LusoJornal | Carlos Pereira Home Entrevistas Rosa Teixeira Ribeiro: Há funcionários consulares sem cobertura socialCarlos Pereira·5 Setembro, 2017Entrevistas Rosa Maria Teixeira Ribeiro é funcionária do Consulado Geral de Portugal em Paris e esteve dois anos, à frente do Vice-Consulado de Portugal em Nantes, mas está atualmente em missão em Lisboa, por ter sido eleita Secretária Geral do Sindicato dos Trabalhadores Consulares e das Missões Diplomáticas no Estrangeiro (STCDE). O STCDE foi criado em Paris, nos anos 80, e integra os trabalhadores dos serviços periféricos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, nomeadamente dos postos consulares, das missões diplomáticas e das representações. Integra também os trabalhadores do Instituto Camões e das delegações da AICEP no estrangeiro. De fora ficam apenas os Professores de português e os Diplomatas, porque ambos têm os seus próprios sindicatos. Substituíndo Jorge Veludo, Rosa Teixeira Ribeiro está à frente de um sindicato com 1.136 sócios, num universo de cerca de 1.400 trabalhadores no ativo. Durante o verão respondeu às perguntas do LusoJornal. Os trabalhadores consulares têm uma taxa de sindicalização elevada não é? Esta taxa sempre foi elevada, porque sempre foi um grupo de trabalhadores que, pela distância, pelo afastamento, pela complexidade de país para país, entre a França, a Bélgica, Suíça, a Alemanha, mas também a Indonésia ou Angola,… tem de ter um sindicato forte. Durante muitos anos os trabalhadores ou não tiveram estatuto, ou tiveram um estatuto que não era aplicado, ou que não se coadunava com a sua atividade. Agora têm um estatuto que é híbrido, que criou um tronco comum de condições, mas atira muito para a legislação local. O estatuto é a grande vitória do Sindicato? A grande vitória do Sindicato é de facto ter um estatuto para estes trabalhadores. É também começarmos a ter estruturas salariais com algumas regras. Porque antigamente, a fixação dos salários dependia também do físico das pessoas… A dificuldade do Sindicato é integrar estas disparidades em algo mais construído. Tínhamos leques salariais de 1 para 30! Aliás, muitas vezes os diplomatas atiram-nos à cara que temos trabalhadores com salários de “milionários” porque estavam a ganhar 5.000 euros/dólares ou mais. Ora não fomos nós que lhes fixámos estes salários, sempre contestámos estes leques salariais absolutamente disparatados. Quando era possível negociar, tentava-se equilibrar. Mas todos nós estamos sujeitos a regras, a Administração pública portuguesa está sem aumentos salariais desde 2009 e nós estamos sem aumentos de salário no estrangeiro desde 2009. Isto é algo que não conseguimos ultrapassar. Mas o salário é visto em função do país em que moram os trabalhadores, não é? Não. Era suposto ser, sim, mas não é. Uma das grandes vitórias do Sindicato foi pelo menos nos sítios onde há salários mínimos, respeitar esses salários mínimos. Tivemos há pouco tempo uma intervenção no Ministério porque na Índia estabeleceu-se o salário mínimo para os trabalhadores. Fomos ver alguns trabalhadores na Embaixada portuguesa em Nova Deli e estavam 50% abaixo, está a ser corrigido e vai ser pago, porque os salários eram na ordem de 120 euros por mês. Tínhamos 3 trabalhadores nestas condições. Depois temos trabalhadores sujeitos a obrigações fiscais em Portugal e outros sujeitos a obrigações fiscais no país. Por escolha própria? Não. Nós tivemos um estatuto 444 em 1999 que interrogou os trabalhadores, se faziam opção pela função pública ou por contratação local. Quem fez opção pela função pública, ficou sujeito à ADSE, à Caixa Geral de Aposentações e ao IRS em Portugal. Quem escolheu a contratação local, ficou sujeito ao pagamento de impostos locais. Nós estamos a correr processos em tribunal porque não houve a devida compensação da Administração pública. Os trabalhadores, quando passaram a pagar impostos – porque antigamente os funcionários públicos não pagavam o IRS em Portugal – houve uma compensação e nem todos os trabalhadores tiveram essa compensação. Além disso, o problema com os trabalhadores na Suíça é devido aos salários elevados, que implicam a maior percentagem do IRS, como se estivessem em Portugal. Portanto têm 5.000 euros e têm uma percentagem IRS de 40, aos que acrescem as quotizações sociais mais as sobretaxas. Resultado: os trabalhadores recebem em líquido menos de metade do que aquilo que ganham. LusoJornal / Carlos Pereira