O Deputado do Chega eleito pelo círculo eleitoral da emigração, José Dias Fernandes, faz o balanço do curto mandato desta legislatura e considera que no seu próprio partido – o Chega – as pessoas consideram que podem dirigir a emigração a partir de Lisboa.
Neste momento, o LusoJornal fez esta entrevista de balanço aos dois Deputados eleitos pelo círculo eleitoral da Europa.
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Que balanço faz desta sua passagem pelo Parlamento?
Isto para mim foi novo. Fui descobrir um terreno novo, mas fui cheio de vontade de trabalhar para as Comunidades e desde que cheguei, pus-me logo a trabalhar em projetos como por exemplo no ensino, na representatividade ou no voto eletrónico. Fui um dos primeiros a falar no voto eletrónico, já em julho do ano passado, numa intervenção que fiz. Já estava a reclamar o voto eletrónico. Agora parece que se vai conseguir com uma união das forças políticas da direita e algumas que possam vir de outos lados. Penso que vamos conseguir instalar o voto eletrónico. Depois tive outros projetos que, como a legislatura caiu, não conseguiram ir até ao final. Mas são projetos que estão em curso. Por exemplo apresentar um projeto de lei – que talvez temos de mudar a Constituição – para que os emigrantes tenham mais representatividade no Parlamento. Outro é um projeto para os emigrantes portugueses que trabalham no Reino Unido, para que possam ter uma linha de barco para embarcar no Reino Unido e sair em Leixões. Isto evitaria muitos acidentes, muitas vezes mortais, nas estradas e evitaria que um emigrante que resida no Reino Unido tenha de passar três dias para cada lado, nas estradas de França e de Espanha, gastando dinheiro pelo caminho na ida e na volta. Metade das economias já ficam pelo caminho. Outro dos projetos que nós tínhamos era a da justiça fiscal. Há emigrantes que pagam dupla tributação. Isso é inconcebível. E depois estamos com um outro projeto sobre a livre circulação de pessoas e bens. Se nós estamos na Comunidade europeia e há a livre circulação de pessoas e bens, então por que razão não podemos ter um veículo mais de 6 meses em Portugal? Se for um português que venha para cá trabalhar, pode ter aqui um carro com matrícula portuguesa o tempo que quiser e ninguém lhe diz nada. Isto é uma enorme caça à multa. Ainda no que diz respeito à justiça fiscal, temos um problema muito grave que é o seguinte: só vamos a Portugal uma vez por ano, mas estamos a pagar taxa de lixo todos os meses. Esse dinheiro nem vai, muitas vezes, para os cofres do Estado, nem das Câmaras municipais, vai para empresas privadas que depois, evidentemente, no fim do ano, apresentam lucros enormes. O outro assunto é o da taxa do audiovisual. Estamos a pagar uma taxa do audiovisual o ano inteiro, e só lá estamos uma vez por ano.
Está-me a falar de assuntos que considera importantes. Então porque não avançaram?
Porque a Legislatura acabou. Mas uma parte foram apresentados, acabaram por serem vetados em Comissão por quem devia votar. Votaram contra só por causa da cor política. Ora, isso não é fazer política positiva, é fazer política negativa para com os nossos emigrantes. Por exemplo, eu dei entrada de um projeto em Comissão sobre o ensino da língua portuguesa para todos os lusodescendentes, inclusive a história de Portugal, mas quem nos defende, quem nos representa do outro lado [ndr: refere-se ao Partido Socialista], votou contra só por sermos de uma outra cor política. Isto não é política positiva, isto é destrutivo e é por isso que Portugal não avança. Nem avança lá, nem avança cá. Olhe, para o voto eletrónico, fui eu o primeiro a ter levado este assunto à Assembleia da República, depois o PSD veio com uma proposta, a associação SEDES e o Conselho das Comunidades têm feito a pressão necessária. Nós, o Chega, apoiamos a 100%, sem problema nenhum, mas a outra força política que devia apoiar e que nos representa há tantos anos, o partido votou contra e o Deputado absteve-se [ndr: referindo-se ao Deputado Paulo Pisco]. Isto não é uma moda de fazer política positiva. A moda de fazer política positiva, é que nós sabemos que temos cores diferentes, em democracia temos que ter ideias diferentes, mas aproveitar as ideias que são boas, em conjunto. Infelizmente, no Parlamento, em Portugal, isto não é o caso.
Sinto que o balanço que faz não é muito positivo…
É um balanço negativo, neste ponto de vista. Negativo e desiludido. É muita desilusão. Mas eu digo, mesmo dentro do nosso partido, há lá gente que, para eles os emigrantes não existem, não contam. É por isso que eu muitas vezes digo: eh pá, vocês estão cá, não conseguem produzir para consumo próprio, consomem tudo o que produzem, mais o que, por caridade, a União europeia envia para Portugal e mais os 4 mil milhões de euros que nós mandamos. E eu pergunto-lhes: somos nós a mais-valia ou são vocês? Se aproveitassem um bocadinho da experiência do emigrante, podia ser muito positivo para Portugal. O emigrante português não pode ser só uma mais-valia financeira para Portugal, os nossos governantes têm que abrir a democracia aos emigrantes e aos filhos dos emigrantes, porque eles continuam a sair para cá para fora, e chegam cá e não têm os direitos, não têm direito ao voto, não têm direito ao ensino, não têm os mesmos direitos que existem lá em Portugal, então começam por se esquecer de Portugal e depois acabam-se as verbas financeiras e entrar em Portugal.
