LusoJornal | António Borga

Opinião: O estrabismo económico de quem pensa que as Comunidades são vacas leiteiras


O novo Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, Emídio Sousa, já apresentou o seu “grande projeto”: organizar um Congresso mundial de empresários da diáspora.

Ainda não sabe onde vai ser feito, nem quando, mas isso são detalhes, o importante foi ter anunciado um “grande evento”, poucos meses depois de ter tomado posse nas novas funções que lhe foram atribuídas.

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Nas Comunidades, cada vez há mais pessoas a pedir a uniformização das metodologias de voto porque não faz sentido que numas eleições se vote de uma maneira e noutras de vote de outra maneira. A esses, numa entrevista ao LusoJornal, Emídio Sousa veio dizer que não se pode uniformizar as metodologias de voto, sem verdadeiramente explicar porquê, causando até algum desconforto nos Deputados do seu próprio Partido eleitos pela emigração. Carlos Gonçalves teve de vir a terreiro, também aqui, no LusoJornal, para explicar que vão ser apresentadas propostas de uniformização das metodologias de voto na Assembleia da República. Emídio Sousa devia ter lido, porque depois veio dizer que essa matéria não era da responsabilidade dele, mas sim do Parlamento. Mas, pelo menos, ficamos a saber o que pensa do voto dos emigrantes!

Nas Comunidades, cada vez há mais pessoas a defender a opção do voto eletrónico, mas Emídio Sousa veio dizer que é inseguro. Porque? Com que bases técnicas diz isso? Não o explicou ao LusoJornal, mas opõe-se! Criou certamente algum desconforto ao Ministro José Manuel Fernandes que andou por aqui a defender o voto eletrónico durante a campanha eleitoral, ao ponto de ter recuperado um Deputado que o PSD tinha perdido, e que permite, precisamente a Emídio Sousa sentar-se hoje na cadeira de Secretário de Estado. Vir a público desmentir o que tinha sido prometido em campanha eleitoral é uma coisa, mas nem ter lido o programa eleitoral do Governo – porque este assunto está no Programa eleitoral do Governo – é ainda mais grave.

Nas Comunidades cada vez são mais as vozes a defender o aumento do número de Deputados pelos círculos da emigração. Entrevistado pelo LusoJornal, Emídio Sousa respondeu que há outras prioridades em Portugal, nomeadamente o aumento de Deputados para as regiões de baixa densidade populacional. Deixou clara a importância que as Comunidades representam para o “nosso” Secretário de Estado.

Nas Comunidades, o Ensino da língua portuguesa é considerado “o” assunto mais urgente a tratar. Cada vez há mais Portugueses que não sabem falar português, Portugal ignora completamente o artigo 74° da Constituição e há muitos anos que o assunto tem vindo a agravar-se. Há milhares de pais que inscrevem os filhos nos cursos de português e nem resposta obtêm (nem negativa, nem positiva), são ignorados.

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Quando esperávamos, todos, o anúncio de um grande Congresso sobre o ensino da língua portuguesa junto das Comunidades portuguesas no mundo inteiro, ou então de um grupo de trabalho interdisciplinar para lançar, enfim, um plano estratégico do ensino da língua portuguesa, o Secretário de Estado apresentou então o seu primeiro grande projeto: quer que os emigrantes mandem mais dinheiro para Portugal e invistam mais no país.

Desde José Luís Carneiro que este tipo de Congressos foi organizado. O último, organizado por Paulo Cafôfo já praticamente não tinha empresários portugueses do estrangeiro, mas tinha 14 membros do Governo presentes e dezenas de diretores de institutos e outras coisas mais com nomes que não dizem nada a quem mora no estrangeiro. Ah, e também lá havia muitos empresários de Portugal, não apenas para encher a sala, mas também à espera de cumprimentar algum empresário das Comunidades com quem pudesse fazer negócio.

Na altura, Emídio Sousa estava ainda muito distante das Comunidades e não deve ter lido os relatórios (se relatórios houve) sobre estas “missas” que comunicavam mais para dentro do que para fora.

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Pelo menos estão claras as ideias de Emídio Sousa. As Comunidades vão continuar a ser olhadas como vacas leiteiras.

Nada nos move contra Emídio Sousa, pessoa afável, sorridente e certamente muito bom noutros assuntos. Mas já mostrou que desconhecia completamente as questões que preocupam as Comunidades. A culpa não é dele, é de quem o escolheu para esta missão, com a qual nem ele contava.

Quando vamos ter enfim um Secretário de Estado que conheça as Comunidades e que consiga falar connosco, olhos nos olhos, dos assuntos que nos preocupam?