LusoJornal | António Marrucho

I Guerra mundial: Os Blockhaus alemães do outro lado das trincheiras dos soldados do CEP

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Com a entrada em guerra de Portugal e a chegada dos soldados do Corpo Expedicionário Português (CEP) à zona de combate, os soldados britânicos retiraram-se para outras posições e os soldados portugueses foram substituí-los numa linha que vai de Fauquissart à Festubert, passando por Neuve Chapelle, a cerca de 40 quilómetros a oeste de Lille.

Foi a partir de Neuve Chapelle que Bertrand Lecomte (1), professor, historiador e autor, nos fez visitar uma zona de Blockhaus alemães que ocupavam a parte traseira da frente alemã daquele setor.

Foi de Neuve Chapelle que partiu, em 1958, o Cristo da Trincheiras que está patente na sala do Capítulo no Mosteiro da Batalha. Em Neuve Chapelle não há praticamente vestígios da I Guerra mundial, porque a localidade foi destruída a 100% e teve de ser completamente reconstruída. Ali decorreu a batalha com o nome da vila e os alemães ocuparam-na até 1915, altura em que os britânicos a retomaram. Defendida pelos soldados do CEP, passará novamente para as mãos dos alemães durante a Batalha de La Lys, tendo sido libertada finalmente pelos ingleses em novembro de 1918.

Partindo da igreja construída entre 1924 e 1927, caminhámos pela Rue du Curé, e apenas 500 metros feitos a pé, parámos perto de um contentor completamente decorado exteriormente, com uma exposição no interior, ali colocado e animado pela associação l’Alloeu Terres de Batailles, sobre o tema da I Guerra Front Line Box 14-18. Estamos praticamente na zona das trincheiras inglesas, futuras trincheiras portuguesas, ali padeceram, no início da Guerra, milhares de indianos, 4 mil corpos nunca chegaram a ser recuperados. Nos trabalhos da lavoura, ainda hoje se encontram vestígios e restos mortais de soldados. O terreno é extremamente húmido, o que dificultou certamente a construção das trincheiras, tornando as condições de vida dos combatentes ainda mais rudes. É utilizada no parapeito tijolo para solidificar, madeira.

Caminhámos mais 100 metros e Bertrand Lecomte diz-nos que estamos a atravessar as trincheiras do CEP. À nossa direita, a cerca de 1 quilómetro, avistámos a entrada do Cemitério militar português de Richebourg, construído praticamente nas trincheiras ocupadas pelos soldados do CEP. Pensámos nos sofrimentos dos soldados portugueses, alguns dos quais ainda ali estão provavelmente debaixo de terra, porque nem todos os corpos de soldados falecidos do CEP foram recuperados… Sentimos uma certa emoção!

Na zona chamada “no man’s land”, “terra de ninguém”, atravessámos um pequeno ribeiro, a “Rivière de Layes”, que foi contudo um obstáculo suficiente para que ao seu redor milhares de soldados tenham falecido, os alemães estando do outro lado, numa zona a descoberto, mas ocupando sobretudo uma zona de floresta difícil de se saber o que por lá havia e difícil de detetar o que os alemães preparavam.

Entrámos no caminho privativo do Bois de Biez, terreno pertencente a Lorgies, localidade que os alemães ocuparam durante toda a I Guerra mundial.

Ao entrarmos no caminho do Bois de Biez, a floresta ocupa o terreno, ali estão cerca de 40 Blockhaus (fortificações), contudo poucos são visíveis. Ali estava todo um arsenal construído pelos alemães, que nem com meios aéreos eram visíveis. Vê-se algumas covas deixadas pelas bombas, que ao caírem e dado que o terreno é extremamente húmido, explodiram sem deixar grandes buracos.

Lembremos que os Blockhaus foram construídos durante a I Guerra mundial, mas também durante a II Guerra mundial.

Os primeiros a serem edificados, foram-no pelos alemães e serviam para guardar munições, servir de lugar de observação, de comando ou até de repouso. Os ingleses começaram mais tarde a construir Blockhaus com a finalidade de atacar a partir destes, ao passo que os alemães partiram do princípio que ali estariam por muito tempo. Para eles, estas fortificações deveriam servir sobretudo de elementos de defesa.

Nesta floresta, estas construções são essencialmente de pequena dimensão, são os chamados Blockhaus russos. Uma das partes de alguns destes Blockhaus está aberta para que o ar circule, evitando explosões das munições ali guardadas.

 

Como eram construídos estes abrigos que possuem uma espessura que podia atingir um metro e meio?

O material chegava por barco, a partir do porto marítimo, havia pequenos comboios que transportavam o material, que, por estranho que pareça, vinha da Inglaterra, da Holanda e mesmo de França, até um lugar de depósito. Os últimos quilómetros antes do local de construção da fortificação, eram feitos por vagonetas puxadas por soldados, para que do outro lado das trincheiras, o inimigo – lado dos ingleses e depois dos portugueses – não se apercebesse do que estava a ser construído e preparado. Os alemães, a fim de poderem fazer estas manobras e construir estas fortificações, desviaram a eletricidade normalmente utilizada pelos elétricos da cidade de Lille.

Nem todos os Blockhaus observados tinham a mesma dimensão. Um deles, com uma dimensão bem maior, com divisões interiores e alguns restos de material, perto de um pequeno ribeiro, deduz-se que serviria para fazer circular a água, que por vezes poderia ser utilizada para ainda mais humidificar o terreno inimigo.

Algumas destas fortificações foram completamente destruídas, outras só uma parte foi danificada. Pensa-se que os alemães, no fim da Guerra, ao se retirarem, fizeram explodir o material nelas contido, ou então seriam os próprios Aliados que o fizeram, com medo de encontrarem Blockhaus armadilhados.

A Association l’Alloeu Terres de Batailles 14-18 publicou um livro intitulado «Fortifications 14-18» e o mapa «La route des blockhaus 14-18» que tem um percurso de 40 quilómetros. Ali podemos perceber para que podem servir estas fortificações: instalação de metralhadoras, artilharia, observação, ligação, posto de socorro, comando e posto de bombagem.

Ali vimos ainda muitos vestígios da I Guerra mundial. A zona visitada pertence a um particular florestal, o perigo ainda ali existe com bombas que podem ainda explodir, ferros que podem magoar por quem por ali se aventure, contudo é pena que muitos dos Blockhaus sejam utilizados para despejo ou para colocação de pinturas, por vezes, bem pouco artísticas e que desviam estes achados da sua ideia inicial.

O setor português possuía muito pouco este tipo de construção, contudo, um dos Blockhaus existe ainda nos dias presente, nas traseiras das trincheiras portuguesas, situado a uma centena de metros por detrás da igreja de La Couture, local que os soldados portugueses defenderam até à última, comandados que foram pelo Capitão Bento Roma, que viria, também ele, a ser feito prisoneiro, passadas que foram as primeiras horas da Batalha de La Lys.

 

(1) Bertrand Lecomte editou um pequeno livro intitulado “Les troupes portugaises en France 1917-1919” nas edições L3C. É um livrinho pedagógico, com a abordagem de 31 temas sobre a participação portuguesa na I Guerra mundial.

 

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