Lusa | José Sena Goulão

Pedro Filipe Soares (BE) quer que Portugueses de França façam valer os seus direitos nas eleições

Pedro Filipe Soares, líder da bancada parlamentar do Bloco de Esquerda, participou este fim de semana, em Paris, na reunião do Núcleo Europa do BE. Uma oportunidade para o LusoJornal abordar as próximas eleições legislativas portuguesas, bem como as Europeias.

Pedro Filipe Soares também falou das ligações entre o BE e a “France Insoumise”, sem esquecer os emigrantes para quem deixou uma mensagem.

Qual é a importância da reunião que ocorreu em Paris no passado sábado?

Criámos há dois anos o Núcleo Europa do Bloco de Esquerda e a reunião em Paris insere-se nesse trabalho. O momento político é muito relevante, em vésperas de eleições europeias e de eleições legislativas. Esta reunião permite a renovação do mandato do Núcleo Europa e discutir esses dois momentos fundamentais para a política e para as escolhas que serão feitas para as eleições. É o momento certo antes dos desafios que temos pela frente.

A França tem uma importância particular para o BE?

Para a Europa, tem uma importância particular. Para o Bloco, tem uma importância porque é o país onde temos uma maior organização e onde temos uma maior representação enquanto Partido. Do ponto de vista simbólico e político, é também uma referência, quanto mais não seja pelos direitos, a igualdade, a liberdade e a fraternidade lançadas para o mundo. E também nas disputas que vemos atualmente, como por exemplo os Coletes Amarelos. Uma reivindicação por direitos, muitos deles, laborais. Muitos deles são exemplos de como podemos ter uma sociedade civil engajada na defesa e luta por direitos. Esta reivindicação de que a realidade nos pode trazer um futuro melhor e não apenas um futuro pior, é simbolizada pelo que estamos a fazer em Portugal, e pela reivindicação que acontece aqui em França. É aqui onde se tomam muitas decisões que acabam por ter um efeito propagador pela Europa. Nós de França, temos de ajudar essa movimentação social que ajuda a ter mais direitos. No fundo termos uma Europa mais para as pessoas e menos para os bancos.

Os Portugueses fora de Portugal têm cada vez mais peso?

À escala europeia, o número de Portugueses fora, é um número relevante. Temos neste momento mais de um milhão de pessoas inscritas no recenseamento do que havia há quatro anos atrás. No total são mais de um milhão e 300 mil pessoas, isto porque houve uma mudança de paradigma, com o recenseamento automático das Portuguesas e Portugueses que estão fora de Portugal. Aliás foi aqui nesta sala, em Gentilly, que começámos a traçar esse plano. Viemos aqui discutir há três anos atrás uma proposta de lei que deu o pontapé de saída para este debate. Depois tivemos o acompanhamento do Governo, do PS, do PSD. É resultado da ação direta do Bloco de Esquerda. É preciso dizer que sendo cidadãos e cidadãs portugueses e portuguesas, eles têm todo o direito de poder votar. Estamos agora a escrever a primeira página de um novo livro: agora a discussão será se essa possibilidade de representação vai levar a uma maior mobilização. Os olhos estarão virados para avaliar a abstenção nestas eleições legislativas. Nós acreditamos que haverá um retorno deste investimento da atenção porque não há cidadãos de primeira e de segunda no nosso país. Cidadãos não podem ser considerados de segunda por estarem fora do país. Esta atenção, esta nova fase do relacionamento entre o Estado português e os Portugueses que estão fora de Portugal, esperamos nós, acreditamos nós, que vai ser a construção de elos de ligação que terão também no voto um aspeto importante. Tem de haver na sequência disto uma aproximação do Estado português como as Comunidades portuguesas. No período da Troika, houve cortes nessas ligações, mas é um desafio para o futuro. Portugal ainda tem um caminho a trilhar nessa matéria. Esperemos que nas próximas eleições as vozes dos Portugueses e Portuguesas fora de Portugal possam dizer: ‘Atenção nós existimos e queremos que os nossos direitos sejam representados e sejam respeitados, e por isso o Estado tem que ter nas suas prioridades também a nossa existência’. Esse grito pode ser ouvido nas eleições. Portugal tem esta riqueza: um território nacional relativamente pequeno à escala mundial, mas tem uma população espalhada pelo mundo que tem uma grande proximidade. Todos nós formamos uma coesão. Não podemos abandonar ninguém.

As eleições europeias estão a aproximar-se, há um medo da subida da Extrema-direita?

Essa é uma realidade difícil de abordar para a realidade dentro de Portugal, e no entanto é uma realidade bem presente fora de Portugal. Em território nacional não se sente esta pressão da Extrema-direita, mas nós enquanto agentes políticos, percebemos que não existimos como uma ilha. E por isso sempre tivemos a vontade de criar laços internacionais para uma ação à escala europeia. Havendo um Parlamento europeu, havendo uma interligação de funções administrativas, tem de haver uma capacidade de representar politicamente os cidadãos e as suas ideias a esta escala. Um desafio para Portugal é saber criar as alianças que garantam para uma força política como o Bloco de Esquerda que os seus valores, as suas ideias possam ter aliados à escala europeia. Isto tudo para que sejam debatidas no Parlamento europeu. Nesses debates europeus sentimos que há uma pressão da Extrema-direita, que está a mudar a Europa e a União Europeia. Este é um dos perigos que temos ao virar da esquina nestas eleições europeias. Se a Extrema-direita sair vencedora, terá as forças para magnetar a agenda europeia com um pensamento nacionalista que nos separa mais do que nos une, ou se a Esquerda vence e consegue ter um papel determinante para relançar um debate onde se quer solidariedade, cooperação entre os povos, quer dizer uma forma de afirmação do espaço europeu, num contexto global que não é fácil, é adverso. Sabemos que há escolhas do passado que foram erradas, em que os Partidos do Centro, do Centro-esquerda ou do Centro-direita, sempre pensaram mais na situação dos bancos, e não com a situação dos povos. Em Portugal sentimos que fomos quase punidos e isso ainda está bem marcado em Portugal. Isso não é só uma realidade portuguesa. Em França, não tendo havido uma Troika, sentiu-se no entanto a austeridade, com retirada de direitos do trabalho, com pressão sobre os salários, houve formas de criação de precariedade para reduzir os direitos das pessoas, quer dizer no fundo reduzir a qualidade de vida das pessoas. Esse debate falhou. Chegamos a uma polarização em que a escolha é entre uma Direita, ultradireita, xenófobas, racista, nacionalista, que engana as pessoas com mensagens de ódio, ‘dividir para reinar’, ou se vai ganhar uma mensagem que diz que os povos valem mais do que as elites e que é possível haver uma cooperação que defenda os direitos dos povos.

