Mazé Torquato Chotil diz que “o Brasil tem a memória curta”

Mazé Torquato Chotil é brasileira, nasceu no Mato Grosso do Sul, mudou-se para São Paulo e mora em Paris desde 1985, onde é escritora e jornalista.

Os pais de Mazé Torquato Chotil viviam no Ceará, no nordeste brasileiro e migraram para o sul, no quadro da “colonização” daquele Estado brasileiro, na época de Getúlio Vargas.

O primeiro livro que editou em França foi precisamente a partir de uma tese que defendeu na Ecole des Hautes Etudes Sociales de Paris, sobre os “Trabalhadores exilados – a saga dos brasileiros forçados a partir entre 1964 e 1985”.

Seguiu-se um outro livro, intitulado “Minha aventura na colonização do Oeste” em que fala precisamente da chegada dos pais ao Mato Grosso.

No quadro da “colonização” os pais de Mazé Torquato Chotil podiam obter 12 hectares de terreno na floresta para “desmatar”. Chegaram a Dourados com dois filhos, depois de uma viagem que durou cerca de um mês. A escritora já nasceu no “sitio”. “Eu costumo dizer que nasci no meio da floresta” diz ao LusoJornal numa entrevista “live” conduzida por Dominique Stoenesco.

“Lembranças do Sitio” é outro livro de Mazé Torquato Chotil, precisamente com as lembras da “fazenda” que o pai foi cultivando. Foi um trabalho árduo o de cortar árvores e tornar os campos cultiváveis.

Até que a mãe da escritora decidiu que os 8 filhos do casal deviam ir para a escola e convenceu o marido a mudarem-se para a “vila” de Dourados, hoje com mais de duzentos mil habitantes.

“O ‘sitio’ era um vilarejo, nem tinha cartório. Eu nasci em 1958 e só um ano depois é que houve a possibilidade de fazer o meu registo” explica a escritora ao LusoJornal. “O meu pai gostava mais da fazenda, nunca gostou de ser comerciante. Ele só estudou dois anos, não tinha condições de lidar com o comércio, mas a minha mãe tinha essa força motora, como muitas mães na época” e conseguiu que os filhos fossem para a escola.

O “retrato” que Mazé Torquato Chotil faz de Dourados é um autêntico “documento histórico”. “As pessoas do Rio de Janeiro e de São Paulo não conhecem o que era o Mato Grosso naquela altura. Tenho trabalhado muito com as escolas do Mato Grosso do Sul porque na realidade, em 50 e 60 anos, mudou muito. É muito importante que as populações de hoje conheçam o passado”.

Um outro livro interessante de Mazé Torquato Chotil é “José Ibrahim – o líder da primeira grande greve que afrontou a ditadura”.

Já em São Paulo, Mazé Torquato Chotil fez estudos de jornalismo e trabalhou para a imprensa local. Foi assim que conheceu e entrevistou José Ibrahim na segunda metade dos anos 60, o mais importante líder sindical do sindicato dos metalúrgicos de Osasco. Foi preso, depois foi trocado por um Embaixador americano que foi sequestrado e acabou por fugir para Cuba, para o Chile e acabou por vir morar na Bélgica. Vinha regularmente a Paris trabalhar com a CFDT e com a Federação dos metalúrgicos de Paris, com quem organizou a formação clandestina de sindicalistas brasileiros.

“Eu cheguei a São Paulo com 16 anos, em 1974, em plena ditadura” explicou Mazé Torquato Chotil. “Mas o Brasil tem a memória curta. José Ibrahim esteve 10 anos ausente do país e quando regressou ajudou a criar o PT com o Lula, mas ele tinha-se tornado um desconhecido e o Lula nunca quis muito debate com os exilados, não só com José Ibrahim, mas com os outros também” conta ao LusoJornal.

Mazé Torquato Chotil escreveu ainda uma biografia muito interessante sobre a cantora brasileira Maria da Aparecida, que viveu em Paris e a sua mais recente obra é um livro sobre a “Rota dos traficantes de obras de artes”.

“Muita gente está envolvida no mercado da arte entre a fronteira do Paraguai com Mato Grosso do Sul. Há muita coisa que passa, não apenas droga” disse a escritora. O tráfico de obras de arte passa também por São Paulo e por Marseille, onde as obras encontram compradores no universo dos “novos ricos” e dos mafiosos.

De dupla nacionalidade franco-brasileira, Mazé Torquato Chotil adora Paris e gosta de vaguear pela capital da França, tendo-lhe também dedicado um livro: “Minha Paris Brasileira”.

Todos os livros de Mazé Torquato Chotil estão à venda na Livraria Portuguesa & Brasileira de Paris.

 

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LusoJornal