António Santos Pereira foi soldado na I Guerra mundial: Gil Santos é o seu intérprete… e muito mais

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Gil Manuel Morgado dos Santos é neto do combatente da I Guerra mundial António dos Santos Pereira. Em entrevista concedida ao LusoJornal, o primeiro respondeu-nos… como se fosse o segundo.

António dos Santos Pereira escreveu um manuscrito em forma de diário, sobre a “sua” Grande Guerra.

A partir do manuscrito do avô, Gil Santos editou o livro que vai já na segunda edição e que tem por título “A saga de um combatente na I Guerra mundial: de Chaves a Copenhaga”.

Da apresentação do dito livro podemos ler: “Da calma medieval do Portugal profundo, para o terror da guerra na Flandres, foram enviados homens simples, enganados, cujas vidas mudariam para sempre. A ferro e fogo, fustigados pelo frio, pela fome e pela doença mas sobretudo pela metralha, viveram momentos únicos – terríveis – no abrigo, no hospital de campanha, no cativeiro e na trincha”.

Contrariamente à maioria dos soldados portugueses que, depois de regressarem da guerra, pouco contaram sobre a guerra, António dos Santos Pereira foi umas das exceções à regra.

Gil Santos diz-nos ter sido objetivo do livro “elevar os 56 mil soldados e não só o meu avô, elevar quantos sofreram na Flandres, Portugal tendo tido para com estes um comportamento profundamente ingrato”.

Com 40 anos de serviço, Gil Santos é professor de economia na Escola secundária de Caldas das Taipas, em Guimarães, tendo obtido mestrado em administração pública. À pergunta que lhe colocámos sobre a ideia da publicação do livro e seu trabalho de apresentação junto das escolas, Gil Santos diz-nos que “vivi com meu avô até aos meus 20 anos, convivi com ele até 1976. O meu avô tinha uma quinta de lavoura muito forte, cultivando, nomeadamente, batata de semente, tinha muitas boas mãos, era também tanoeiro, fabricava pipos, balsas, etc. Eu ouvi histórias da I Guerra, muitas vezes quando andava na vinha ou noutros trabalhos. As histórias que me contava suscitaram em mim sempre muita curiosidade. Convivi sempre com o seu diário da guerra que tem mais de 200 páginas, as quais começam com uma dedicatória em alemão, o meu avô esteve em casa daquele alemão a trabalhar, quando da sua prisão num dos quatro campos de concentração”.

“O manuscrito é um relato cru daquilo que ele sofreu na guerra, contudo o diário dele nunca mo deixou ler e dizia-me ‘tu só vais ler o diário quando fores grande, quando tiveres mais de quinze anos, mas eu queria que um dia tu o mostrasses a toda a gente para as pessoas verem, saberem o sofrimento imenso por que passámos naquela guerra’. Eu fiquei com o diário e com esse compromisso”.

Publicar um diário, sem total qualidade literária, é muito difícil. “No seguimento do meu mestrado, encontrei uma editora especialista em publicações relacionadas com o tema, publiquei a primeira edição do livro que conta a história do meu avô desde a saída, até ao regresso à sua terra. Publicámos o manuscrito em facsimilae para sentir o sabor do sofrimento, o pensamento do combatente. Fizemos, antes de publicar o livro, um estudo de enquadramento para provar que o que diz o meu avô está tudo rigorosamente certo, cruzámos informações, pelo qual o livro tem uma dupla leitura. As pessoas podem ler a participação dos portugueses na Guerra e ver a vida nas trincheiras através do que ele diz no diário” conta ao LusoJornal.

Gil Santos recriou o regresso do avô à aldeia. “A mãe do meu avô, a minha bisavó, teve 20 filhos. Nesta família enorme, ele era o décimo, o mais velho dos filhos vivos. Nessa recriação, cheguei fardado à aldeia e fizemos uma grande festa. Foi a partir daquele momento que a ideia de partilhar esta saga pelas escolas me veio, saga que tem tido um grande impacto sobre os alunos”.

Para fazer as suas intervenções nas escolas, farda-se e equipa-se a preceito. A farda foi-lhe oferecida após um apelo nas redes sociais intitulado “A curtir prego na Flandres”, no qual apresenta os seus achados e pesquisas sobre a I Guerra mundial. Ver AQUI.

“Tenho muito orgulho em vestir esta farda” diz ao LusoJornal, “porque dentro deste farda está a honra e a memória desta gente infeliz que muito sofreu na Flandres e no cativeiro”.

Para sentir o que foi a I Guerra mundial, para quem lá esteve, ler o livro de Gil Santos é indispensável, como importante é assistir à apresentação que Gil Santos faz da vida de avô António dos Santos Pereira.

Durante a entrevista que o LusoJornal efetuou a Gil Santos, um tema foi abordado, que poucas vezes se aborda na literatura da guerra. “A guerra tem também uma dimensão humana, a miséria humana na guerra é por vezes mais pesada do que a própria guerra. Para se criar um certo equilíbrio emocional, os franceses criaram os bordéis”. O combatente António dos Santos Pereira escreve no seu manuscrito a miséria humana: “os lãzudos, caminhavam pela avenida principal de Merville, ao chegarem a um edifício de tijolo vermelho, vejo um aglomerado numeroso de soldados, era a porta do bordel ‘Le drapeau blanc’. Os soldados faziam fila, eram mais de uma centena, cada um esperando pela sua vez. Havia bordéis mais caros e discretos, os dos oficiais. Os soldados contentavam-se de bordéis mais industrializados e despachados, era o sexo em série. Contas feitas, dado que no interior estavam três raparigas, como éramos 120 soldados, dá 40 por rapariga, tendo em conta que fazem o serviço em cinco minutos, duraria mais ou menos 200 minutos, o que corresponde a mais de 3 horas de espera”. Imagine-se, para além disso, os perigos de tal prática… os soldados portugueses, nem todos morreram em guerra, nem só morreram na Batalha de La Lys…

São estas e muitas mais histórias do mundo real das trincheiras que Gil Santos conta e que António Pereira Santos viveu na Flandres e no cativeiro em 4 campos de concentração na Alemanha.

 

Ver a entrevista AQUI.

 

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