Livros: “Le Pacte de la blanchité”, de Cida Bento – Pelos meandros do racismo estrutural brasileiro

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Um dos melhores ensaios publicados em língua portuguesa nos últimos anos foi traduzido e será lançado esta semana, a 5 de outubro, pelas Éditions Anacoana, em França.

Publicado no ano passado no Brasil, “O Pacto da Branquitude” confirma Cida Bento como das vozes mais pertinentes da lusofonia no que concerne a denúncia do racismo e das estratégias usadas para a perpetuação da supremacia branca, nomeadamente no Brasil. E o cartão de visita não poderia ser mais apelativo: Cida Bento foi eleita, em 2015, pela revista britânica “The Economist”, como uma das cinquenta personalidades mais influentes do mundo no que respeita a promoção da diversidade.

A grande originalidade do trabalho da autora (e deste “Le Pacte de la blanchité” em particular) reside no facto de ela utilizar um prisma de análise ainda raro no estudo dos mecanismos de discriminação racial. Cida Bento coloca o foco na análise do comportamento dos descendentes de europeus no Brasil, nomeadamente a sua elite. Ela estuda o modo como a população branca sempre construiu (e continua a fazê-lo) uma rede de influência e de alianças que é determinante na eternização do seu poder na sociedade e na criação de uma “braquitude universal”. Consequência inevitável desta estratégia: a perpetuação das práticas racistas no Brasil.

“Le Pacte de la blanchité”, resultado da sua tese de doutoramento, começa por evocar alguns dos momentos em que Cida Bento sentiu na própria pele, num sentido bastante literal, o racismo estrutural que corrói a sociedade brasileira. Perante dezenas de recusas em processos seletivos, Cida Bento reconheceu um padrão: por mais qualificada que fosse, ela nunca era a escolhida. O mesmo ocorreu com membros da sua família, que, como ela, também tinham ensino superior completo. Por outro lado, pessoas brancas com currículos equivalentes (por vezes inferiores) eram contratadas. Esta preferência aberta e desavergonhada pelos candidatos brancos causou na autora “dor, dúvida em relação à competência profissional e insegurança em relação ao futuro profissional”.

Perante esta constatação, a autora desconstrói o chavão da meritocracia tão utilizado pelos políticos conservadores e liberais, também na Europa. A esta ideia de mérito sobrepõe-se a realidade pura e dura: o preconceito racial generalizado que metastiza todas classes sociais brasileiras. Prevalecendo deste modo o axioma: sem igualdade de oportunidades e equidade social, a meritocracia é uma impossibilidade.

Cida Bento deu um nome a esta estratégia não verbalizada de autopreservação usada pela elite branca, e que visa promover o seu poder e invisibilizar o contributo da população negra para o progresso social, cultural e económico do país: “pacto narcísico da branquitude”.

“Le Pacte de la blanchité” é um ensaio essencial para quem desejar compreender o compromisso tecido pela “branquitude” brasileira com o intuito de preservar a estrutura racial que a privilegia.

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