Apesar desta desilusão, como disse, tanto no interior do Chega, como na Assembleia da República, valeu a pena ter sido candidato e depois Deputado?
Valeu a pena porque, pelo menos, exprimi as minhas ideias. Tenho conhecimento profundo das Comunidades, daquilo que é necessário para elas, daquilo que elas sofrem, da centralização dos Consulados… as pessoas têm de fazer 200 ou 300 km para ir a um Consulado, isso já não está de atualidade, já estamos no século 21! Eu vou ser franco: eu quando lá cheguei, disse “porra, eu trabalhei na construção civil, vou chegar aqui ao Parlamento é só gente com diplomas”, até me sentia um bocado acanhado, mas 3 meses depois apercebi-me que os diplomas não quer dizer conhecimento, nem quer dizer experiência de vida, não quer dizer nada. Os diplomas é só quantidade. O facto de fazer, de querer fazer, positivamente, de construir alguma coisa na vida, é preciso ter vontade. O Deputado que tiver vontade de fazer um trabalho positivo, pode fazer. Agora o relax é que não faz avançar nada. Por exemplo, quando estamos na Comissão dos Negócios Estrangeiros e veio lá a Presidente do Instituto Camões para lhe colocarmos perguntas sobre o ensino de português no estrangeiro, há lá Deputados que fazem intervenções sem sequer saberem o que é o Instituto Camões, então, em vez de lhe perguntar porque é que temos 10 mil alunos em França sem aulas de português, eles vão para lá contar a história do Camões quando ele foi para Macau… As coisas passam-se assim, é gente que não tem conhecimento nenhum… há lá Deputados que vão intervir sem saberem nada sobre o assunto, estão a ler o discurso que lhes preparou o assessor. Alguns trabalham pelo título. Eu já não tenho idade para andar atrás de títulos. Fui para lá realmente porque tinha e tenho vontade de ajudar as nossas Comunidades. Vou-lhe contar o último caso que levei à Comissão, é um caso na Suíça, onde muitos pais se queixam que as autoridades sociais suíças retiram as crianças aos pais abusivamente. A ideia era chamar o nosso Secretário de Estado das Comunidades e o Ministro do Interior e perguntar-lhes o que se passa na Suíça. Ora, quem devia defender esta gente, o Deputado do PS Paulo Pisco, votou contra. O PSD também votou contra. Quando temos cidadãos que se dirigem a uma Embaixada ou a um Consulado para pedir ajuda e nem o Consulado, nem a Embaixada lhe dão atenção, viram-lhes as costas, fazem de conta que não existem, tem que haver explicações. As Embaixadas e os Consulados deviam ajudar juridicamente as pessoas que não têm acesso e muitas vezes não têm posses para pagar a um advogado. O problema é que nos Consulados, antigamente, havia assistentes sociais e hoje não há. Em vez de evoluirmos, andámos ao contrário.
Você também contribuiu, com o seu voto, para que este Governo caísse e houvesse novamente eleições. E agora, vai ser candidato outra vez, apesar desta desilusão?
Olhe, eu não ando atrás de títulos nem de prestígio. Quem decide é sempre o Chefe, neste caso é o André Ventura. Não sou candidato a nada e eles sabem disso.
Mas ainda pode ser candidato, então?
Tenho dúvidas.
Quando se vai saber?
Olhe, eu vou dizer uma coisa: é sempre o último a decidir as coisas. O partido decide estas coisas sempre em último. Eu também gostaria de saber, para saber quem é que vou ajudar. Isto não depende de mim, eu, dentro partido, sou uma pessoa pequenina, sou um puro elemento que representa os emigrantes.
Então, se o Chega está organizado no estrangeiro, não são os militantes que indicam os candidatos?
Infelizmente, eu trabalhei muito para criar núcleos nos países todos, mas o Tribunal Constitucional está sempre a chumbar os estatutos do partido. Nós temos núcleos, delegados, em toda a Europa e até no resto do mundo, trabalhei para isso, o problema é que, oficialmente, o partido não tem delegados, nem tem núcleos. E é um erro muito grande. As pessoas de Lisboa pensam que controlam os emigrantes a partir de Lisboa. Não é assim que isso funciona, é uma falta de conhecimento de como funcionam as Comunidades. Mesmo dentro do nosso partido. Eu acho que era importante ter realmente oficializado os núcleos, porque um partido que se diz vocacionado para a emigração tem que ter Conselheiros que saem da emigração, delegados que saem da emigração e tem que ter representação fora. O PS tem uma representação em Paris, o PSD também, porque é que um partido que quer estar vocacionado para a emigração ainda não tem representação? Tem representação, mas não está oficial. Nós temos que chamar as coisas como elas são ou é ou não é.
É também uma autocritica ao seu próprio partido…
Neste sentido, é a experiência que eu tenho.