É difícil de perceber esta situação… Por exemplo, um trabalhador português que esteja na Suíça, para pagar o que um colega meu paga de IRS tem que ganhar 200.000 francos suíços e não 50.000 francos suíços, por isso falamos sempre na subtributação. Outro exemplo, no meu caso pessoal, eu pago o IRS em Portugal, se estivesse em França pagaria de IRS 3.500 euros, eu estou a pagar 18.000 euros de IRS em Portugal! E mais, como nós estamos no estrangeiro, não conseguimos deduzir do IRS o que queremos, não é porque se vai a Portugal um mês, que se tira faturas, que se vai buscar os benefícios. Por exemplo eu tive uma filha com problemas de saúde, quando colocava a diferença entre o que me custava e o que me era reembolsado, a minha declaração de IRS era sempre controlada, porque não percebiam porque eu gastava tanto com saúde. Tenho uma colega do Brasil, quando passou a data fatídica dos 60 anos, os seguros aumentaram a taxa. Porque pagava 1.100 reais de seguro privado, depois dos 60, passou para 1.800 e no ano seguinte passou para 2.500 reais e isto sem nenhuma comparticipação do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Ora, o Ministério está a participar nos seguros dos diplomatas que ganham 10 ou 15 vezes o que ganha um administrativo ou um técnico, e não está a comparticipar quem está nestas condições. Essa é a grande diferença do tratamento que põem em cima da mesa? A composição do nosso salário, não é como a composição do salário dos diplomatas. Eles têm a remuneração de Portugal, depois têm o abono de habitação, têm o abono de representação, têm uma série de abonos, mas os Diplomatas mesmo quando estão no estrangeiro só pagam o IRS sobre a remuneração de Portugal. Tudo o que recebem a título de abonos no estrangeiro, não pagam o IRS. Ora eu não quero que eles paguem o IRS sobre a totalidade. Em Portugal tem-se uma taxa de retenção de IRS Portugal continental. Mas e a Madeira? Por facto da insularidade, têm uma bonificação de 15%, portanto têm tabelas acrescidas de 15%. O que nós dizemos ao Ministério e às Finanças, é que nós somos outras ilhas, só que nós os 15% não nos resolve o problema. Portanto já apresentámos várias propostas, uma delas por exemplo é termos um serviço central a tratar das nossas declarações IRS, porque temos que ir a sítios diferentes, e cada repartição não percebe a nossa situação. Há cerca de 400 trabalhadores nesta situação, porque aqueles que optaram pela função pública em 2000, são aqueles funcionários mais antigos e que se vão reformando. Mas a tendência agora é para a contratação local, certo? Não é por contratação local, aqui há uma subtileza. Agora, na Adminsistração pública é o regime de trabalho em contrato de funções públicas. E isso representa que já não há o quadro de vinculação que eram aqueles que tinham feito a opção pela função pública e o de contratação, que eram os estrangeiros ou os Portugueses que tinham feito opção pela contratação local, somos todos trabalhadores em regime de contrato de funções públicas, só que o estatuto diz que têm de ser respeitadas as normas imperativas de ordem pública local. Por exemplo, em França, que é o caso que conheço melhor, são 35 horas de trabalho semanais. Há uma lei, que não estabelece a carga horária por ramos de atividade, mas é de 35 horas. E nós dizemos que os trabalhadores em França não podem trabalhar mais de 35 horas. Quando este salto de trabalhadores passou para 40 ou para 44 horas, nós dizemos e temos uma ação em tribunal, que não estão respeitadas as normas imperativas de direito local. Então é possível que um funcionário no Brasil trabalhe 40 horas e outro em França só trabalhe 35 horas? Sim, em França o regime de contrato diz só 35 horas. No Brasil é ainda mais complicado, têm uma Constituição que diz que não se pode desrespeitar os acordos de trabalho. Muitos deles tinham um horário de trabalho de 30 horas. Eram práticas locais, começam de manhã cedo e às 3 horas da tarde vão para casa, porque têm outra organização de vida. Em Kinshasa tínhamos colegas que começavam às 7 horas da manhã e à uma hora da tarde tinham o trabalho acabado e iam para casa, porque também a partir dessa hora já não havia transportes públicos. O que o Brasil diz é que não pode haver mudança de condições de trabalho sem ter o acordo do trabalhador, a menos que esteja estabelecido em acordo. O Ministério ignora isto, depois espanta-se de ter os trabalhadores a reclamar e a dizer que