LusoJornal | Carlos Pereira

Historiador Victor Pereira diz que a fronteira de Hendaye é um espaço de memória para milhares de Portugueses


O historiador Victor Pereira, da Universidade de Pau, Pays de l’Adour, Diretor de publicações na Universidade Nova de Lisboa, participou, este fim de semana, na inauguração de uma placa na Gare de Hendaye, na fronteira entre a França e Portugal, em homenagem aos Portugueses e Espanhóis, emigrantes ou exilados políticos, durante os séculos XX e XXI.

A iniciativa foi de um coletivo de várias associações portuguesas e espanholas, assim como de outras instituições, nas quais se inclui o LusoJornal, mas cuja coordenação foi de Manuel Dias, cofundador do Comité francês de homenagem a Aristides de Sousa Mendes.

O LusoJornal aproveitou para interrogar Victor Pereira.

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Qual é a importância desta fronteira para os Portugueses?

Esta é uma fronteira onde quase todos os portugueses passaram quando se exilaram, quando vieram para trabalhar, de forma ilegal para muitos, de forma legal para alguns, e foi a passagem entre ser emigrante – deixar um país – e ser imigrante – entrar noutro país, encontrar um trabalho, alguns continuar os estudos, a ter uma vida melhor. Por isso é um espaço de memória para milhares de Portugueses que vieram para França, mas também para o Luxemburgo, para a Suíça, para outros países.

De que forma era feito o acolhimento naquela altura?

Depende dos anos. A estação de Hendaye foi um ponto comum para quase todos os portugueses a partir de 1965. Porquê? Porque conhecemos as fotografias do Gérald Bloncourt, aquelas onde vemos homens caminhando pela montanha, porque até 1964 as pessoas entravam em França clandestinamente e a partir de 1964, o Estado francês precisava de mão de obra portuguesa e começou uma política de dar Récépissés, isto é, documentos provisórios. Então os Portugueses ficaram a saber – não logo, mas progressivamente – que bastava vir até Hendaye, à estação, e que os deixam passar. A ONI – Office National d’Imigração – dá-lhes um Recepissé e podem continuar. Depois, muitos deles iam para Champigny, Aubervilliers, tinham de fazer longas filas no Boulevard Ney para terem a Carte de Séjour, na Rue de Crimé, para terem a Carte de Travail, e a partir daqui começam a entrar muitas pessoas.

Isso mudou a tipologia que quem por aqui passou?

Sim. É por isso que já em 1965 há fotografias do Gérald Bloncourt nesta estação e aqui está atualmente uma exposição com fotografias de Gabriel Martinez. Ora, o que vemos nestas fotografias são muitas mulheres, porque muitas vezes os homens vieram sozinhos e de forma clandestina, a salto, e depois de alguns anos, fizeram vir as esposas, os filhos, às vezes até os pais, de forma mais ou menos regular. Por isso é que se vê nesta exposição muitas fotografias de mulheres. Nesse período das fotografias, entre 1969 e 1971, chegaram em França mais de 350.000 pessoas. Se fizermos a média, eram 400 pessoas que cada dia chegavam de Portugal a Hendaye e depois seguiam para Paris, para Bordeaux,… para outras terras de França.