Rescaldo das eleições europeias: Abstenção ganhou nas Comunidades mas há “sinais positivos”

As eleições para o Parlamento europeu, realizadas na semana passada, ficaram marcadas por uma forte abstenção em Portugal, acima da média europeia. E a extrema abstenção na emigração veio agravar a situação.

No entanto, o Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas avançou que o número de Portugueses votantes no estrangeiro mais do que duplicou, passando dos 5.100 em 2014 para os 12 mil este ano.

“Nós tivemos, nas últimas eleições, uma participação eleitoral de cerca de 5.100 votantes. Neste momento estamos com uma votação já na ordem dos 12.000 votantes” no sufrágio que escolheu os Eurodeputados portugueses que vão exercer o mandato no Parlamento Europeu, afirmou José Luís Carneiro, classificando este aumento como “muito positivo”.

“Neste momento, os dados que temos – que ainda não são dados definitivos – apontam para um crescimento na ordem dos 140% relativamente às eleições europeias de 2014”, destacou, apontando que “houve países e secções de voto em que o crescimento foi quatro a cinco vezes superior à participação eleitoral de há cinco anos”.

José Luís Carneiro relevou que “raras são as secções de voto em que a votação não tenha duplicado, triplicado e, por vezes, quadruplicado, e isso é muito significativo”, tendo em conta que “este voto é presencial e haver países em que os Portugueses se deslocam várias centenas de quilómetros, dezenas de quilómetros para poderem participar nos atos eleitorais”.

De acordo com o governante, o número de Portugueses recenseados no estrangeiro também cresceu, para os “1.431.000 de cidadãos recenseados no estrangeiro” com o recenseamento automático. Mas este número avançado pelo Secretário de Estado está errado porque se aplica unicamente às eleições Legislativas. Para o Parlamento Europeu, os Portugueses residentes no estrangeiro escolhem em que país querem votar e os cidadãos com dupla nacionalidade, muitas vezes são obrigados a votar nos países de residência se o voto aí for obrigatório, como é o caso, por exemplo, da Bélgica.

“Claro que a abstenção é muito significativa mas, como sempre afirmei, o mais importante na noite das eleições é avaliar o número daqueles que, pela primeira vez, tiveram condições para participar nos atos eleitorais do seu país”, advogou.

Ainda assim, o Secretário de Estado das Comunidades notou que “estes resultados ilustram que o esforço que foi desenvolvido para garantir o recenseamento automático teve já uma primeira expressão cívica no modo como cresceu a participação eleitoral dos Portugueses” e assinalou que este momento “marca uma viragem histórica nas condições de participação dos Portugueses”.

O responsável elencou que, a par do recenseamento automático, também “o reforço das secções de voto em mais de 20% criou melhores e maiores condições para garantir a participação dos portugueses no estrangeiro nestas eleições”.

“Temos todas as condições para, com esse passo decisivo que foi dado com as alterações às leis eleitorais, os Portugueses possam, cada vez mais, sentir-se mais vinculados cívica e politicamente a Portugal”, vincou.

 

Emigrantes queixam-se

No entanto, vários representantes da emigração defenderam que nada foi feito para que os emigrantes fossem votar nas eleições europeias, reclamando mais ação dos Partidos e do Governo portugueses na mobilização dos eleitores.

Na emigração, a abstenção situou-se nos 99%, e isto marcou a reunião dos membros do Conselho Permanente das Comunidades Portuguesas (CCP) com os deputados da Comissão Parlamentar de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas.

“Estamos todos recenseados, mas nada foi feito para irmos votar. Nenhum Partido fez campanha, não houve informação”, disse António Cunha, que representa os Portugueses residentes no Reino Unido. O Conselheiro adiantou que, no Reino Unido, quem votou foram os Portugueses recém-chegados e que as Comunidades não tiveram acesso a qualquer tipo de informação ou campanha de sensibilização para o voto. “É como dar um prato e não podermos comer”, disse, alertando que com as eleições legislativas à porta é preciso repensar estas questões.

Nelson Ponta Garça, dos Estados Unidos, classificou o recenseamento automático como “a maior vitória” das Comunidades nos últimos anos, mas apontou falhas aos Partidos e à Administração eleitoral na forma de comunicar com as Comunidades, defendendo uma maior aposta nas redes sociais. “Já não estamos no tempo dos dinossauros”, disse, considerando que as mensagens de sensibilização para o voto através das emissões internacionais da televisão pública não chegam à maior parte das Comunidades.

Por outro lado, considerou o nível de abstenção entre os emigrantes um “sinal de descontentamento das Comunidades” com o atual estado da rede consular. “A rede consular está rebentada, estoirada, miserável. É a preocupação número um das Comunidades e é essencial resolver esta questão”, disse.

Conselheiros e deputados apontaram falhas na votação em países como a França, Bélgica ou Luxemburgo, onde os Portugueses com dupla nacionalidade não conseguiram votar para a eleição de Eurodeputados portugueses, defendendo a necessidade de analisar estas questões com vista a fazer os ajustamentos possíveis.

O deputado do PSD eleito pelo círculo da Europa, Carlos Gonçalves, que presidiu à reunião, ressalvou o facto de nem todos os Portugueses com Cartão de Cidadão terem podido votar.

Pedro Filipe Soares, do Bloco de Esquerda, deu conta de Portugueses impedidos de votar na Alemanha devido ao que considerou “interpretações abusivas” por parte dos serviços consulares da legislação relativamente à opção entre eleger Eurodeputados portugueses ou alemães. “Se for preciso fazer alterações estamos em contrarrelógio para as legislativas”, alertou.

