BD “Sur un air de fado” e o Prémio de arquitetura Mies Van der Rohe

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Se posso deixar por momentos o registo confessional das últimas crónicas é porque, felizmente, recenseei dois recentes exemplos de criatividade que colocam em relação Portugal e França. Ainda assim, como verão, não resisti a umas notas pessoais.

“Sur un air de fado”, é um álbum BD, um romance gráfico desenhado sob influência do traço de Tardi. Da autoria de Nicolas Barral (desenho e texto) desenvolve-se numa Lisboa que vai da desilusão pelas derrotas de Delgado, no final dos anos de 1950, às consequências da queda de Salazar e à nova Primavera de ilusões. Desenvolve uma intriga de política e amor, com um bando de gavroches lisboetas (os putos) à solta numa cidade que nos surge desenhada com mestria e rigor. É uma história séria e bem documentada, mas onde o sonho é possível, nomeadamente uma baleia azul poder sobrevoar as ruas tranquilas da Baixa pombalina. É uma edição da Dargaud.

Na semana em que tivemos a notícia da morte de Christopher Plummer (o Capitão Von Trapp) não posso deixar de associar a fábula política anti-fascista de Barral às dezenas de vezes que vi, com as minhas filhas, o filme Música no Coração, uma história que lhes ensinou, numa idade em que ainda é fácil perceber as diferenças entre o bem e o mal, a escolher o lado da vida em que se deviam colocar.

O Prémio Mies Van der Rohe, galardão anual de arquitetura, é um dos mais importantes do mundo. Dos 449 trabalhos, em 279 cidades, em 42 países, escolhidos para a edição deste ano, 21 são de autoria portuguesa. Dois eles construídos no estrangeiro, sendo um em França. Siza é nomeado por uma obra em Itália (em colaboração com o atelier Cor) e Aires Mateus Associados (com o atelier francês AAVP de Vincent Parreira) são nomeados por uma obra parisiense, em Clichy-Batignoles. Um prédio de rendimento, comportando 172 apartamentos e zonas de comércio que se destaca no conjunto da urbanização que ocupa terrenos dos caminhos-de-ferro recentemente transformados num vasto parque público e em densa zona residencial. O edifício consta de duas construções unidas entre si, prolongadas por um jardim privado que se insere na continuidade do grande parque. Com janelas que o perfuram e iluminam, com linhas de varandas longas e estreitas de inspiração haussmaniana que se prolongam depois em grandes terraços. Nunca conseguimos ter uma imagem fixa dos perfis rendilhados dessa grande e ao mesmo tempo leve construção em permanente movimento.

No dia em que vou ajudar a minha filha mais nova a mudar-se, levando-lhe os livros, as roupas, as plantas,… sinto uma natural tristeza; mas fico contente que o seu apartamento seja num bairro tradicional de Paris, que tenha lareira (embora sem uso), que não tenha elevador, que a única esquina da casa seja a do perfil amansardado do telhado, que a estreita varanda onde ela vai colocar as plantas seja genuinamente haussmanniana.

Boas escolhas culturais e até para a semana.

 

Esta crónica é difundida todas as semanas, à segunda-feira, na rádio Alfa, com difusão antes das 7h00, 9h00, 11h00, 15h00, 17h00 e 19h00.

 

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