não estão a ser pagos como deviam. O Brasil obriga cada trabalhador a ter uma carteira profissional. Todos os anos têm que registar o salário e as autoridades não compreendem como é que um salário pode baixar, porque eles têm mecanismos de atualização financeira que são uma salvaguarda. Alguns colegas vão para tribunal porque tinham na carteira de trabalho 7.000 reais e no ano seguinte receberam 5.600. Isto não é possível pela legislação brasileira. Há alguma específicidade no vosso trabalho que vos diferencie dos funcionários públicos em Portugal? Temos de reconhecer que o trabalho consular e o trabalho de uma missão diplomática não é a mesma coisa que estar na Administração pública em Portugal. Em Portugal há uma Junta de freguesia ou uma Repartição de finanças quase em cada esquina. No estrangeiro, a rede consular diminuiu, e os trabalhadores têm que ter outro envolvimento em relação às Comunidades. Não se está a atender no estrangeiro como se atende aqui. Temos que aceitar que é uma tarefa específica que pode ter regras específicas. Existe algum estudo que diga quantos trabalhadores precisavam a mais no estrangeiro? Sim, o estudo repõe os funcionários, eu não digo ao nível de há 30 anos, quando havia 2.800 trabalhadores, mas 1.300 ou 1.400 é incomportável quando se tem uma rede destas, com os fluxos migratórios que se têm observado. Mas agora com a internet faz-se muitas coisas… Eu adoro as novas tecnologias. Acho que elas estão ao nosso serviço, mas por aquilo que eu conheço, o dia em que se tratar do Cartão de cidadão pela internet, então conversamos. A questão vai muito mais longe que o Cartão do cidadão. As pessoas no estrangeiro têm imensos problemas em termos de registo civil, porque são casados, porque casaram com nacionais nos países onde estão, porque os casamentos não estão registados no Consulado, porque têm filhos mas não registaram os filhos, não confirmaram o divórcio, etc. Nós não precisávamos de ir buscar a ficha em papel, se a ficha informatizada fosse completa. Há uma coisa que está a ser implementada e que acho excecional: eu vivi na área de Versailles e tinha a inscrição consular em Versailles, depois estive em Paris, já era em Paris, fui uma vez à Suíça, só tinha o Bilhete de identidade e a Suíça não me deixou passar só com o Bilhete de identidade, fui a Lyon fazer o Passaporte, do tempo em que se podia fazer e receber na hora, tinha uma inscrição consular em Lyon. Quer dizer que se contarmos as inscrições consulares hoje em dia, não se sabe quantos Portugueses há. Ter uma base de dados centralizada é excelente. E cada posto deve ter a sua particularidade, não é? A experiência que tive em Nantes foi espetacular. Eu ia com muita experiência de Paris, mas estava enganada numa coisa: Paris tem muitos Portugueses e muitas associações, muito importantes e em Nantes era mais isolado, os Portugueses faziam muitos quilómetros para se deslocar ao posto. Tive pessoas que durante 30 ou 40 anos nunca trataram nada de registo civil. Apercebi-me ali que tinha de se fazer outro tipo de atendimento. E como a rede consular diminuiu… Isso choca-me enquanto trabalhadora e sindicalista. Antigamente havia uma rede consular de 17 postos em França, os postos estavam mais perto, hoje em dia não têm essa rede, há os Consulados honorários que têm o seu mérito, mas nos países de emigração não faz sentido. Os funcionários começam a entrar no sistema. Ou tratam de assuntos em 15 ou 30 minutos, ou então as pessoas são despachadas. As pessoas deixaram de ter acesso aos serviços como no passado. Antes podia-se entrar no Consulado e ser transversal e estar a falar com um colega que podia tratar do problema do seu Passaporte, podia ao mesmo tempo tratar de uma Procuração ou de um Registo de nascimento e hoje já não é possível. Está-se a perder uma certa humanidade no tratamento porque se está a tentar compensar as lacunas dos recursos humanos com estes sistemas. Em França quantos funcionários seriam precisos a mais? O dobro! Quando comecei em Paris em 1977, havia 52 trabalhadores, no Consulado de Paris aquando da restruturação consular em 2008, havia 96 trabalhadores, neste momento são 60. Mas as estruturas são más, porque faltam trabalhadores para o atendimento. O Secretário de Estado nomeou um Cônsul Adjunto para Paris, foram outros Técnicos, mas não resolve o problema. Quantos trabalhadores tem no atendimento? Quantos balcões estão vazios em Paris? Como é que se explica