No mesmo sentido, o social-democrata José Cesário, eleito pelo círculo Fora da Europa, lembrou que nas eleições legislativas os emigrantes têm de optar entre votar por via postal ou presencialmente e que este processo ainda não se iniciou. “Isto vai criar problemas, principalmente nos locais onde os correios não funcionam ou funcionam mal”, disse.

Odete João, do Partido Socialista, considerou que o recenseamento automático “foi um passo fundamental” e “de gigante” no sentido da maior participação eleitoral dos emigrantes, apesar dos “problemas próprios de um processo novo”.

Com as legislativas de 06 de outubro no horizonte, todos os Partidos políticos se comprometeram a reforçar o trabalho de divulgação e sensibilização para o voto junto da emigração. “Temos de trabalhar no sentido de garantir maior proximidade das mesas de voto aos eleitores”, disse Paula Santos, do PCP.

 

PSD manifestou preocupação

O Deputado do PSD José Cesário manifestou preocupação com os níveis de participação dos emigrantes nas eleições europeias, que considerou “ridiculamente baixos”, mas assinalou “com satisfação” o aumento de número de votantes.

“É inquestionável que votou bastante mais gente, mais do dobro de pessoas que tinham votado nas últimas europeias, o que pode prognosticar que nas Legislativas possamos vir a ter também um aumento dos votantes”, disse José Cesário.

Por outro lado, o Deputado do PSD eleito pelo círculo Fora da Europa considerou “preocupante” que os níveis de participação continuem muito baixos, com a abstenção a situar-se nos 97%. “A abstenção é maior em termos relativos do que em 2014. Este resultado é preocupante porque traduz níveis de participação muito baixos, ridiculamente baixos”, adiantou.

Desinteresse pelas eleições para o Parlamento Europeu, falta de informação e locais de voto insuficientes foram para o ex-Secretário de Estado das Comunidades alguns dos fatores que concorreram para a dimensão da abstenção. “Teria feito sentido o que o Governo tinha prometido que era criar mais uma centena de mesas de voto. Isso não se verificou e houve até queixas significativas em algumas Comunidades, particularmente na França e na Alemanha, de que, em alguns casos, até houve redução”, disse.

Para José Cesário, “há que fazer muito mais para que haja mais gente a votar”, sublinhando a responsabilidade de Governo, comunicação social e partidos políticos na mobilização dos eleitores. “Admito que tenha havido muita gente que nem se quer se tenha apercebido que havia eleições para o Parlamento Europeu. É um órgão que diz pouco às pessoas em geral, particularmente a quem está lá fora, e fora da Europa ainda menos”, apontou.

Sobre os resultados alcançados pelo PSD nos círculos da emigração – Europa e Fora da Europa – José Cesário, sublinhou os “sinais positivos”, traduzidos numa vitória do Partido na votação global dos emigrantes. “O PSD voltou a ganhar as eleições globalmente na emigração e de uma forma muito expressiva fora da Europa, sobretudo nas Américas e em África. Quando faltavam apurar três Consulados, o PSD venceu as eleições para o Parlamento Europeu nos círculos da emigração com 28,86% dos votos, contra 25,08% do PS.

 

PS cantou vitória na Europa

Já o Deputado socialista Paulo Pisco destacou o “aumento expressivo” de votantes para o Parlamento Europeu nos círculos da emigração, considerando, por outro lado, que a “elevada abstenção” continua uma preocupação. “O recenseamento automático […] teve como consequência um aumento expressivo de votantes, que nos dois círculos da emigração passou de 4.844 para 13.053”, apontou Paulo Pisco.

Numa análise aos resultados das eleições europeias na emigração, o Deputado, eleito pelo círculo da Europa, sustentou, por outro lado, que “a elevada abstenção (97%) continua a ser uma preocupação […], não obstante ter havido mais 20 por cento de mesas de voto do que nas eleições europeias de 2014”.

Nesse sentido, sustentou Paulo Pisco, “as próximas eleições legislativas de 06 de outubro, em que o voto será feito por correio e com porte pago, serão o momento ideal para que as Comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo possam demonstrar a sua força”.

Sobre os resultados alcançados pelo PS, Paulo Pisco considerou que o seu Partido teve uma “grande vitória” na Europa. “O PS ganhou em todos os principais países com Comunidades portuguesas mais numerosas, como a França, Suíça, Alemanha, Luxemburgo, Reino Unido, Bélgica, Holanda e Espanha”, disse. “No círculo de Fora da Europa, não obstante o Partido Socialista ter perdido, apresenta resultados muito encorajadores em várias áreas consulares”, acrescentou.

Nestas eleições europeias, Portugal elegeu os seus 21 representantes num Parlamento Europeu com 751 lugares. O PS foi o partido mais votado, com nove eleitos e cerca de 33,4% dos votos, seguindo-se o PSD, com 21,9% e seis mandatos. O BE obteve 9,8% e dois eurodeputados, os mesmos que a CDU, apesar de a coligação entre PCP e PEV só ter conseguido 6,9% dos votos. O CDS-PP ficou em quinto, com 6,2% e um mandato, e o PAN em sexto, com 5,1%, elegendo pela primeira vez um Eurodeputado.

A abstenção global – em território nacional e no estrangeiro – foi de 69,05%. No estrangeiro foi de 99,04%.

 

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