LusoJornal | Mário Cantarinha

Balanço: Deputado Paulo Pisco sente-se “frustrado” porque tinha iniciativas parlamentares que ficaram por aprovar


No seguimento da marcação de novas eleições legislativas antecipadas para dia 18 de maio, o Deputado socialista Paulo Pisco diz sentir-se “frustrado” por não ter conseguido fazer aprovar todas as iniciativas parlamentares que estava a preparar e considera que Portugal tem de deixar de ter círculos legislativos tão curtos.

Neste momento, o LusoJornal fez esta entrevista de balanço aos dois Deputados eleitos pelo círculo eleitoral da Europa.

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Que balanço faz deste mandato de cerca de um ano?

Um ano é sempre um mandato muito limitado, ainda por cima a legislatura começou em abril, depois chegaram logo as férias de verão, depois tivemos o Natal, antes do Natal ainda tivemos a discussão do orçamento, que acaba por limitar as iniciativas legislativas, e depois tivemos a dissolução da Assembleia da República. Portanto, é um mandato atípico, é uma legislatura típica e que deixa muita coisa por fazer. Ainda para mais porque os primeiros meses da legislatura foram ocupados por agendamentos protestativos dos partidos políticos, que quiseram fixar a ordem do dia com as suas agendas particulares.

Mesmo assim houve um tempo legislativo…

Acho que da minha parte e da parte do Grupo parlamentar do PS, a legislatura foi relativamente produtiva, embora obviamente tivesse muita coisa ficado por fazer. Foi produtiva no sentido em que eu próprio apresentei um conjunto de iniciativas legislativas que foram aprovadas, outras que foram entregues na mesa da Assembleia da República e que acabaram por não terem tempo de terem sido discutidas. Houve a abolição da Propina no ensino de português no estrangeiro, que eu acho que foi uma coisa muito importante, era e é uma convicção minha, que eu nunca deixei de defender e consegui fosse inscrita no Orçamento de Estado para 2025 e pudesse ser aprovado. Houve também a aprovação do Passaporte especial para os funcionários consulares que é um instrumento importante para o bom desempenho, e sobretudo em segurança, dos funcionários. Na mesma altura, eu tinha entregado duas iniciativas legislativas de fui também o primeiro subscritor: uma que era muito importante que tivesse sido aprovada, é um projeto de lei para que fosse substituída a fotocópia do Cartão de Cidadão nas eleições legislativas – todos nós sabemos o drama que é, em cada eleição legislativa, haver cerca de 40% dos votos que são anulados porque não trazem fotocópia do Cartão de Cidadão.

Essa proposta não avançou?

Foi entregue na mesa da Assembleia da República, mas acabou por não ser agendada. A outra iniciativa, que eu considero também da maior importância, também foi entregue na Mesa da Assembleia, mas acabou por não ser agendada: é um programa para os jovens e os portugueses que estão no estrangeiro e que desenvolvem a sua atividade no domínio da ação cultural – são artistas, músicos, escritores – e que nos contactos múltiplos que tive, em vários países, eu percebi que este era um programa de grande importância para uma geração de criadores jovens e menos jovens, que desenvolvem as suas atividades num contexto muito competitivo muitas vezes e querem ter algum tipo de intercâmbio de promoção de divulgação de apoios que não têm atualmente. Este era um programa muito importante, que foi muito amadurecido, portanto eu espero que possa ter continuidade na próxima legislatura. A minha grande frustração é de haver algumas coisas que não avançaram. Uma delas é um compromisso eleitoral que eu assumi, que era de alterar a circunstância para os portugueses que chegassem à idade de reforma, quisessem fixar residência fiscal em Portugal. É um aspeto muito importante porque a incidência do IRS para quem tem rendimentos elevados de pensões de reforma, construída nos países onde trabalharam várias décadas, é demasiado grande e é necessário encontrar aqui um equilíbrio. Tenho pena que essa iniciativa que estava em construção – posso dizer que estava praticamente concluída – acabou por não ser entregue.

É uma espécie de programa de Residentes não habituais (RNH) para reformados portugueses?

Não é a mesma coisa, mas era uma coisa mais ou menos semelhante, pelo menos com o mesmo sentido. Outra iniciativa tem a ver com um outro compromisso que eu também assumi perante algumas pessoas, que é uma questão complexa e por isso é que eu não consegui fazer logo e que tem a ver com a situação dos portugueses que têm uma carta de condução francesa, luxemburguesa, alemã ou suíça e conduzem um carro em Portugal e que muitas vezes têm dificuldades com as autoridades ou sobretudo pessoas que, tendo uma carta de condução portuguesa, estão a conduzir um carro com uma matrícula francesa ou suíça, ou luxemburguesa e que acabam por ter problemas com a justiça. Muitas vezes há apreensões de carros, o que é uma medida absolutamente desproporcionada relativamente à circunstância em que as coisas ocorrem e que eu acho que tem a ver muito com a forma como os portugueses são olhados no estrangeiro. Não há necessidade de haver uma penalização desta dimensão. Queria retomar também a questão do Museu da Diáspora ou Museu Nacional da Emigração, porque havia um projeto para a sua concretização em Matosinhos, mas depois veio a pandemia e acabou também por ir por água abaixo. Basicamente, a minha frustração por não ter dado continuidade a algumas das iniciativas que eu considerava e considero muito relevantes, tem a ver com este tipo de iniciativas legislativas. Houve muitas outras coisas, ao longo deste período, que foram feitas. Eu acho que no prazo de 1 ano são coisas positivas. No domínio do ensino, o facto de termos feito um requerimento para que a Presidente do Instituto Camões fosse à Assembleia da República explicar qual era a política de língua e também relativamente aos leitorados e tenho que referir aqui a minha enorme frustração relativamente ao facto de ter sido dito pela Presidente do Instituto Camões que a revisão do Acordo bilateral de ensino entre Portugal e a França e que data dos anos 70, deveria ter sido assinado durante a visita do Presidente Macron, mas acabou por não ter sido assinado e eu lamento…

