Flávio Martins: Presidente do CCP considera que é necessário mais Comunidades no Ministério dos Negócios Estrangeiros

Na semana passada teve lugar em Lisboa mais uma reunião do Conselho Permanente do Conselho das Comunidades Portuguesas, numa entrevista conjunta do LusoJornal e da RDP internacional, Flávio Martins, o Conselheiro eleito no Brasil que preside a este órgão de consulta do Governo português em matéria de Comunidades portuguesas, faz o balanço da reunião.
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Qual o balanço deste encontro, o que é que fica para o Flávio Martins e para os restantes Conselheiros?

O trabalho é sempre muito árduo, é cansativo, mas o que nos move é sabemos que alguns resultados estão previstos. Não sei ainda se isso se tornará realidade, mas quando ouço de todos os Grupos parlamentares, por exemplo, que estão disponíveis para um teste piloto do voto eletrónico, algo parece que mudou, porque até há bem pouco tempo atrás havia muita desconfiança, inclusivamente em relação a um teste.

Isto significa que nós andámos, caminhámos, demos mais uns passos adiante, além disso, parece que há uma grande sensibilidade – não sei se há um consenso sobre todos os temas – de se fazer uma revisão à Lei eleitoral, para se aplicar nas Comunidades, não apenas nesta questão do projeto piloto de voto eletrónico descentralizado, mas também para, por exemplo, discutirmos se é viável ou não que os votos postais possam ser contados nos espaços consulares.

Tivemos algumas informações importantes – apesar de não serem necessariamente as respostas que nós gostaríamos de ouvir – mas ouvimos alguma informação pertinente do Instituto Camões, do Instituto de Registos e Notariado (IRN) sobre questões relativas ao ensino português no estrangeiro ou a aquisição da nacionalidade, por atribuição, por casamento, e sobre as demoras no IRN, acho que foi um encontro muito interessante, foi positivo. O balanço, portanto, é positivo, de resto, o balanço sempre é positivo nesses encontros.

Em relação ao novo Orçamento do Estado, há já diretivas sobre o que vai fazer o Governo em matéria de Comunidades, vocês analisaram o documento? E sobre o orçamento do CCP?

Nós fomos informados que foi encaminhado pelo Diretor-geral da DGACCP uma proposta – que é idêntica à dos dois últimos anos – de 420 mil euros, que, entretanto, aparece com 320 mil euros, o que significa que pelo menos 100 mil euros serão cativados. Isso preocupa-nos porque nós fizemos uma proposta de 500 mil euros e foi fundamentada. Há questões que nós gostaríamos de ver desenvolvidas. Nós temos de ter um Gabinete de apoio, uma sala, um espaço, um ponto de referência. Um Conselheiro que esteja em Lisboa por qualquer motivo pode ter ali um espaço para estabelecer contatos para as suas Comunidades, para a sua própria estrutura, para o seu Conselho Regional, para o Conselho Permanente, para a sua Secção local. Gostaríamos de ter ali duas pessoas, inclusivamente com um perfil já por nós designado, para que pudessem ajudar, inclusivamente na questão – que é muito precária para nós – da comunicação.

Até para a implementação de um e-mail institucional. Foi uma ideia apresentada no Plenário no ano passado. Hoje foi garantido pelo Secretário de Estado que vai-se avançar com isso.

Eu sei que nós recebemos críticas porque as pessoas, quando ouvem 500 mil euros, parece muita coisa, mas temos de ver que se trata da atividade de 76 pessoas espalhadas mundo fora, a verdade é que isso não é muito. Eu não vou dizer que é pouco. Pouco não é, porque nós nunca recebemos tanto. Mas não é muito.

E quanto ao Orçamento de Estado em geral?

Em relação a outras áreas, como isso foi entregue no fim da semana passada e são três ‘calhamaços’ grandes, com mais de 500 páginas, e que nós temos estado em reuniões aqui… O que nós ouvimos, entretanto, é que há ali previsões, inclusive de reforço e de recuperação do salário dos professores, dos Coordenadores de ensino do português no estrangeiro, reforços técnicos também e recomposição salarial para os postos consulares.

Entretanto, ao voltarmos para os nossos países de acolhimento, nós faremos essa reflexão e enviamos para cá depois. O que, aliás, foi uma pergunta que foi feita por um Deputado, o Hugo Carneiro, na primeira Comissão, o que nós achávamos da Lei da nacionalidade e das alterações propostas. E eu fui absolutamente sincero com ele. Nós ainda não temos uma posição definida, justamente porque não pode ser a minha posição, tem de ser a posição do Conselho Permanente, dos próprios Conselhos Regionais. Então, o que nós nos comprometemos foi, o mais rápido possível, vamos tentar apresentar alguma coisa.

Tem de ser assim. Nós precisamos de tempo. Quando nós fizemos aquela manifestação por conta do decreto de apoio às vítimas dos incêndios, havia pessoas que lamentavam que o Conselho não se manifestava. As coisas não funcionam assim, nós não somos Deputados, políticos, nós temos uma responsabilidade coletiva. Não pode ser a opinião de um ou de outro Conselheiro, mas sim, pelo menos da maioria.

Os serviços consulares evoluíram muito nos últimos anos, os serviços funcionam muito melhor. No Orçamento de Estado está prevista a modernização dos consulados. Na vossa opinião, ainda é possível melhorar?

Acho que há três pontos aqui que são importantes. Primeiro, a plataforma que se implementou tem de ser mais diversificada, tem de ter mais funções, talvez tenha de passar pelo crivo da apreciação das nossas Comunidades, até para indicarmos o que pode ser melhorado. Ou seja, a plataforma é um bom caminho, mas é um caminho ainda no início, precisa de ser melhorada, muito melhorada.

Um segundo ponto, em relação à implementação de tecnologias ou melhoria do atendimento, etc. Tem melhorado? Tem. Tem de melhorar? Muito ainda. Porque a verdade é esta: Portugal tem comunidades em quase 190 países. Quer dizer, a rede consular portuguesa ainda está talvez muito aquém das necessidades de todos os que vivem lá fora. Eu sei que há uma questão orçamental, Portugal também não é um país que se possa preocupar somente com essa parte, há outras questões internas que são tão necessárias quanto esta.

E no terceiro ponto, eu acho que nós precisamos de diplomatas mais próximos das nossas Comunidades. Eu acho que nós precisamos, não que nós não precisemos de Negócios estrangeiros, mas nós precisamos de mais Comunidades portuguesas nisso tudo. Eu não digo isto em relação à minha área consular, mas a experiência que nós temos é que há diversos postos consulares que têm muitos problemas e que talvez uma sensibilidade maior das chefias fosse razão para melhorar. Não digo todos ou a maioria, mas alguns desses problemas. Então eu acho que nós precisamos de mais Comunidades portuguesas no Ministério dos Negócios Estrangeiros.

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Entrevista conduzida por Carlos Pereira (LusoJornal) e Paula Machado (RDP internacional)