“Sur un air de Fado” de Nicolas Barral: o triste retrato do entristecido Portugal salazarista

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Dois meses depois de ser publicado em Portugal – “Ao som do Fado” (Editora Levoir) – Nicolas Barral vê, enfim, a sua novela gráfica sair em França – “Sur un air de Fado” (Dargaud). E que magnífico é este álbum de 160 páginas com as suas cores outonais que, por um lado, potenciam os dourados da luz de Lisboa e, por outro, refletem bem o ocaso do regime fascista português.

A novela abre com um dos episódios mais importantes do colapso do Estado Novo. No Forte do Estoril, no dia 3 de agosto de 1968, dá-se a queda do ditador Salazar. Não uma queda figurada, mas sim uma queda literal: o velho fascista caiu da cadeira para não mais acordar.

Após este necessário prólogo, Barral faz-nos mergulhar na vida de Fernando Pais, um médico quadragenário com um passado estudantil (e um grande amor) revolucionário – que é contado em forma de flashback pintado a sépia – e que vive uma vida solitária e pacífica, embora triste e rotineira – apesar de um certo deboche carnal – tal como era o apanágio do regime que pesava no lombo do povo português como chumbo quente.

Fernando Pais é também o médico que é chamado à sede da PIDE para tratar os resistentes ao fascismo, para lhes curar os corpos macerados pela tortura. Ele chega, por vezes, demasiado tarde… Este seu aparente dobrar da espinha à polícia política ao regime fascista tem que ver com o seu passado e também com um membro da sua família.

As passagens violentas, naturalmente realistas, distribuem-se se maneira harmoniosa pelos oito capítulos da novela. Pranchas que transbordam de Lisboa e de Portugal: as margens do Tejo, a luz dourada refletida nos muros, os elétricos que galgam as colinas, a margem sul industrial e insubmissa onde fervilham os espíritos revolucionários, as casas de fado…

E é no meio de uma tragédia que, tantos anos depois de terminar os estudos, Fernando se apaixona outra vez… por uma revolucionária, outra vez.

Ele perdeu o primeiro amor para a Revolução em marcha. Irá perder o segundo? Irá trocar a velha vida fácil, mas triste, por uma nova vida difícil, mas feliz?

Uma história fascinante que, nestes tempos incertos que vivemos, nos recorda as atrocidades cometidas pela extrema-direita e pelo fascismo que pisaram Portugal durante 48 anos, até ao quase esmagamento. Imperdível.

 

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LusoJornal