PCP quer o Ensino de Português no Estrangeiro de regresso ao Ministério da Educação

Jorge Pires, membro da Comissão Política do PCP, esteve no fim de semana passado na região parisiense para participar num debate organizado pelo Círculo Álvaro Cunhal sobre o «Centenário da Revolução de Outubro».

Apesar de ser membro da Comissão Política do Partido Comunista, Jorge Pires não tem o pelouro das Comunidades, nem da área internacional, mas é responsável por outras áreas com interesse para as Comunidades portuguesas, como é o caso da educação e da cultura, para além da ciência e da saúde. É também o responsável pelo setor financeiro no PCP.

Durante a sua vinda a Paris, acedeu responder às perguntas do LusoJornal.

 

Que força têm as Comunidades no PCP?

Nós olhamos para as estruturas do Partido nas Comunidades como uma forma importante de intervenção. E por isso valorizamos as Organizações que temos no estrangeiro, em muitos dos países europeus, mas também no continente americano e na África. Estamos espalhados pelo mundo. Claro que já tivemos momentos de maior organização, com mais militantes, muitos já regressaram a Portugal. Nós tínhamos uma influência significativa naqueles emigrantes que vieram para França antes do 25 de Abril, a emigração política. Hoje temos muitos jovens que vêm das universidades, que já militavam em Portugal na nossa estrutura da juventude, a JCP, jovens que chegaram a um mercado de trabalho diferente, em condições diferentes e não é fácil integrá-los na nossa atividade política. Muitos ainda estão a integrar-se. Nós tivemos nos últimos 5 ou 6 anos, cerca de 500 mil jovens portugueses, que foram empurrados para a emigração. No essencial são jovens quadros, de grande valor, jovens que vêm trabalhar em situações diferentes daqueles que vieram nos anos 60. Não é fácil integrá-los no imediato, mas nós procuramos fazer isso. Consideramos que é necessário termos Partidos que tenham capacidade de ação, não apenas em Portugal, mas também nos países de acolhimento para defenderem os nossos emigrantes. Ainda agora apresentamos uma série de propostas sobre Comunidades e só vimos uma aprovada, e ainda por cima tem a ver com Timor, não é com a Europa.

 

Os Partidos de repente começaram todos a falar da nova emigração e esquecem a emigração antiga…

Nós não. Estamos preocupados com a nova emigração porque eles vêm trabalhar em áreas em que nós somos carenciados em Portugal, na saúde, na ciência, estamos a mandar para fora do país alguns dos cérebros que garantiriam no futuro o desenvolvimento tecnológico de Portugal. Estamos a mandar para fora médicos, que tiveram muitos anos de formação e cuja formação custa cerca de 100 mil euros por cada um deles. Os enfermeiros custam muito dinheiro e chegam aos países de acolhimento a custo zero. Isso custa-nos muito.

Disse-lhe que estamos mais enraízados nos emigrantes mais antigos que vieram aqui para França há muitos anos. Nos mais jovens, temos uma necessidade efetiva e estava a explicar a situação. Mas o nosso trabalho é com os que vieram há mais anos. E é por várias razões sobretudo por se tratar de emigração política.

Valorizamos muito a nossa ação, fazemos visitas destas regularmente. Temos um membro da Comissão política a acompanhar as questões das Comunidades e no Comité central também temos uma camarada a acompanhar estes assuntos em profundidade.

 

O PCP tem-se oposto ao Voto eletrónico. Mas, tem havido debate interno sobre esta questão?

A nossa Direção guia-se por uma direção coletiva, mas ouvindo muito aqueles que têm uma relação direta sobre o assunto. Há debates, os Camaradas da emigração vão dando a sua opinião.

 

A posição do PCP pode evoluir nesta matéria?

Pode evoluir. As coisas na vida podem sempre evoluir. Somos um Partido ligado à vida. Por exemplo, era impensavel há uns anos atrás o PCP viabilizar um Governo do Partido Socialista. Mas aconteceu. Naquele momento a realidade obrigou-nos a decidir o que era melhor para os Portugueses e para nós. E nós achámos que os Portugueses já não podiam mais aguentar a repressão económica que tinha tido nos últimos anos. E fomos nós, a iniciativa partiu de nós. Na noite das eleições, dissemos que tínhamos acabado de eleger 230 Deputados e são esses que decidem quem é o Primeiro Ministro. Lembro-me bem que o PSD tinha vindo cantar vitória, que o PS tinha anunciado a derrota e tinha prometido ser uma oposição construtiva. O Bloco de Esquerda andava a deitar foguetes porque tinha aumentado o número de Deputados e era tudo o que lhes interessava. E viemos nós, o Secretário Geral do PCP que veio dizer que apenas tínham sido eleitos os Deputados e que o Governo ainda não tinha sido eleito. A iniciativa foi nossa.

 

E o que é que isso trouxe para o país?

Trouxe o fim de uma austeridade levada ao extremo. Com problemas imensos nas funções sociais do Estado, cortes brutais nos rendimentos dos trabalhadores e dos pensionistas, uma descrença enorme dos Portugueses, uma desmotivação enorme e 500 mil novos emigrantes… Era preciso interromper isso. Era preciso chegar a um momento e dizer «Não. Vamos inverter esta política» e vamos viabilizar nos próximos 4 anos uma política que restituisse salários, recuperasse direitos, apostando mais na saúde, na educação, no investimento público. É insuficiente o que está a ser feito? É. Mas já se fez muita coisa! E o Orçamento de Estado para 2018 agora aprovado é um Orçamento que, desse ponto de vista, vai mais longe do que os dois anteriores. É fundamental para tirar o país do estado em que ele ainda se encontra, apesar da situação hoje ser bem melhor do que nessa altura.

