Lusodescendente Cristèle Alves Meira apresenta em Cannes um microcosmo familiar e transmontano

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A realizadora luso-francesa Cristèle Alves Meira regressa esta semana ao festival de cinema de Cannes, com a longa-metragem “Alma Viva”, um microcosmo sobre laços familiares, emigração, misticismo e a cultura transmontana.

“Alma Viva”, produzido pela Midas Filmes em coprodução com França e Bélgica, é a primeira longa-metragem de Cristèle Alves Meira e estreia-se na quarta-feira na Semana da Crítica, em paralelo ao festival de Cannes, onde a realizadora já apresentou anteriormente duas curtas-metragens.

O filme foi integralmente rodado em Junqueira, uma aldeia transmontana do concelho de Vimioso, onde a realizadora tem raízes maternas, e as filmagens, feitas no verão passado, contaram sobretudo com atores não profissionais da localidade.

“A aldeia tornou-se no ‘décor’ do cinema e isso permitiu-me muita liberdade, porque tínhamos tudo. É como se fosse um ‘décor’ de cinema falso, mas foi uma aventura muito familiar, muito intensa e reduzida no espaço”, recordou Cristèle Alves Meira à Lusa.

“Alma Viva” centra-se em Salomé, uma menina, filha de emigrantes portugueses em França, que passa o verão numa aldeia com a avó, com quem tem uma forte ligação afetiva e espiritual.

Salomé irá testemunhar a morte da avó e suspeita que esta foi envenenada por bruxaria por outra mulher da aldeia. Enquanto a família organiza o funeral, Salomé acredita que está acompanhada pelo espírito da avó e tenta vingar a sua morte.

“A história foi completamente inspirada em histórias poderosas e misteriosas que ouvi ao pé da lareira. Essas histórias são quase como a memória arcaica de Portugal, a matriz da nossa cultura e eu queria voltar a essas tradições e contar essas histórias no cinema, para estar nessa transmissão de cultura”, explicou Cristèle Alves Meira.

Filha de um minhoto e de uma transmontana que emigraram para França, Cristèle Alves Meira mantém a ligação a Portugal e às origens dos pais e assume que este filme tem um pendor autobiográfico, mesmo sendo uma ficção.

“O que eu tenho da Salomé é ter nascido em França de pais portugueses, a aldeia é da minha mãe, as pessoas que aparecem no filme viram-me nascer e crescer. Muitas pessoas do filme são pessoas conhecidas e familiares da minha aldeia. É um filme quase antropológico de uma comunidade, de uma aldeia, dessas aldeias mais isoladas do interior de Portugal com as quais sou muito íntima”, descreveu.

O filme é também um retrato da emigração portuguesa, das famílias que se separam entre os que ficam e os que partem, e das complexas diferenças sociais e económicas que daí nascem.

A realizadora explica que também quis “compreender melhor a violência, a brutalidade” latente no relacionamento de algumas famílias.

“O ponto de partida do filme também foi uma situação de injustiça que senti quando a minha avó morreu. Os meus tios tiveram muitas crises à volta da questão das partilhas, a minha avó ficou dois anos sem sepultura e aquela coisa ficou gravada em mim”, recordou.

O filme “Alma Viva” – que chegou a intitular-se “Bruxa” – estava a ser preparado por Cristèle Alves Meira há vários anos; o argumento foi sendo aperfeiçoado enquanto fazia outros filmes, em particular três curtas: “Sol branco” (2015), “Campo de víboras” (2016) e “Invisível Herói” (2019).

Cristèle Alves Meira diz que estas três curtas são obras independentes, mas “abriram caminho” para a longa-metragem. “Já estavam lá as minhas preocupações e reflexões, que eu estava a tentar desenvolver na ‘longa’. (…) Tivemos um ponto de partida e um ponto de chegada, que é o ‘Alma Viva’”, afirmou.

Cristèle Alves Meira volta à Semana da Crítica para apresentar este filme, uma das sete longas-metragens selecionadas para a competição oficial. “Eles acreditaram em mim desde ‘Campo de Víboras’. É uma prova de amor, quase, mas dá-me muita coragem e força. É mesmo ‘super importante’, porque só são sete filmes e é uma seleção especial e sensível. Eles acompanham os filmes com carinho e são muito focados”, descreveu.

Além de “Alma Viva”, na Semana da Crítica estarão também a curta-metragem de animação “Ice Merchants”, do realizador português João Gonzalez, e, fora de competição, a longa-metragem “Tout le monde aime Jeanne”, de Céline Devaux, filmado em Portugal e coproduzido por O Som e a Fúria.

A 61ª Semana da Crítica, organizada pelo sindicato dos críticos de cinema de França, decorrerá de 18 a 26 de maio.

Sílvia Borges da Silva, Lusa

 

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