Mas foi assinado um Acordo bilateral em matéria de ensino com base no Acordo de 1970. Foi confirmado ao LusoJornal pelo Embaixador de Portugal em França…

Então eu retiro o que disse, porque eu andei à procura dessa informação e não a encontrei. Eu ainda quero ver para crer, porque quero ver sobretudo os termos em que o Acordo foi assinado e se corresponde ou não a todas as expectativas relativamente ao reconhecimento da língua portuguesa em França. Houve também uma pergunta que eu considero da maior importância como alerta para o Governo, relativamente à situação dos leitorados em França e não só em França, porque há uma situação de quase abandono. Não se passa o mesmo com todos, mas há claramente uma situação que necessita de atenção, que não tem tido até agora e que tem levado a um enorme descontentamento e que tem levado a situações muito difíceis como por exemplo quando abrem concursos para recrutar professores, muitas vezes ficam desertos, é algo que não é aceitável que aconteça, o Governo tem que dar uma resposta para esta situação. Houve também muitos outros votos que foram apresentados para algumas figuras da Comunidade portuguesa, particularmente aqui em França, Daniel Ribeiro, António Fernandes, ou, noutra dimensão, também relativamente àquela menina portuguesa que foi assassinada no Reino Unido, situações sobre a Comunidade portuguesa na Venezuela, por exemplo, entre outros. Depois, eu considero que a minha intervenção no debate de 7 de fevereiro foi muito importante, porque faço um apelo a uma mudança de paradigma na relação entre Portugal e as nossas Comunidades e das políticas públicas que lhe são dirigidas. Eu acho que essa intervenção revela muito da minha insatisfação relativamente à forma como o Governo tem desenvolvido as políticas para as Comunidades, que não saem do mesmo padrão daquilo que tem sido a política para as Comunidades nos últimos 50 anos – e mesmo quase que se pode dizer antes do 25 de Abril – e eu acho que tem que haver uma mudança de paradigma, uma mudança radical, porque não se pode continuar a olhar para as Comunidades da mesma forma, sendo que a presença portuguesa no mundo mudou radicalmente, transformou-se radicalmente, não é nada hoje daquilo que era há 30 anos atrás, há 40 anos, há 50, nem mesmo há 20 anos… e esta mudança tem que ser refletida claramente nas políticas dirigidas às nossas Comunidades. É uma grande frustração também vivemos ciclos políticos tão curtos. Nenhum país pode desenvolver nenhum projeto, dar continuidade, quando os ciclos políticos são tão curtos como aquilo que tem acontecido nos últimos tempos em Portugal. O que nos interpela também para a necessidade de haver, de facto, uma mudança na cultura política em Portugal, mas uma mudança que não tenha nada a ver com aquilo agora acontece…

Mas você também votou contra a moção de confiança ao Governo, pondo quase automaticamente fim à legislatura…

Aí eu tenho uma leitura completamente diferente. O Governo não pode dizer que a culpa da queda do Governo é do Partido Socialista. Não pode. Porque o Partido Socialista foi quem garantiu ao Governo a continuidade. O Grupo Parlamentar do Partido Socialista viabilizou desde logo a eleição do Presidente da Assembleia da República, viabilizou o programa do Governo…

Mas agora não quis viabilizar a continuação do Governo…

Aquilo era uma provocação do Governo, que quis testar a coerência do Grupo parlamentar do PS e do Secretário-geral do Partido Socialista. Sabia que se apresentasse uma Moção de confiança, ela iria ser chumbada, então o Partido Socialista rejeitou duas Moções de censura, a do Chega e a do Partido Comunista, que necessidade é que tinha de pôr o Partido Socialista ainda mais à prova? Luís Montenegro queria de facto fazer uma fuga para a frente por causa da situação em que está envolvido com a empresa Spinumviva que há ali claramente incompatibilidades entre a atividade empresarial da empresa que criou e a sua condição de Primeiro-Ministro e, portanto, não faz nenhum sentido estar a querer lançar a responsabilidade ao Partido Socialista porque não tem. O Partido Socialista é o responsável, sim, pela continuidade do Governo e de ele ter tomado posse, de ter tido a possibilidade de desenvolver políticas, de resolver alguns problemas que estavam pendentes também e, portanto, não é a responsabilidade, de todo, do Partido Socialista.

Vai voltar a ser candidato?

Isso não é assunto. Muito em breve já se saberá, dentro de dois ou três dias.