João Gonçalves, responsável pelo serviço cultural de Saint Avertin

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João Gonçalves é o responsável cultural da Mairie de Saint Avertin, uma cidade da periferia de Tours, no centro da França. Começou por estudar Direito, mas o acaso fez com que integrasse a equipa que montou o Serviço municipal da cultura desta cidade e hoje, 12 anos depois, dirige-o. Faz a programação da sala de espetáculos Nouvel Atrium e da galeria de arte contemporânea L’Annexe, para além de organizar também os eventos culturais da cidade e ocupar-se da comunicação cultural.

“Adoro o meu emprego, tenho um trabalho formidável e gosto tanto dele que, egoisticamente, tento fazê-lo o melhor que sei para o guardar” disse ao LusoJornal, numa entrevista-vídeo conduzida por Isabel Ribeiro, no programa Didascália.

João Gonçalves nasceu em Romorantin, entre Orléans e Tours, num 8 de agosto, e a família é originária de Loivos, uma aldeia do concelho de Chaves, no distrito de Vila Real. Sempre esteve ligado ao “mundo português” e dançou mesmo num grupo folclórico local. O pai foi vice-Presidente de uma associação portuguesa. “Sem ser comunitarista, gosto de participar nos eventos associativos portugueses” diz ao LusoJornal.

Em Saint Avertin já programou um concerto da fadista portuguesa Maria Ana Bobone, com a associação France Portugal de Tours. “Mas tento ser neutro, não utilizar o facto de ser português para programar espetáculos portugueses” confessa ao LusoJornal.

Ser programador cultural é, na opinião de João Gonçalves, um elo de ligação entre o público e os artistas. “No início de cada mandato, a Mairie estabelece as linhas orientadoras da programação cultural” explica. “Depois trata-se de uma relação de confiança. Os autarcas fazem-me muita confiança e eu tenho uma certa liberdade. Isto dá-me também uma responsabilidade, porque eu não posso desculpar-me dizendo que foi o Maire que me impôs uma programação. Quando não funciona, tenho de ser eu a assumir a responsabilidade”.

João Gonçalves gosta desta relação com os artistas, deste “aspeto bastante humano” da profissão. Antes do confinamento encontrou-se com Monica Bellucci. “É um encontro que não deixa ninguém indiferente” confessa, como aliás aconteceu quando programou Juliette Gréco ou quando almoçou com Jane Birkin, uma semana antes de lhe morrer a filha. “Mas o artista que mais me marcou foi Christophe”.

Os programadores não têm oportunidade de ver tranquilamente os espetáculos que programam. Mesmo se passa despercebido, nos dias dos espetáculos há sempre milhares de assuntos a resolver, surpresas técnicas,… mas João Gonçalves assiste religiosamente ao final dos espetáculos. “Estou sempre na porta a ver sair as pessoas, olhar para a cara delas. Este é o meu momento de felicidade”.

Há três anos que João Gonçalves programa também a Galeria de arte contemporânea da cidade, onde ainda recentemente expôs o fotógrafo lisboeta Victor Paiva.

“Há uns anos atrás eu também tinha alguma dificuldade com a arte contemporânea. A frase que mais se ouve é: ‘o meu filho podia fazer a mesma coisa’” confessa ao LusoJornal. “Intelectualmente é uma ação muito diferente da de organizar um espetáculo, é necessário fazer uma ligação pedagógica entre o artista contemporâneo e o público e eu considero que é uma missão explicar a arte contemporânea”.

João Gonçalves também criou o Obliques Magazine, “que neste momento está em pausa” e é articulista no Magazine Louis, um magazine sobre arte.

O lusodescendente criou a banda “Lua”, e mais recentemente “Ontem”. “Tanto eu como o Tony Calçada, com quem criei o grupo, gostamos muito do grupo ‘Amália Hoje’ que retomou canções de Amália Rodrigues. E nós fizemos o grupo Ontem” que lançou recentemente o álbum ‘Brille”.

“Nós cantamos em francês. Em Lua tínhamos uma música em português, mas eu nunca ousei fazer um projeto em português. Talvez isso venha mais tarde” confessa ao LusoJornal.

Quando ainda era adolescente, João Gonçalves tinha duas cassetes: uma de Amália Rodrigues e outra de Nirvana! Mais tarde adorou Madredeus e apaixonou-se pela voz de Teresa Salgueiro. “Se um dia fosse para uma ilha deserta, um dos 5 discos que levaria era de Madredeus” afirma. Tem a coleção completa da fadista Marisa, que considera “uma deusa”, mas também gosta dos UHF, Xutos & Pontapés, The Gift e Monspeel, “o maior grupo de metal no mundo que é português”.

Desde pequeno que vai todos os anos a Portugal no verão. “Em toda a minha vida, talvez não fui umas três vezes, mas nem sei porque não devia ir, faz parte da minha vida, do meu quotidiano”.

Vai para Loivos, uma aldeia perto de Chaves. “Uma pequena aldeia com gente simples, com vacas… Eu passava as férias a guardar as vacas dos meus avôs e a tomar banho no rio” diz com nostalgia. “Parece uma coisa do século XIX, mas é isso que eu guardo como recordação, assim como das pessoas antigas. Eu conheço todas as pessoas da minha aldeia, discuto com elas, considero que é a minha aldeia, não vou só para ir de férias, participo na vida da aldeia quando posso”.

Se tivesse apenas 24 horas para viver, confessa que as iria passar em Loivos, em frente da lareira da casa da avó e confessa com emoção que é ali “o centro do meu mundo”.

Em França não se sentiu discriminado. “Claro que me diziam que eu era o Português” mas não era nenhum insulto. “Depois, quando chegas a adulto, percebes que é uma enorme riqueza os meus pais terem-me obrigado a fazer a escola portuguesa. Hoje agradeço-lhes por isso. É uma riqueza enorme”. E acrescenta que “eu sou 100% português e 100% francês”.

Trabalhar no quadro da geminação entre Saint Avertin e Mondim de Basto faz com que, pelo menos uma vez por ano, se sinta realizado a trabalhar com os seus dois países.

Em casa, a situação é ainda mais rica. A mulher é grega e os dois filhos falam as duas línguas dos pais. “A minha mulher nasceu na Grécia, tenho dois filhos, um tem nome português, António, e o outro tem nome grego, porque queremos que saibam de onde vêm. A minha mulher fala-lhes sempre em grego e eu falo-lhes em português”.

 

Veja a entrevista conduzida por Isabel Ribeiro AQUI

 

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