamentais” do Festival d’Avignon


O Diretor do Festival d’Avignon, Tiago Rodrigues, destacou a multiplicidade das origens dos espetáculos em língua espanhola, este ano convidada do certame, e as criações francesas sobre originais espanhóis, como “momentos fundamentais” da edição deste ano.

A “grande quantidade de espetáculos em língua espanhola”, oriundos de Espanha, Argentina, Chile, Peru, Uruguai, com participação de artistas provenientes da Bolívia, do México e da Colômbia, e as criações de artistas franceses a partir de património cultural de língua espanhola, como a encenação de “Quichotte”, por Gwenael Morin, com a atriz e cantora Jeanne Balibar, constituem dois vetores fundamentais desta edição, segundo o ator, encenador e dramaturgo português Tiago Rodrigues, em declarações à Lusa.

A posição de “artista cúmplice” com o festival, criada este ano por Tiago Rodrigues – uma presença que “ganha significado especial, repercutindo-se na programação ao ponto de irrigar o espírito de uma edição”, como se lê na sua apresentação – é ocupada pela “grande figura da dança contemporânea europeia Boris Charmatz”, que apresenta “três criações, todas ligadas à ideia de transmissão”, indicou Tiago Rodrigues, numa referência à passagem de testemunho, de dádiva, de capacidade de descoberta.

“Liberte Cathédrale”, primeira criação de Charmatz como sucessor de Pina Bausch no Tanztheater Wuppertal, e “Forever – Immersion dans ‘Café Müller’ de Pina Bausch”, revisitação de uma das obras-chave da coreógrafa alemã, são duas dessas criações. A terceira, “Cercles” (“Círculos”), resulta da oficina de dança no Estádio de Bagatelle, em cujo relvado se reunirão 200 pessoas, amadoras e profissionais, para aprenderem a dançar juntas.

Da Argentina, Avignon acolhe duas peças de Tiziano Cruz que lidam com a realidade dos povos indígenas e a relação de resistência da língua quechua à espanhola, enquanto colonizadora, “que ameaçou de extinção o seu povo”.

É assim com “Solilóquio”, que questiona o lugar dos corpos indígenas e, mais amplamente, das culturas ignoradas, “invisibilizadas num mundo governado pelo modelo do colonizador”; e também com “Wayqeycuna” (“Os meus próprios irmãos”, em tradução livre do quechua), peça autobiográfica inspirada num ritual indígena, que questiona o neoliberalismo dominante.

A presença da uruguaia Tamara Cubas, com “Sea of Silence”, é, segundo Tiago Rodrigues, outro momento em destaque do festival. A peça que se define como “um rito descolonizador” faz parte do projeto de Tamara Cubas sobre migrações femininas.

Ao nível da programação do festival, que termina a 21 de julho, o Diretor artístico destaca ainda o regresso do encenador polaco Krzysztof Warlikowski a Avignon, cerca de uma década depois de aí ter apresentado “(A)pollonia”. Este ano é a vez de “Elizabeth Costello. Sept leçons et cinq contes moraux”, a partir da obra do Nobel da Literatura J.M. Coetzee.

Da presença portuguesa, língua que Tiago Rodrigues mantém em linha para vir a ser convidada numa próxima edição, constam Miguel Fragata e Inês Barahona – a dupla Formiga Atómica – que levam a cena “Terminal – O Estado do Mundo”, sobre a crise climática. A dupla apresenta ainda os dois filmes “Retour au futur – Avignon” e “Improbable dos à dos”, na secção Territoires Cinématographiques, feita em colaboração com os cinemas Utopia da cidade francesa.

O festival abriu com a apresentação da peça “Dämon – O funeral de Bergman”, da criadora espanhola Angélica Liddell, e junta a Comédie-Française a Tiago Rodrigues, para a estreia de “Hécuba, não Hécuba”, peça escrita e dirigida pelo próprio encenador e dramaturgo português, Diretor do Festival d’Avignon, que conjuga a intemporalidade da tragédia de Eurípides com a tragédia vivida na atualidade pela atriz que a interpreta.

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