Home Comunidade O poeta das trincheiras “Pai Andrade”: Joaquim dos Santos AndradeAntónio Marrucho·25 Novembro, 2024Comunidade Muito se tem dito, muito se tem escrito estes últimos tempos sobre a participação portuguesa na Grande Guerra, outros escreveram no momento – antes de partir, durante a guerra, nas trincheiras – e um dos exemplos sendo é Joaquim dos Santos Andrade, apelidado, mais conhecido, nas suas terras, por «Pai Andrade». Joaquim dos Santos Andrade nasceu a 16 de novembro de 1892, em Murtais, na freguesia de Moncarapacho e faleceu a 2 de agosto de 1971, no Instituto dos Inválidos do Comércio, em Lisboa. Era filho do trabalhador agrícola, Manuel Andrade e de Maria da Cruz Viegas. Casou com Adélia de Jesus, da freguesia de Quelfes, quando ela tinha apenas 19 anos, a 9 de dezembro de 1916, estando Joaquim dos Santos Andrade já mobilizado aquando do casamento. Embarcou para França alguns meses depois do casamento, a 27 de julho de 1917. Joaquim dos Santos Andrade participou na Batalha de La Lys, a 9 de abril de 1918. Fazia parte do Regimento de Infanteria de Tavira, e era miliciano. Desapareceu naquele dia, tendo sido feito prisioneiro. Regressou a Portugal e desembarcou em Lisboa a 28 de janeiro de 1919. O casamento entre Joaquim e Adélia foi dissolvido, por falecimento desta, bem cedo, a 2 de junho de 1926. Pelos poemas que escreveu foi chamado de «O Poeta das Trincheiras», poemas nos quais se fala do viver, da experiência do que foi a I Guerra mundial, a sua guerra. Reproduzimos um dos seus poemas no qual este reflecte a vivência e as experiências da guerra. . Nas Trincheiras Mote Metido em mísera trincheira, Ouvindo o troar do canhão Vou responder à tua carta Querida esposa do coração. . Glosas Não sei quando há-de terminar Esta ausência tão custosa E venha a hora ditosa De te tornar a abraçar Só quando rebentar O eixo desta barreira, E desapareça a cegueira Desta luta – o tirano autor; Que me causa tanto horror, Metido nesta trincheira!… . Eu ouço zumbidos estranhos Atravessando a atmosfera; Eu vejo revolver-se a terra Com os morteiros tamanhos; Cercado de fogos medonhos Se vê o meu coração; Eu peço a Deus perdão E à Virgem Maria socorro A ver se ainda não morro Ouvindo troar o canhão!… . Mas sempre há uma esperança É nessa crença que eu vivo Porque não vejo nenhum motivo De morrer assim criança, A saudade é uma lança Que risca o espaço de prata Oh! Que vida tão ingrata Estou próximo da sepultura E vivendo na amargura Vou responder à tua carta!… . Escrevo-te com mil carinhos, Já que não pode ser mais, Dá saudades aos nossos pais E recebe ternos beijinhos Roga a Deus e aos anjinhos E ao Santo João Que me leve em salvação, P’ra minha terra natal Querida esposa do coração!… . In António Telo, «As Forças Armadas ou a República Decapitada» in História de Portugal. Dos tempos pré-históricos aos nossos dias, direção de João Medina, Volume XV, Ediclube, 2004, pp.61-70.