que em Paris façam nomeações de chefias e não nomeações de funcionários? Dizem que a chefia vem dar despacho. O melhor despacho é dado pelo funcionário e depois depende da maneira como se encara isso. Eu identifico-me numa base de dados como Rosa Maria, eu pratico aquele ato, faço um registo de nascimento, eu preciso de alguém que venha certificar que eu fiz bem o registo? Portanto estamos com uma tecnologia do século XXI e com uma prática do século XIX. Este sistema funciona se nós responsabilizarmos as pessoas. Acho que a pessoa tem de ter a responsabilidade do príncipio até ao fim. Se se enganar, enganou-se mas estava a trabalhar, não é um problema enganar-se. Se enganar numa percentagem que digamos exagerada, aí ou o colega não teve a devida formação ou então não é adequado ao posto de trabalho. Quem faz as procurações no Consulado em Paris, são os funcionários e depois vai a assinatura de outra pessoa que está ali a ler… Sobre os Consulados honorários, onde está o problema? É um problema em termos de subordinação. O funcionário que está em Tours, não é subordinado ao Cônsul honorário de Tours, mas sim ao de Paris. Como é o caso de Nantes. Aliás, a maior parte dos Consulados honorários fora de França não têm trabalhadores no quadro, têm trabalhadores escolhidos pelo Cônsul honorário. O que me parece é que muitas vezes as pessoas pensam que um Consulado honorário vai resolver o problema, mas não resolve. Resolve o problema é quando têm, como em Nantes, os trabalhadores que têm a assinatura e podem assinar procurações, fazem os registos de nascimento. Em Tours e em Orléans podem funcionar sem Cônsul honorário porque Paris pediu e os trabalhores têm poder de assinatura. Esta descentralização é então interessante? Sim, e acho que até deveria haver mais descentralização, mas não com Consulados honorários. Mas os Consules honorários não são um problema… Não, mas têm consequências financeiras. Estão a receber um subsídio. Para mim, deviam existir os escritórios consulares ou agências consulares. O que existe hoje e que para mim é uma fraude, é que em Nantes, em Tours e em Orléans os utentes estão a pagar 15% a mais nos emolumentos, porque funcionam como Presenças consulares. E não acho que isso seja normal. Muitas vezes as pessoas fazem reclamações porque vão a Paris têm um preço, e vão a Nantes, a Tours ou a Orléans e pagam outro preço. E a criação das Permanências consulares, acha que é uma boa estratégia? Eu fui daquelas que fiz Permanências em Nantes antes de elas existirem. Só que eu as fazia aos fins de semana e isto não é conversa para muita gente… Tenho a impressão que se comunica menos sobre as Permanências… Há menos. Por um lado as pessoas estão mais bem informadas, hoje sabem melhor o que podem fazer fisicamente e aquilo que podem fazer de outra forma. Para pedir uma Certidão, não preciso de ir ao Consulado, posso pedir por correio. Mas vou precisar sempre de me deslocar para um Cartão do cidadão, para a impressão digital e para assinar. As Presenças consulares são muito importantes para a Comunidade. Havia Permanências em Nantes, Roubaix e Tourcoing, mas concluíram que não era a melhor forma, e tiveram de pôr funcionários em Nantes e em Lille… De facto corrigiu-se. Acho que foi um erro enorme o encerramento dos postos como em Clermont Ferrand, Nantes ou Lille. Eram realidades regionais muito próprias, com muitas valências que hoje não temos. Ninguém me diga que se faz em Nantes hoje o que se fazia há 4 anos atrás. A projeção de Portugal não tem nada a ver. Para mim, sindicalmente, foi chocante ver os dois colegas de Nantes irem trabalhar para Angola. De repente, eles foram, não são diplomatas e não ganham o que ganham os diplomatas para andarem de um lado para o outro. E de um dia para o outro, com 3 filhos, o casal teve que deixar tudo e tiveram sorte que iam para a mesma cidade e acho incrível nós termos conseguido recuperar estes trabalhadores para Paris e depois colocá-los novamente em Nantes. As pessoas não são números, são famílias, têm vida. Mas agora, os utentes não têm de pagar 15% a mais pelos serviços em Nantes. Não faz sentido. As Presenças consulares dão dinheiro. Porque é o ritmo de trabalho necessariamente superior, porque se está investido, e não se tem de tratar do processo do princípio ao fim como se faz num posto. Portanto consegue-se levar para o posto muito mais trabalho e os utentes ficam satisfeitos com o sentimento de terem