Marcel Pagnol foi Cônsul de Portugal no Mónaco de 1949 a 1955


Em abril de 2024, a Provence e a Côte d’Azur recordaram o 50° aniversário da morte de Marcel Pagnol. Por essa ocasião, foi revelado um elemento desconhecido da vida pública do escritor-cineasta: a sua pertença ao Corpo Consular do Mónaco. Com efeito, em 1948, Marcel Pagnol foi nomeado Cônsul de Portugal no Principado pelo Presidente da República Portuguesa da altura, Óscar Carmona.

A imprensa da época não elogiou a nomeação e talvez este seja um dos motivos do desconhecimento desta faceta da vida do Académico. Na família de Marcel Pagnol, esta nomeação de Cônsul permaneceu um mistério: “Na placa da sua casa monegasca onde estava domiciliado o Consulado de Portugal, estava indicado: ‘Para qualquer pedido consular dirija-se ao Consulado de Nice’”.

Uma pesquisa permite obter uma cronologia desta função consular. É o livro de Raymond Castans, intitulado “Pagnol et Monaco”, que dá as primeiras pistas.

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Em 1948, Marcel Pagnol já havia sido nomeado para a Académie Française. Uma receção foi dada em sua homenagem pelo Embaixador de França em Lisboa, na presença do Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, José Caeiro da Mata. Na discussão informal e divertida, soube-se que o Mónaco não tinha Cônsul português.

“E por que não você, Mestre?” pergunta o Ministro. “Seria uma honra para nós. Não é uma tarefa muito absorvente: não o ocuparia mais de cinco minutos por trimestre”.

“E eu teria a placa de Portugal por cima da minha porta?” ri o cineasta. “Perfeitamente, sorriu o Ministro e poderá ter as letras C.C. na matrícula do seu carro. Apenas é necessário que o Governo do Mónaco esteja de acordo”.

“Quando recebeu os selos oficiais, rapidamente os perdeu”, conta Raymond Castans. “Não posso correr o risco, um dia, de carimbar o visto de um sujeito que vai assassinar Salazar!”

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Em 30 de dezembro de 1948, a Comissão Consular declarou que Sua Excelência o Presidente da República Portuguesa havia nomeado o Sr. Marcel Pagnol, Cônsul de Portugal no Mónaco.

O Governo do Mónaco não tinha ainda dado o seu acordo e já Marcel Pagnol utilizava os selos oficiais, escrevendo em 4 de janeiro de 1949 ao Cônsul-Geral em Marseille. Na altura, a sua morada era 2 boulevard d’Italie, em Monte-Carlo.

Foi em 20 de maio de 1949 que o Príncipe Rainier emitiu uma Portaria Soberana autorizando o Cônsul de Portugal a exercer as suas funções no Mónaco. “O Sr. Marcel Pagnol está autorizado a exercer as funções de Cônsul de Portugal no Mónaco e ordena-se que as autoridades administrativas e judiciais do Principado são obrigadas a reconhecer-lhe esta qualidade. O nosso Secretário de Estado, o nosso Diretor dos Serviços Judiciais e o nosso Ministro de Estado são responsáveis pela promulgação e execução desta Portaria” lê-se no Journal du Monaco de 30 de maio de 1949.

Primeiro “Cônsul de Portugal” nos anuários oficiais do Principado, de 1950 a 1952, Marcel Pagnol aparece depois como “Cônsul Honorário” nos anuários de 1953 a 1955. A morada já era 12 boulevard des Moulins, em Monte-Carlo.

Em 1952, José A. dos Santos escreveu um livro para as Editions de Monaco, na série Escales du monde, intitulado “Le Portugal”, e foi Marcel Pagnol quem escreveu a introdução da obra.

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Nos anos de 1949 e 1950 surgiram reportagens trocistas na imprensa francesa e monegasca. O jornal “Le Combat” escreve que “porque quer dedicar-se ao exercício do seu cargo de Cônsul de Portugal no Estado do Mónaco, o Sr. Marcel Pagnol junta-se à triste corja dos fracassados, dos amargurados, dos invejosos,…”

O jornal “La Bourgogne Republicane” escreve que “o Principado do Mónaco não poderia, efetivamente, passar sem um Cônsul de Portugal. E Portugal não poderia estar melhor representado no tabuleiro diplomático que por um antigo ‘pião’. Que este antigo pião se tenha tornado um autor de sucesso, um académico pedinte, mas que grande negócio!”

O jornal “Ce Soir” escreve “Quanto ao Cônsul de Portugal no Mónaco, chama-se Marcel Pagnol, o que prova que os portugueses são sempre alegres, mesmo quando não são bem portugueses, e que a Academia Francesa leva a tudo. Mas, ah, maravilha, o autor de Topaze, Cônsul do Jesuíta Salazar no cassino de Monte-Carlo, que tema para uma comédia!”

O jornal “Paris-Presse, L’intransigeant” questionou se “Marcel Pagnol mandou fazer um traje diplomático para se misturar com o mundo oficial que cercava o Príncipe Rainier”. Marcel Pagnol apresentava-se com o traje da Académie Française e um convidado das receções monegascas chegou a perguntar-lhe qual era a sua patente militar.

Com risos debaixo de capa, ou não, um acerto de contas entre pessoas que não gostavam da crítica, a crítica dos críticos? É assim possível compreender que este período da vida de Marcel Pagnol é pouco conhecido, salvo se encontramos documentos nos arquivos em França e em Portugal, relativos à sua função consular.

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Posteriormente Marcel Pagnol regressou a Paris para tristes eventos privados. Paul-Louis Colozier foi então nomeado Cônsul Honorário de Portugal no Mónaco pelo Presidente da República Portuguesa. A Portaria do Príncipe Rainier data de 26 de março de 1956 e a morada era Park Palace, avenue de la Costa, em Monte-Carlo.

LusoJornal