Saúde: Doença de Dupuytren

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A doença ou contractura de Dupuytren é um ícone da Cirurgia da Mão. Envolvida em controvérsia desde a sua designação, mecanismos que a desencadeiam e terapêutica gera partidários de uns e outros grupos que se digladiam apaixonadamente. Relativamente frequente no mundo ocidental, é visualmente conspícua, incapacitante e impede execução de tarefas da vida diária. O seu tratamento oferece melhorias tangíveis, necessitando de profundo conhecimento de anatomia, destreza cirúrgica e domínio de diferentes técnicas como enxertos, retalhos, manipulação nervosa, etc.

Foi inicialmente descrita por Henry Cline da Escola Inglesa, em 1777, e a primeira intervenção cirúrgica para o seu tratamento foi realizada por Astley Cooper em 1822. O barão Boyer, um dos mestres de Dupuytren descreve a doença em 1826 como “crispatura tendinum” e em 1831 o Barão Guillaume de Dupuytren realiza a primeira excisão de tecido doente para o seu tratamento. A doença toma o nome de Dupuytren devido á sua personalidade, importância pessoal e importância da medicina francesa na altura.

Esta doença é uma doença dos fibroblastos e da deposição de colagénio ao nível da fáscia palmar (e muito mais raramente plantar e pénis), quase exclusiva da raça branca ao contrário das cicatrizes queloides que também são uma doença dos fibroblastos e da deposição de colagénio, mas extensiva a toda a pele exceto palmas, plantas e pálpebras sendo esta muito mais frequente na raça negra.

A causa desta doença é desconhecida. Tem uma base hereditária relacionada com uma alteração genética, oriunda do norte da Europa e disseminada pelas migrações Celtas (é aliás muito mais frequente e com quadros muito mais graves no Norte da Europa que nos países Mediterrâneos onde a sua prevalência ronda os 2-3% (contra os 12% da Noruega). Outros fatores que contribuem para o aparecimento da sintomatologia são o traumatismo repetido das mãos (por exemplo profissões manuais usando instrumentos vibratórios); a Diabetes, o alcoolismo e a cirrose hepática.

Surge sobretudo em homens, acima dos 50-60 anos, bilateral em 70-80% dos casos e evolui por ciclos havendo alturas em que surgem novas lesões e agravamento das deformações e outras em que está relativamente quiescente.

Consiste na deposição de tecido de cicatriz na fáscia palmar e digital (estrutura que se encontra entre os tendões flexores e a pele) criando um bloqueio ao funcionamento da mão.

A doença manifesta-se inicialmente por distorções das pregas palmares (pregas transversais da palma das mãos) que evoluem para umbilicações palmares.

O aparecimento de nódulos subcutâneos palmares é subsequente. Nesta fase inicial pode haver dor ou desconforto se os pressionarmos ou traumatizarmos.

Estes nódulos eventualmente progridem com a formação de cordas espessas que tracionam os dedos para uma posição de flexão impedindo a sua extensão. Atinge mais frequentemente os dois dedos mais distantes do polegar. Esta doença gradualmente piora com o tempo.

Apesar de indolor, a deformação causada impede atividade simples como cumprimentar com aperto de mão, colocar as mãos nos bolsos, lavar a cara ou mesmo agarrar em objetos.

O diagnóstico é clínico e não necessita de exames complementares.

Um teste clássico consiste em apoiar a palma numa mesa. O não ser capaz de realizar contacto com toda a palma constitui uma indicação operatória (tradicionalmente se conseguirmos passar um dedo entre a mesa e a palma).

Mas nem sempre é necessário ser operada. Sendo essencialmente indolor se as deformações forem ligeiras, com progressão lenta e causar pouco impacto nas atividades da vida diária pode não chegar a necessitar de tratamento. Pode inclusivamente realizar a autoavaliação com o teste da mesa.

E o que é que podemos fazer para tentar prevenir o agravamento da doença? Na realidade pouco. Podemos, no entanto, proteger as mãos almofadando os cabos das ferramentas manuais ou usando luvas também bem almofadadas.

Não há cura para a doença de Dupuytren. Os tratamentos aliviam os sintomas e diminuem a progressão da doença dando alívio temporário. A contração dos dedos normalmente retorna com o tempo.

Uma cirurgia bem regrada a nível palmar previsivelmente previne o ressurgimento da doença nesse local (não impedindo, no entanto, que ela reapareça em qualquer outro local da palma já que é uma doença da fáscia). Ao nível dos dedos é praticamente impossível prevenir o seu reaparecimento.

Se operada sem que tenha havido longo tempo de deformação dos dedos é expectável uma recuperação motora total. No entanto longos períodos de deformação levam a alteração articulares e retrações tendinosas e dos pedículos vásculo-nervosos que tornam impossível essa recuperação.

O tratamento envolve a dissolução, corte ou remoção das cordas que fletem os dedos. Isto pode ser realizado de diferentes formas havendo inclusivamente debates encalorados entre os partidários dos diferentes métodos.

“Needeling”: o corte das cordas é realizado por uma agulha a través da pele anestesiada. Tem muitas recidivas mas pode ser repetido. A recuperação é muito rápida e pode ser realizado sem ir ao bloco operatório.

Injeções:

Corticoides: Numa fase inicial a injeção de corticoide num nódulo doloroso pode diminuir o desconforto e atrasar a sua evolução.

Colagenase: A injeção local desta enzima que destrói o colagénio parte a cordas aparentemente com intercalo livre de doença de alguns anos. Não é no entanto desprovidas de possíveis complicações já que pode causar ruturas tendinosas.

Cirurgia: consiste no corte ou na excisão do tecido que causa a flexão dos dedos. Normalmente tem resultados mais completos e duradouros que os outros métodos, mas a recuperação é mais demorada e deve ser complementada por fisioterapia.

Por vezes, ou porque a pele está muito infiltrada e tem de ser removida, ou porque “encolheu” por os dedos estarem em flexão muito tempo e quando se estendem não chega para revestir tudo no final da cirurgia ficamos com feridas que podem ser deixadas a encerrar apenas com pensos, que podem ser encerradas com enxertos de pele ou encerradas com retalhos.

Uma técnica recente para tentar prevenir a recorrência da doença consiste na injeção de gordura entra a fáscia palmar e a pele já que aparentemente a génese da doença dependerá da interação da fáscia com a pele palmar suprajacente.
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Dr Rui Leitão
Cirurgião plástico
Clínica Fisiogaspar

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