sido atendidos, mas a mim choca-me a questão dos 15%. LusoJornal / Carlos Pereira Em França, que tipo de trabalhadores precários temos? No nosso setor temos trabalhadores que estão a ser pagos diretamente pelo orçamento de funcionamento do posto (OFP). Quem são? No Consulado em Paris são, por exemplo, os trabalhadores que fazem a limpeza do Consulado. Temos trabalhadores na Embaixada que fazem a limpeza, que são do quadro e temos 70 trabalhadores no mundo assim pagos pela verba. Em França as coisas estão mais ou menos corrigidas e normais, mas temos 4 trabalhadores nestas condições no Consulado em Paris. A empregada da residência do Chefe de posto, e três pessoas a fazer a limpeza do Consulado, dois pagos pelo OFP e outro pago por contrato de prestação de serviço em que é ele que tem de pagar a sua segurança social, o que não é normal. Os seguranças e os operadores do Call center também são pagos por empresas exteriores. Vocês consideram-nos precários? São prestações de serviço. No Call center em Paris não são precários porque é um concurso público que tem uma validade e que tem condições específicas. O contrato do Call center é como um contrato de empresa que põe ali um número de trabalhadores, mas não são precários. Esses não entram nos que identificámos. Depois temos trabalhadores precários, por exemplo em Xangai, dois trabalhadores precários que tratam dos famosos Vistos gold. Estão lá ao acordo do protocolo que houve entre o Ministério das Finanças e o Ministério dos Negócios Estrangeiros, são dois precários. Mas a situação do precário no nosso setor, em França, não tem a ver com o salário, tem a ver com o estatuto: de um dia para o outro podem mandá-los para casa. Depois está-se a transportar para o trabalhador a responsabilidade de estar inscrito na segurança social ou não. Era como se o Estado lavasse as mãos em relação a isto. Nós entendemos que tem que haver outra postura. Temos trabalhadores no nosso setor que não têm segurança social, que não têm direito a reforma. Temos um trabalhador de 70 anos que se reformou no ano passado em Díli e que ficou sem nada. Não se conseguiu resolver o problema antes que o senhor chegasse aos 70 anos. Fizemos um pedido quase como se fosse um caso humanitário, ora não é um caso humanitário dar uma reforma a alguém que trabalhou 40 anos para o Estado Português! Na Europa não há casos destes? Não, não há. Mas temos um caso na Bélgica um pouco diferente: houve um concurso no qual foi selecionada uma trabalhadora da Administração pública portuguesa e que entende que, como está a trabalhar para o Estado, porque é um serviço periférico externo, é um serviço do Estado no estrangeiro, devia continuar a descontar para a Caixa Geral de Aposentações. Ora o estatuto não permite isto porque diz que ela deve descontar para a segurança social local. No nosso setor, neste momento, temos 260 trabalhadores sem proteção social. Quase um quarto dos trabalhadores e entendemos que o Estado deve-se obrigar a cumprir o mínimo em relação a eles. Uma trabalhadora que foi de Moçambique para a África do Sul, onde tinha segurança social antes e deixou de ter. Está sem segurança social há 2 anos. São problemas que ainda não estão resolvidos. E o problema dos funcionários do Instituto Camões, está resolvido? Nada resolvido. Continuam a não estar no quadro, continuam a não ter estatuto, continuam a considerar que têm um estatuto de direito privado. É algo que não percebo, nós já pedimos reuniões com a hierarquia do Instituto Camões, nunca fomos ouvidos. Pedimos que nos facultassem as tabelas salariais dos trabalhadores do Camões, ainda estou à espera delas. A AICEP respondeu que estão disponíveis para fazermos uma reunião conjunta para abordar este assunto. Os trabalhadores da AICEP no estrangeiro estão no mesmo caso? Enquanto nós estamos sem aumentos salariais desde há 9 anos, na AICEP há trabalhadores que estão sem aumentos há 14 anos! O Estado tem responsabilidades nestas matérias, não pode lavar as mãos e deixar isto assim. E depois o que é chocante, é não garantir a proteção na doença e na reforma a quem trabalhou para o Estado. Quando toda a gente é vista como sendo privilegiado por trabalhar para o Estado. Ora a realidade no nosso setor não é essa. E por isso sabemos que as situações são diferentes, não vamos comparar a Índia e a França, a Suíça e a Argentina, mas devia haver um tronco comum. O Estado não pode abdicar desses deveres e obrigações.