1934 e a mais rica exposição sobre Portugal jamais realizada em Paris?

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Os visitantes da exposição que teve lugar em Paris, na galeria Mm. Mags Bros entre os dias 23 de junho e 3 de julho 1934, testemunharam um dos acontecimentos mais marcantes, mais ricos, fora de Portugal a nível dos objetos apresentados: uma parte dos livros do rei D. Manuel II, último rei de Portugal, destituído pela implantação da República a 5 de outubro de 1910.

D. Manuel II, o Patriota ou o Desventurado, personagem erudita, não se destinava a ser rei de Portugal. O assassinato do pai, o rei D. Carlos, e do irmão mais velho, tornou-o rei de Portugal entre 1 de fevereiro de 1908 e 5 de outubro de 1910, um dos reinados mais curtos da história de Portugal.

Viria a falecer no exílio, em Londres, de um edema de glote, com apenas 43 anos. O seu corpo viria a ser repatriado para Portugal e inumado no Panteão Real a 2 de agosto de 1932.

Antes de seguirem para a antiga residência real de Vila Viçosa, foram expostos 120 livros da vastíssima e riquíssima coleção de D. Manuel II em Paris.

Foram apresentados o primeiro livro impresso em Portugal (1489), o primeiro livro de medicina em português (1496), a primeira edição do livro de Marco Paulo (1502), a primeira recolha de poemas portugueses (1516), o primeiro livro da história da natureza em português (1529), a primeira tradução portuguesa de Cicéron (1531), o único livro conhecido da vida de Sainte Catherine de Gènes (1564)… e um livro que interessava particularmente a França: um exemplar do livro de Boscán e Garcilasso de la Vega (1543). Realçamos ainda a presença nesta magnífica exposição de manuscritos de Bello Septensi de Math, de Pisano.

D. Manuel II, depois de destituído, já era bastante erudito, mas lança-se na aquisição de livros antigos com o intuito de serem mais tarde expostos em Portugal. Concentra-se igualmente no seu trabalho bibliográfico e histórico.

O primeiro objetivo das suas investigações seria escrever uma monografia sobre o reinado de D. Manuel I, o Venturoso. Começou a recolher, em 1920, monografias e documentação para escrever a história do reinado do Rei, seu homónimo do século XVI, procurando trazer nova luz sobre o problema da expulsão dos judeus.

Ao prosseguir esse projeto, foi reunindo obras quinhentistas e surgiu-lhe mais tarde a ideia de fazer uma coleção de livros antigos portugueses (séculos XV e XVI). Esse propósito tomou uma tal amplitude que culminou numa das melhores coleções de impressos portugueses do século XVI. Pode dizer-se que este acervo só tem paralelo em número com a Biblioteca Nacional de Portugal ou a Biblioteca Pública de Évora.

Em 1929 saiu o primeiro volume do catálogo de D. Manuel II, em edição bilingue português/inglês, de “Livros Antigos Portugueses” seguido pelo segundo volume em 1932.

D. Manuel II morre nesse ano e, portanto, o terceiro volume será feito pela sua secretária, Margery Withers. Os dois primeiros são incomparáveis pela iconografia que apresentam e pelo estudo das obras que o rei ia adquirindo e investigando.

A qualidade e a erudição do trabalho de D. Manuel II coloca-o nos primeiros lugares da nossa história do livro, só comparável a Barbosa Machado ou a António Joaquim Anselmo.

Para destacarmos alguns exemplares, podemos falar de “Vita Christi” 1495, das “Ordenações Manuelinas” de 1514, das obras de Pedro Nunes desde 1537, das obras de Damião de Góis desde 1543, das obras de João de Barros, André de Resende, D. Jerónimo Osório, Frei Heitor Pinto, etc.

As espécies adquiridas são também do melhor quilate: pode falar-se em “Constituições do Bispado do Porto” de 1497, o primeiro incunábulo de um impressor português; “História… do Descobrimento e Conquista da Índia” de Fernão Lopes de Castanheda; “A Crónica do Condestável” na primeira edição de 1526, obra atribuída a Fernão Lopes; várias obras de Frei Luis de Granada e de Frei Heitor Pinto.

Entre os manuscritos destacamos o “Livro de Menagens” a D. Manuel I e o “Livro de Sentenças para D. Sebastião”, iluminado por António de Holanda, a Carta de Patrício Romano dada ao Bispo D. José Maria da Fonseca, uma Bíblia em pergaminho do século XIII, um livro de Horas em pergaminho do século XVI e vários forais manuelinos.

Entre os valiosos volumes encontram-se ainda as primeiras edições dos livros de Luís de Camões, o poeta português elevado a símbolo nacional. Exemplares raros de “Os Lusíadas”, das rimas e do teatro, fazem parte da vasta coleção que esteve exposta na Fundação Gulbenkian entre o 13 de novembro de 2015 e o 15 de fevereiro de 2016 e que serviu também para contar “o modo como Camões foi sendo editado ao longo do tempo”, como diz numa reportagem José Augusto Bernardes, Comissário da exposição intitulada “D. Manuel II e os livros de Camões”.

Marcelo Rebelo de Sousa diria desta exposição: “Uma Exposição singular, pelo caráter único da vinda destas obras de Vila Viçosa. Singular, pela convergência entre a Fundação Calouste Gulbenkian e a Fundação da Casa de Bragança. Singular, ainda, pela qualidade e pela raridade de uma coleção tão completa das obras de Luís Vaz de Camões. Singular, acima de tudo, pelo amor nacional e pela visão de D. Manuel II, sem cujo persistente espírito de colecionador e de estudioso, Portugal e os Portugueses nunca teriam podido beneficiar de uma Biblioteca tão rica e tão ilustrativa de tempos memoráveis da sua História pátria”.

Numa reportagem, o Comissário José Augusto Bernardes diria: “Os Lusíadas é talvez o único símbolo consensual da cultura portuguesa”.

 

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