Língua Portuguesa na Diáspora (anos 1990)… Em nome daqueles que nunca têm a palavra

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Se a língua portuguesa (no estrangeiro) não fosse e não for língua de emigrante -como muitos não suportam ouvir – (Camões, Padre António Vieira, L.A.Verney, Fernando Pessoa, Ferreira de Castro, Luandino Vieira, Eduardo Lourenço, Lobo Antunes, Isabel Barreno e todos os anónimos, que por aqui andamos – todos emigrantes) de quem seria?

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A Problemática atual da valorização da língua portuguesa é mais uma tentativa de segregação do emigrante ou uma tentativa de dignificação? (Várias reações de pais de alunos serviram de argumento e de pertinência a todas as questões que se seguem – quem se sentir, porventura, atingido deverá replicar sem paliativos e utilizar as mesmas bases s.f.f.)

– Será mais importante que a língua se designe «língua de (e)imigrante», valha e sirva os seus, ou língua de comunicação internacional e seja menosprezada como é, neste país (e não só…)?

– Será mais importante procurar “vender” a imagem “de prestígio idealizado por nós” de uma língua aos que a desconhecem (para que a conheçam e reconheçam), ou procurar com que, os que já a herdaram e a falam, a não percam?

– Será que o primeiro investimento renderá mais que o segundo?

– A que preço?

– Conquistar-se-ão maior número de estrangeiros ou perder-se-ão maior número de lusofalantes?

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Façamos uma análise demonstrativa referindo-nos ao ensino do português em França: Desde há mais de vinte anos (1977) que foi dada a oportunidade a todos os alunos, de optarem (opção pouco facilitada pela administração) nas escolas, colégios e liceus pela Língua portuguesa. No nosso imaginário, os outros dar-lhe-iam o mesmo prestígio que nós lhe damos, mas… fazendo contas, quantos alunos franceses em plena liberdade de opção a escolheram? Por isso, de que maneira convencer esse público a considerar o nosso idioma de língua de prestígio mundial se ele não o entende assim? Deixando o emigrante de parte?

Como é público, a Constituição da República Portuguesa, nos art.74, alínea h e art.78 alínea d, consagra a todo o cidadão Lusíada, espalhado pelo Mundo, igualdade de tratamento quer em termos de acesso à cultura e língua portuguesas, quer em termos de instrução dos lusodescendentes. Além disso, preconiza assegurar, defender e promover relações (inter)culturais com todos os países estrangeiros.

Em França, país de três valores axiológicos fundamentais – ‘liberté’, ‘égalité’, ‘fraternité’ – os critérios de instrução e de acesso à língua e cultura portuguesas não podem seguir os princípios da nossa Constituição. Porquê? Quais são as causas? Falta de proficiência diplomática? Falta de “lobbys”? Falta de peso político? Será só a dispersão de alunos e as transmutações demográficas operadas nos últimos anos  que originaram a queda livre “do tal prestígio” da nossa língua?

Ou será que há preconceitos em assumir o rótulo “emigrante”, esquecendo-nos de que, historicamente, o povo português viveu sempre, mais de um terço, fora do território nacional?

– Não estaremos nós a criar uma imagem fantasmática do que queríamos que os outros pensassem de nós?

– Enquanto houver emigrantes, a nossa Língua também não poderá deixar de ser língua deles, ou como diz o senso comum, tornar-se-ão apátridas se alguém lhes roubar a Pátria (a sua língua).

A experiência mostra-nos que todos os esforços tentados para valorizarmos o nosso Idioma no sistema escolar francês, como “português Língua estrangeira” foram infrutíferos devido a uma política ultra-protecionista e irreversível em favor do Inglês. Por que se insiste então em rebater na mesma tecla consumindo verbas arbitrárias nesse sentido quando o Estado “interessado” (se é que o é?), a França é mero observador? Quantos franceses ousaram abordar e conhecer a língua de Camões ou do Imigrante anónimo? Terão razão? Talvez. Mas se a nossa Língua é  língua de prestígio, por favor, deixem que eles o provem. E se isso não acontecer, que os lusofalantes tenham, pelo menos, a liberdade de o fazer, aprendendo-a, falando-a sem complexos. Quer seja na Escola, em Colégio ou Liceu como LV1 ou LV2, ao português vestiram-lhe sempre uma “capa” de língua de pobre (imigrante) e como tal, sem prestígio, o que leva os próprios lusodescendentes a pôr a “capa” de lado como que a rejeitar a imagem (de estigma) reenviada do meio Institucional.

