José Barroca Agostinho: de soldado do CEP a ferreiro em Silvares

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José Barroca Agostinho foi soldado do Corpo Expedicionário Português (CEP) e participou na I Guerra mundial, era o soldado José Barroca Ferrador, mas também foi o Mestre da oficina-forja de Silvares.

Eis alguns dados da folha de matrícula arquivada no Arquivo Geral do Exército em Chelas-Lisboa:

José Barroca Agostinho foi alistado pelo Exército em 16 de julho de 1914 e apresentado ao serviço em 14 de janeiro de 1915, na classe de soldado-ferrador em 10 de abril e pronto da instrução de recruta em 24 de maio, após o que foi domiciliar-se na paróquia de Silvares, do concelho do Fundão.

Presente no serviço em 16 de setembro, em Tancos, passou pelo Regimento de Cavalaria nº2, em 22 de dezembro de 1916, e integrou o Corpo Expedicionário Português (CEP), embarcando para França a 20 de janeiro de 1917, a partir desta data com aumento em 100% do tempo de serviço. Foi colocado no Esquadrão de Ferradores em 24 de janeiro de 1918 e no Batalhão de Infantaria nº20 como soldado-ferrador em 18 de julho. Desembarcou de regresso de França por via terrestre em 6 de setembro de 1918. Estava pois em França no dia 9 de abril, no decurso da Batalha de La Lys.

Promovido a 1º Cabo-Ferrador em 18 de fevereiro de 1919 e licenciado em 15 de setembro, foi domiciliar-se na paróquia de Silvares.

Ausente de licença em França desde 27 de abril de 1930, após pedido de passaporte nos Serviços de Emigração de Lisboa em 14 de novembro de 1929 e autorizado pela Chefia militar-Governo Militar de Lisboa e III Região Militar de Tomar.

Após as suas estadias em França, foi detentor de uma grande Oficina-forja em Silvares, aldeia muito populosa, com a qual assegurou o ferrar de numerosos cavalos e juntas de bois dos seus proprietários. Em Silvares – e nas aldeias dos arredores, num raio de uma dezena de quilómetros – visitava os seus clientes montado, alta madrugada, no seu cavalo.

Foi casado com Hermínia Monteiro e pai de quatro filhos, três dos quais emigrantes na Venezuela.

Nasceu em 18 de agosto de 1894 e faleceu em Lisboa no dia 4 de novembro de 1979.

 

Anos 50/60 Oficina a forja em Silvares e o martelo grande

A Oficina-forja de José Barroca, de ampla dimensão, piso térreo com paredes de pedra na base e tábuas de madeira para o telhado, ficava na estrada principal de Silvares, em frente do grande edifício de tipo solar de uma das famílias de professores primários, com Dona Salette e a filha Dona Irene, esta, professora do neto que seguiria para o ensino liceal, e a 100 metros da sua residência

Graças aos rendimentos da oficina, com iluminação elétrica em casa – e com uma mulher de ajuda à esposa em casa, nas lides da residência e no abastecimento de água a partir do chafariz no adro da igreja, a Ti Catrina – a par do trabalho na forja, José Barroca mantinha diversas parcelas agrícolas nas proximidades da aldeia, uma das quais próxima da aldeia do Barco, na margem direita do Zêzere, na Várzea Longa. Surgidos os motores de rega, cedo comprou um para a sua propriedade, em Vale de Encostas, a descer para o Vale Grande, a poente da aldeia.

 

O Martelo grande e pesado (fotografias), foi utilizado durante décadas, no século XX, na Forja, em Silvares, dos anos 50 até aos anos 70, na transformação de barras de ferro e chapas metálicas para fazer ferraduras, canelos e pregos para os animais de tração, fundamentais nas lides agrícolas e transporte de produtos, além dos obtidos no comércio local, vindos do Fundão, engenhos de rega ou noras, e utensílios de uso doméstico. O Martelo foi doado à Casa Museu Ilda Valentim Mesquita, em Silvares.

Era manuseado por um auxiliar – que o aplicava segurando o cabo com as duas mãos, do lado oposto ao do mestre, este com um martelo mais leve e em batidas alternadas com um braço enquanto o outro segurava a barra de ferro com uma tenaz – na transformação de barras de ferro incandescente; barras vindas em brasa das chamas do carvão avivadas pelo sopro do fole e batidas numa bigorna sobre um pesado tronco de árvore grossa no piso da oficina. Uma tina de pedra com água ao lado, servia para temperar as peças metálicas acabadas de transformar.

Nas três Forjas existentes – depois reduzidas a duas – com quatro dezenas de juntas de bois na povoação, segundo Abílio Laceiras, residente em Paris e uma memória viva de Silvares; na oficina forja de José Barroca, era assistida grande parte dos animais de tração, cavalos, mulas e juntas de bois da aldeia de Silvares e povoações vizinhas; com idas do Ferrador, saído de madrugada de relógio no colete, a cavalo, sob as estrelas da manhã, para aldeias vizinhas num raio de uma dezena de quilómetros, onde eram ali ferrados os animais pertença dos locais.

Na oficina, numa sólida armação em forma de gaiola, em troncos de madeira polidos pelo uso, eram mantidos os animais das juntas de bois a ferrar, designada por “Tronco”.

A par desta utilização, eram ali executadas transformações das barras de ferro e folhas em lata ou folha de Flandres para usos múltiplos, nomeadamente vigas lineares de ferro transformadas em círculos duplos ligados por barras soldadas nas mesmas a serviram de engenhos de captação de água para rega de terrenos de cultivo, uma vez dotados de baldes cúbicos em chapa metálica ali construídos; dois círculos paralelos com travessões soldados, com baldes acoplados, ligados por um eixo longo a um mecanismo de rodas dentadas, do qual se erguia um eixo vertical feito rodar por um cavalo em redor do mesmo-a “Pontaria” ou “Nora” (fotografia) disseminadas pelas propriedades da zona.

Os trabalhos em ferro e chapas metálicas, com recurso a soldadura, permitiam soldar peças metálicas e fabricar, entre outros artefactos domésticos, fogões metálicos para lenha ou carvão.

E para lá do médico da aldeia, ali se processavam alguns tratamentos de residentes com problemas de saúde, tratados com barras aquecidas sobre produto colocado na pele, ou a operações castradoras de suínos da região.

 

Lisboa, 14 de julho de 2021

José F. Barroca Monteiro