Um livro duro sobre as crianças brasileiras: As infâncias perdidas do Brasil

Edison Ferreira de Macedo, doutorado em História por Paris VII e pós-doutorado em Sociologia da Educação e Ciências da Informação, especializou-se em História da Infância e da Educação e acaba de publicar “Du Brésil Colonial à nos jours – une histoire d’enfances volées” (Éditions L’Harmattan). Esta obra é o resultado da sua tese de doutoramento.

O autor, que teve ele próprio uma infância difícil na cidade industrial de Rio Tinto, no Estado de Paraíba, vivendo longe dos pais, operários fabris, começou em 1997, saído da faculdade, a trabalhar com meninos de rua na cidade de João Pessoa. Este trabalho de educador social com crianças e adolescentes em situações dramáticas (privados de casa, família e vítimas de violência institucional) levou-o a enfrentar casos extremos de racismo que se perpetuam num país alicerçado em uma aberrante desigualdade social, que é a principal causa da violência endémica que faz do Brasil um dos países no mundo com a maior taxa de criminalidade, incluindo homicídios. Por exemplo, enquanto em Portugal, no ano de 2017, aconteceram 82 assassinatos, no Brasil, no mesmo período, tiveram lugar 59.080. Ou seja, se Portugal tivesse a dimensão demográfica do Brasil, em proporção, haveria lugar a 1.620 homicídios. Isto é, Portugal teria uma taxa de homicídio 36 vezes menor que o Brasil.

É neste ambiente de violência extrema, mais impensável ainda por estarmos a falar de crianças, que o autor mergulha.

Na primeira parte, Ferreira de Macedo, centra-se na violência sofrida pelas crianças desde a colonização portuguesa até aos anos de 1970. A igreja católica não escapa à análise do autor que a acusa de criar um “sistema concentracionário” e autoritário. A igreja, segundo o autor, utilizou um discurso hipócrita, visto ter utilizado a caridade como desculpa para a exploração infantil e a servidão.

Na segunda parte, décadas de 1980/90, Ferreira de Macedo liga o aumento das violências públicas e privadas contra as crianças ao incremento da desigualdade social no Brasil. As crianças, devido à espiral de pobreza sem esperança, transformam-se em soldados ao serviço do narcotráfico e da violência urbana, terminando quase sempre uma vida infeliz numa bala perdida ou numa penitenciária sobrelotada.

Um livro duro, de análise factual, que põe a nu a grande contradição brasileira: como é que um dos maiores e mais ricos países do mundo não consegue dar uma existência digna às suas crianças?

 

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LusoJornal