Morreu esta manhã o artista plástico José Marreiro

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Morreu esta manhã, na região de Reims, onde vivia há muitos anos, o artista plástico José Marreiro, vítima de doença prolongada. Português nascido no Algarve, engenheiro na indústria automóvel, homem de grande cultura, estava extremamente apaixonado por Portugal.

O pai teve uma empresa de transportes em Portugal. “Associou-se com o meu padrinho, mas foi uma má associação, por isso teve de emigrar para França” contou ao LusoJornal.

O pai emigrou em 1963 e José Marreiro veio para França em 1965, quando já tinha 5 anos. “Eu já não sei se sou português, francês, italiano – porque a minha mulher é italiana -, já não sei se sou apátrida, mas sei que o meu coração fala português. Nada mais” confessou.

Quando falava do seu percurso, costumava rir com o facto de ter chumbado na primeira classe. “Eu devo ter sido o único a chumbar na primeira classe francesa. Pelo menos não tenho nenhum amigo que tenha chumbado na primeira classe”. Depois as coisas passaram-se melhor, até ao dia em que queria entrar nas Belas Artes e o pai lhe impôs entrar na Escola da Renault, onde trabalhava.

Dos cerca de 1.800 candidatos, entraram 60 e apenas 50 terminaram o curso. “Era uma escola de elite” costumava dizer. “Na verdade, foi uma sorte que eu tive nesta escola. Fiz pesca submarina, fiz vela num barco de 15 metros, tudo pago pela Renault… Tive sorte”.

Começou então a trabalhar para a Renault – chegou mesmo a ser “o patrão” do próprio pai – e mais tarde trabalhou para outras empresas, sempre no ramo automóvel.

Mas também sempre continuou a estudar à noite. Tirou um CAP e um BEP de desenho, passou o Bac, até se licenciou em arquitetura – “que não me serviu para nada, salvo para projetar a casa de alguns amigos”.

Começou a tirar uma licenciatura em engenharia automóvel, que só terminou mais tarde e até fez uma tese de doutoramento. “Fiz tudo ao contrário” costumava dizer. “Habitualmente as pessoas licenciam-se e depois vão trabalhar, eu fui trabalhar e licenciei-me depois”.

O trabalho ocupou-o muito. Viajou pelo mundo, da Argentina à China, passando pelo Brasil, Áustria, Itália, Espanha, Inglaterra, Alemanha… “Visitei muitos países, mas só conheço empresas, não visitei nada. Todos os anos vou ver a minha família em Portugal, as minhas raízes estão lá, e é lá que me sinto bem”.

Se durante a semana trabalhava, ao sábado vestia “a pele de português”, fazendo “bricolage” e ao domingo era o momento da pintura, num amplo atelier que adaptou em casa, com um charuto na boca e música nos auscultadores. “Pode acontecer tudo à minha volta, eu não dou conta de nada, entro no meu mundo” e diz que a pintura foi a forma de melhor carregar baterias, de lhe trazer a paz necessária para o emprego.

Diziam dele que era uma autêntica “esponja”. “O que eu vejo, entra na minha cabeça e ali fica. Tenho uma memória fotográfica fora de série e uma visão em 3D muito importante”, foi o que confirmaram também os testes psicotécnicos que fez.

“Na pintura, eu sou autodidata, não vou buscar nada, invento tudo, quando na minha cabeça está feito, lanço-me, desenho e pinto. A pintura é como uma terapia. Obriga-me a um certo rigor, é como um jogo de xadrez, não se deve pôr uma peça antes da outra, se queremos ganhar, claro”.

Pintava a óleo, a pastel e a aguarela. Fazia pintura figurativa de uma qualidade extraordinária. “Na aguarela não existem trapalheiras, não se pode vir atrás” por isso, ultimamente, quando a saúde lhe permitia, pintava sobretudo em aguarela.

Recebeu vários prémios em França, foi publicado em revistas especializadas francesas, mas em Portugal… só lá expôs duas vezes. “Em Portugal reconhecem o artista holandês, o belga, que mora lá, mas não reconhecem o português que mora no estrangeiro, para eles sou um anónimo”. E esta situação feria-o.

Também escrevia poesia, mas em língua francesa. “Portugal nunca gastou um cêntimo com a minha formação em português. Quem me formou foi a França, por isso, mesmo se a minha língua materna é o português, é em francês que exprimo sentimentos” disse ao LusoJornal.

Sabia os hinos dos dois países de cor, mas os olhos brilhavam mais quando cantava A Portuguesa.

Leitor assíduo do LusoJornal, José Marreiro sempre se sentiu português. Pediu desculpa a Portugal pelo sotaque afrancesado, por não conseguir escrever português, mas sempre considerou que Portugal é um país nobre, com uma história antiga.

A doença, que lhe perturbou a vida nestes últimos anos, acabou por levá-lo para esta viagem… sem regresso!

Também deixou um vazio no LusoJornal com o qual colaborava.

Ilustração com aguarelas de José Marreiro.

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