Opinião: Feique Nhus

A expressão que consta no título deste artigo, uma adaptação ao português de “fake news”, ou notícias falsas, não irá significar notícias inventadas ou deturpadas, mas sim notícias que são, infelizmente, verdadeiras, embora destinadas a dar ao público uma imagem incorreta e falsamente otimista de situações que nada têm de positivo.

O Instituto Camões, como entidade tutelar do Ensino Português no Estrangeiro, tem sido um perfeito campeão de “feique nhus”, pois, apesar de em cerca de oito anos ter reduzido o número de professores a metade e ter feito desaparecer mais de 15 mil alunos portugueses, com a aplicação da vergonhosa Propina e decorrente encerramento de cursos, persiste em afirmar que no sistema que se empenhou em destruir, tudo vai muito bem.

Um ótimo exemplo de “feique nhus” camonianas é um Protocolo assinado recentemente na Escola Internacional das Nações Unidas, em Nova Iorque, para implementação de aulas de Português em regime extracurricular, numa cerimónia em que esteve presente o Secretário-Geral da ONU, António Guterres.

Uma iniciativa perfeitamente louvável, se não fosse o interessante detalhe de que a entidade que vai remunerar o professor de Português será o Instituto Camões, que constantemente se queixa de falta de verba para manter os cursos de língua de origem destinados aos filhos dos trabalhadores portugueses no estrangeiro mas que sempre arranja, vá-se lá saber como, dinheiro para aulas gratuitas de Português aos meninos estrangeiros, que certamente considera muito mais importantes do que os filhos dos emigrantes.

Este caso da Escola Internacional é realmente o “feique nhus” no seu melhor, visto que nessa escola os alunos pagam altas mensalidades, o que significa que, se por parte da citada houvesse interesse, poderiam perfeitamente contratar um professor. Mas não, o Instituto Camões faz mais um Protocolo, ou um Acordo, e cada vez há mais meninos estrangeiros a aprender Português de graça, a expensas do Estado português, que ao mesmo tempo insiste em extorquir a Propina aos cidadãos portugueses no estrangeiro, possivelmente para custear, nem que seja parcialmente, os cursos acima citados.

Interessante constatar que nos Estados Unidos, com uma vasta Comunidade portuguesa, não se preocupou o ilustre Instituto em abrir um único curso destinado aos lusodescendentes, tendo porém aí colocado um Coordenador de Ensino encarregado de fazer propaganda de certificados destituídos de valor real, mas que só podem ser obtidos mediante pagamento, além de distribuir manuais e bibliotecas subsidiadas com a verba da Propina imposta aos Portugueses na Europa, onde também os alunos estrangeiros são privilegiados.

Um bom exemplo disso é o caso, em França, da transformação dos cursos ELCO, línguas comunitárias, destinados aos alunos portugueses, em cursos EILE, ensino de línguas internacionais, para que pudessem ser integrados no horário escolar e frequentados por meninos franceses que, claro, nada pagam, tudo isto feito através de um Acordo do Camões com o Ministério de Educação francês.

Porém o mesmo não sucede aos inúmeros lusodescendentes que em França frequentam o ensino paralelo, extracurricular, nos chamados cursos associativos, que, ao contrário do que sucede na Alemanha ou na Suíça, não são reconhecidos pelas escolas locais, não figurando por isso a nota de Português na caderneta escolar dos alunos.

Neste caso, o que fez o Instituto Camões? Iniciou contactos com as entidades francesas para reconhecimento do Português? Fez diligências para conseguir Acordos que o permitissem?

Nada disso, deixou tudo como estava ou ainda pior, limitando-se a um estranho Acordo com as Associações, segundo o qual os alunos pagam 60 euros anuais de Propina e têm acesso às provas do quase inútil certificado, muito erradamente apelidado de “diploma”, uma denominação apenas existente em cursos universitários, mas que não pode ser utilizada relativamente a crianças e jovens em idade escolar obrigatória.

Conceituados institutos de línguas, como a Alliance Française ou o Instituto Britânico passam certificados a alunos adultos. O Instituto Camões, que não é instituto de línguas, apesar do nome, passa “diplomas” a crianças de 11 anos.

Mais um exemplo de “feique nhus”, ótimos Acordos teoricamente destinados a divulgar no estrangeiro a Língua portuguesa, mas que, infelizmente, relegam para posição de inferioridade as crianças e jovens portugueses residentes fora do território nacional.

Acordos que, afinal, ignoram propositadamente um Acordo de caráter superior, o mais importante de todos, aquele existente entre o Estado português e os trabalhadores portugueses no estrangeiro, constante no Artigo 74° da Constituição da República Portuguesa, e que consagra como dever do Estado, o acesso aos filhos destes aos cursos de Língua e Cultura identitárias.

Deveria realmente ser este o Acordo supremo, assim como deveria ser obrigação das entidades envolvidas, o cumprimento integral e indiscutível do mesmo, mas que se pode esperar quando tão altas individualidades como o Dr. António Guterres aplaudem o ensino gratuito a estrangeiros, esquecendo os Portugueses nas Comunidades?

Feique nhus, realmente.