Não obstante, como querem seguir no mesmo comboio da cibernética e do mundo moderno, acompanham os outros no Inglês, no Alemão ou no Espanhol como toda a gente (para não ficarem no gueto).

Se ao menos, lhe dessem a possibilidade de escolher o seu idioma em LV2 (em 4ème), já não seria nada mau, mas nem isso…

Em contrapartida, a segunda geração procura vestir “a capa” como estratégia de sobrevivência a uma identidade cultural, afetiva e sócio-linguística nas associações ou em cursos privados organizados, ou ainda por correspondência, através do Cned (por isso se compreende que apesar de ridículos, os exames ad-hoc tivessem uma função de regulação simbólica para a qual e os quais ainda não se criaram alternativas convincentes).

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Não seria uma boa coisa discutir-se nas próximas reuniões mistas a implantação do Português como disciplina lcp (do leque das opções) obrigatoriamente integrada e aberta a todos, servindo de experiência pioneira ao que J. Berque tinha chamado “initiation aux cultures du Monde”?

Por que não um ensino com vertente linguística em português (como abordagem comunicativa-pragmática) e uma vertente cultural em francês no horário curricular (até ao nono ano – 3ème) dando assim livre curso à escolha de cada um? Não seria uma forma de possibilitar aos lusodescendentes a continuação daquilo que começaram na escola elementar?

Por que não até, convidar as autoridades francesas e as de Bruxelas a criar um Programa específico nesta base de ideias para todas as línguas europeias na perspetiva de urdir em empatia uma verdadeira União Europeia para a Educação? (Oiçam senhores eurocratas!)

Já que há verbas para mandar arrancar vinhas e olivais, porque não reivindicar a Bruxelas que pague por inteiro os professores de um país do espaço Schengen em funções num outro (desse mesmo espaço) servindo os seus compatriotas na diáspora?

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Conclusão

O reconhecer e o aceitar que os imigrantes e os seus descendentes falem e estudem a sua língua materna, reveste-se de uma extrema impôrtancia para o equilíbrio da família, dos valores familiares e da identidade cultural que congrega referências comuns.

Com efeito, para que este equilíbrio seja mantido, é condição indispensável que os pais imigrados se sintam completamente aceites tal como são. É absolutamente necessário que o País de acolhimento os não obrigue a uma mudança radical de atitudes, lhes permita conservar o seu modo de vida, o seu temperamento e a sua língua.

Se este equilíbrio não for preservado, se os pais se sentirem rejeitados, envergonhados das suas origens e pouco seguros de si, não será possível que os seus descendentes possam vir a afrontar serena e felizmente o mundo exterior e a escola em particular.

A confiança que as crianças têm nelas próprias, forjada pela interiorização de valores e pela modelagem multireferencial da família em pleno exercício de socialização, desapareceria e as suas capacidades seriam gravemente diminuídas. Por isso urge, que neste país (França) se reconheça aos pais imigrantes o direito (que lhes assiste) de falar livremente a sua própria língua no seio da família, o de reivindicar que essa mesma língua e civilização possam ser ensinadas em contexto escolar como disciplinas curriculares (e como contribuintes que são, ao mesmo título que os naturais do país, deveriam até, com a ajuda dos seus diplomatas exigi-lo, já que outras línguas que não a sua, lhes são impostas).

Só deste modo, se poderiam reunir condições para uma real valorização da sua cultura que contribuiria significativamente para enriquecer a do país de acolhimento ou ainda favorecer, pelo mesmo percurso, a sua própria integração no “meltingpot” que comporta toda a nação moderna, quer em termos linguísticos, quer em termos socioeconómicos. É também urgente que nas escolas deste País se reconheça aos descendentes de imigrantes o direito de serem diferentes nas referências de origem, sem ter que renunciar às raízes; lhes seja outorgado o direito à igualdade de tratamento e de oportunidade (sem segregação) para que, eles também, sintam o dever de nesse mesmo mosaico, contribuírem para edificarem (juntos) um mundo melhor onde todos viessem a ser felizes.

Hélder Alvar

Prof. Doutor em Ciências da Educação

Mestre em Relações Interculturais

Docente de Português em Missão Oficial



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