Nas conversas familiares, nas redes sociais e nas associações portuguesas espalhadas pelo mundo, um tema ressurge com força entre os emigrantes portugueses: o desejo de regressar a Portugal. Para muitos, é uma questão de coração; para outros, um desejo prático de envelhecer com dignidade na terra que os viu partir. Contudo, a realidade fiscal e económica tem-se revelado um obstáculo quase intransponível para esse retorno. Apesar do apelo constante dos sucessivos Governos para o regresso dos emigrantes, a verdade é que a política fiscal adotada incentiva precisamente o contrário, criando uma dissonância entre o discurso oficial e a realidade enfrentada por quem deseja voltar.
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O desafio fiscal: entre a saudade e a realidade
O cenário é paradoxal. Portugal precisa de população ativa e de investimento, mas impõe barreiras fiscais que desencorajam o regresso dos seus cidadãos reformados.
A recente eliminação da taxa reduzida de 10% para pensionistas ao abrigo do Regime de Residente Não Habitual (RNH) foi um golpe duro para muitos emigrantes que tinham planeado o seu retorno contando com este incentivo. Hoje, confrontam-se com uma carga fiscal pesada, que, em muitos casos, supera a dos países onde residem atualmente, como é o caso da Suíça – com uma Comunidade de 260 mil portugueses – onde as tributações sobre pensões são mais brandas.
Em 2022, a Suíça foi o principal destino da emigração portuguesa, com cerca de 10.000 entradas, seguida pela Espanha (8.272), Reino Unido (7.941), França (7.663) e Alemanha (5.935).
Estas comunidades, com rendimentos médios superiores aos praticados em Portugal, enfrentam desafios específicos no seu regresso devido à diferença de carga tributária. A Suíça é igualmente o país que lidera a lista de candidaturas ao Programa Regressar e o emissor de remessas recorde em 2023, com o montante global de 1.085,5 milhões de euros a ultrapassar o de França (1.045,2 milhões) de acordo com dados do Banco de Portugal.
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Propostas para um Regresso Sustentável
Felizmente, há soluções possíveis. A adoção de medidas fiscais específicas pode facilitar a reintegração dos emigrantes pensionistas na sociedade portuguesa sem comprometer as finanças públicas. O Conselho das Comunidades Portuguesas formalizou ao Governo e aos partidos um conjunto de propostas fiscais, incluindo:
– Isenção fiscal temporária: Uma isenção parcial ou total sobre pensões estrangeiras durante os primeiros cinco anos de residência em Portugal. Esta medida proporcionaria um período de adaptação e incentivaria o regresso sem comprometer a arrecadação fiscal a longo prazo.
– Limite de isenção para pensões modestas: Criar um teto anual até ao qual as pensões estrangeiras seriam isentas de IRS, garantindo que os reformados com rendimentos mais baixos não sejam penalizados de forma desproporcional.
– Incentivos à aquisição de habitação: Atribuir créditos fiscais a pensionistas emigrantes que invistam em habitação própria em Portugal, promovendo a fixação definitiva e dinamizando o mercado imobiliário.
– Abatimento fiscal com base em contribuições anteriores: Permitir uma dedução fixa para pensionistas que tenham um histórico de contribuições para a Segurança Social portuguesa, reconhecendo o seu vínculo passado com o sistema.
– Benefícios para a fixação em zonas do interior: Introduzir incentivos fiscais adicionais para aqueles que escolham viver em regiões de baixa densidade populacional, contribuindo para a coesão territorial e o combate ao despovoamento.
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Oportunidade económica e social
A implementação destas medidas não é apenas um ato de justiça, é também uma estratégia económica inteligente. O regresso de emigrantes pensionistas traz consigo benefícios tangíveis: desde o consumo local até ao investimento em serviços de saúde e bem-estar. Estes cidadãos, além de aportarem rendimentos, também carregam experiência, redes de contatos internacionais e uma visão do mundo que pode enriquecer a economia nacional.
Portugal precisa de olhar para os seus emigrantes não como um peso fiscal, mas como um ativo estratégico. O Programa Regressar deve ser reforçado com incentivos fiscais robustos e sustentáveis, garantindo que aqueles que desejam voltar possam fazê-lo sem receios financeiros.
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Conclusão: O momento de agir
Apesar dos sucessivos apelos ao regresso dos emigrantes, a falta de incentivos concretos perpetua uma contradição evidente entre o marketing político e a realidade fiscal.
Portugal sempre se orgulhou de ser um país de emigrantes, mas é tempo de se tornar também um país de regresso. Criar um quadro fiscal mais justo não é apenas uma questão de equilíbrio económico, é uma obrigação moral para com aqueles que, apesar de terem partido, nunca deixaram de ser portugueses.
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António Iria
João Figueiredo
Conselheiros das Comunidades Portuguesas