Mas também já foi dito que esta não é uma sitação repetível, porque em 2019 não vamos ter a mesma situação que tínhamos em 2015.

 

Está a dizer que se o PSD voltar a ganhar, na próxima vez deixarão o PSD governar?

Não, nada disso. Disse que a situação em 2019 não será a situação de 2015. A evolução do país não é a mesma.

 

Voltamos à participação cívica. Como se pode alterar a situação atual de grande abstenção e pouca participação dos emigrantes?

Ligando-os mais ao país. O ensino da língua…

 

Quando as mesas de voto estão a centenas de quilómetros, mesmo com uma forte ligação ao país as pessoas não vão votar, não é?

Se o problema do voto presencial é a distância das mesas, então que se encontre uma solução para abrir mais mesas de voto. A distância às mesas de voto é um problema que tem de ser resolvido. Você consegue garantir que o voto eletrónico é um voto 100% livre e 100% garantido? Conhecemos muitas histórias nomeadamente nos novos países que integraram a União europeia… O voto por correspondência é bem mais seguro.

 

A participação de emigrantes nas eleições autárquicas em Montalegre foi assunto de polémica. Qual a posição do PCP sobre o voto dos emigrantes nas eleições autárquicas em Portugal?

Há uma dúvida que temos, que é a de saber se a generalidade dos emigrantes estão suficientemente ligados à terra onde moraram – alguns saíram de lá muito novos e estiverem lá muito pouco tempo – se essa ligação é suficiente para poderem votar lá. O Presidente da Câmara de Montalegre pode vir dizer que ele trata de muitos assuntos de emigrantes, mas nem ele próprio está a acreditar no que diz. Isso é treta. Essa questão tem de ser mais aprofundada.

 

Ser português não chega?

Neste caso pode não chegar. Nas eleições para as autarquias locais, para além do projeto, vota-se em pessoas. Isso quer dizer que a ligação, o conhecimento das pessoas, do projeto autárquico, as propostas da oposição, o que tem feito a oposição, isso é que determina o voto. Na nossa opinião, o emigrante não tem essa ligação que lhe permita fazer uma escolha. Isto é a nossa opinião, não quer dizer que uma discussão mais profunda, uma solução que se encontre, não venha mudar a nossa posição. Este é um debate recente e vamos acompanhar este debate.

 

Como a sua área é a da educação, o que defende para o ensino de português no estrangeiro?

Nós defendemos o ensino do português. Isso passa pelo aumento do número de professores, pelo fim da Propina e por acabar com esta ideia do ensino do português como uma língua estrangeira. É uma forma de desvalorizar a língua, o ensino da língua e os próprios alunos que estão obrigados a assistir a aulas com níveis muito mais superficiais. Não é a mesma coisa ensinar português aos alunos franceses que querem ir de férias a Portugal, ou ensinar aos filhos dos emigrantes Portugueses que querem aprender a falar português como nós falamos em Portugal.

Nós achamos que foi um disparate tirar a tutela do ensino de português no estrangeiro ao Ministério da Educação e ter dado esta responsabilidade ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, através do Instituto Camões. Aí começa o descalabro. Enquanto responsável pela área da educação no PCP, tudo farei para que, no plano da nossa intervenção, quer na Assembleia da República, quer na infuência que temos junto dos Sindicatos, tudo faremos para alterar esta situação.

 

Mas isso faz-se aumentando o Orçamento de Estado nesta área e não foi aumentado para 2018…

Pois não. As nossas propostas não foram aprovadas. Contratar mais professores pode não ser feito este ano, mas fazer com que se deixe de ensinar português como se fosse uma língua estrangeira, é uma questão política. Não é necessário orçamento. Eu sei que foi assinado recentemente um acordo com a França, mas isso não é para a vida. Se nós tivessemos mais força na Assembleia da República, poderíamos fazer mais coisas. Mesmo no contexto atual, conseguimos fazer passar algumas coisas, mas há muitas em que estamos em desacordo com o Governo. Por acaso na área da educação é das áreas em que mais coisas foram viabilizadas. Mas nos próximos dois anos ainda vamos pedir mais coisas. Por exemplo a Propina. Vamos continuar a insistir para que o Governo acabe com ela, cá e lá. O objetivo central é ensinar português, com professores portugueses aos filhos dos portugueses. Esta é uma questão central. A Propina leva muitos emigrantes a não inscreverem os filhos para não pagarem a Propina. Estou convicto que daqui até ao fim da legislatura vamos conseguir acabar com isto. O PS já disse que não a muitas coisas, que acabou por apresentar agora neste Orçamento de Estado.

 

Mas como aliado do Governo, isto não poderia ir mais rápido?

Não somos aliados. Assinámos uma posição conjunta que permitiu viabilizar um Governo minoritário do PS, mediante alguns compromissos. Eles sabem que nós só aprovamos o Orçamento de Estado porque foram garantidas um conjunto de propostas, mas não foram todas as que nós considerávamos as fundamentais.

Com este Orçamento de Estado, vamos devolver aos Portugueses 400 milhões de euros que não vão pagar de IRS em 2018, vamos dar aos reformados mais cerca de 400 milhões de euros com este aumento estraordinário, para além do aumento estraordinário que já tiveram no ano passado. Vamos ter a progressão das carreiras nos trabalhadores da administração pública. Ora nós não podíamos dizer que isto não era suficiente porque senão, depois, teríamos de explicar a estas pessoas porque razão não viabilizamos o Orçamento de Estado.