A “France Insoumise” é um Partido próximo do BE?

Há características diversas. As características diversas são quer dos Partidos, quer dos temas políticos, ou da forma de organização, da forma do ativismo social, do relacionamento com as populações. Há identidades que são de cada Partido, mas há valores que nos aproximam com o “Podemos” em Espanha, com a “France Insoumise” em França, ou ainda com a Esquerda nórdica. Temos pontos de ligações que levamos para estas eleições europeias. É uma aliança inter-Partidos, internacional, de várias nações, de Partidos de várias nacionalidades e que nos permite dizer que não temos apenas um projeto nacional, mas sim um projeto para a Europa. Essa é a nossa força. Este movimento teve como origem o Bloco de Esquerda, a “France Insoumise” e o “Podemos”, e desde então tem vindo a alargar-se para mais países. Em Portugal, olhamos muito para o que se passa politicamente em França, é devido à proximidade das nossas relações porque muitos têm familiares em França, como eu. Naturalmente vamos entendendo os debates internos de cada país. Temos tido um diálogo positivo com a “France Insoumise” e o Jean-Luc Mélenchon. Esperemos que possa dar resultados nas eleições europeias.

O que se pode esperar das próximas Eleições Legislativas?

Estas eleições legislativas vão ser como uma avaliação, um balanço, que as pessoas fazem do que aconteceu nos últimos quatro anos: dos sucessos, dos insucessos, das insuficiências de uma nova situação politica, que muitos viram como nova em 2015, ou como inesperada. Tem agora o primeiro momento de avaliação. De certa forma as Europeias também são uma avaliação a esta forma de política. O PS sempre colocou as metas impostas por Bruxelas como escritas na pedra. Algo que o Bloco de Esquerda sempre questionou, porque sempre dissemos que o nosso país com as contas públicas que tem, nós temos um superavit primário dos maiores da Europa, isto depois de todas as despesas e os salários serem pagos, com exceção do pagamento da dívida. O problema é que depois entra a dívida, e estamos em défice, acabando por pressionar os serviços públicos e os direitos das pessoas. Essas insuficiências também estarão ligadas a estas eleições europeias e às eleições legislativas. A nossa proposta para as eleições legislativas é pedir às pessoas para que olhem para o que o Bloco de Esquerda conseguiu fazer em quatro anos, com 19 Deputados e com pouco mais de 10% dos votos: conseguimos aumentar o salário mínimo, algo que o PS não queria, conseguimos aumentar por três vezes as pensões, algo que o PS não queria, conseguimos criar um combate à precariedade no Estado, algo que o PS nem abordava, conseguimos reduzir os impostos sobre o trabalho, muito mais rapidamente do que o PS propunha. Com esta força fomos determinantes. Com os votos de 2015 conseguimos mostrar que as nossas ideias são capazes de serem postas em prática e são positivas para as pessoas, para a economia, para as contas públicas. As conclusões são que um Bloco com mais força pode fazer ainda mais a diferença. As pessoas têm de avaliar os Partidos e é preciso notar que o PS em 2019, veio dizer que todos os esforços, os bons resultados vão ser colocados no Novo Banco, não aprendendo que o que deve ser a prioridade de governação não são os bancos, são as pessoas. O PS parece não ter aprendido durante estes quatro anos. Nas eleições legislativas, vamos ver se as pessoas vão dar mais um passo com aqueles que provaram que fazem a diferença, como o Bloco, ou se o medo vai voltar. Em 2015 demos um grito enorme. Temos de continuar e mostrar que o futuro pode ser bem melhor que o presente e deixar de ter medo.

Uma mensagem para os Portugueses de França?

A distância é um problema porque acredita-se que a distância cria barreiras. Mas Portugal é pequenino. Temos de nos lembrar que aqueles que estão fora têm familiares em Portugal, e aqueles que estão em Portugal têm familiares fora. Essas ligações fazem com que saibamos todos o que se passa e como se passa dos dois lados. Não podemos deixar que a distância se transforme em afastamento político porque isso é uma forma de desresponsabilizar os poderes públicos. O Bloco de Esquerda vem a Paris também dizer que nós não deixamos ninguém de lado no que toca aos Portugueses que estão fora do país. Todos os emigrantes fazem parte de nós e queremos protegê-los. Os Portugueses não podem ser esquecidos e têm de ser uma forma de pressão. Mesmo fora de Portugal é possível lutar para ter ganhos em Portugal. Os nossos membros mostram sempre serem ativos em Portugal, mas também nos países de residência como a Cristina Semblano em França. Temos de ter em mente que devemos agir, a qualquer nível que estejamos. Todos temos um papel para fazer a diferença. Sempre que os povos se demitem, quem ganha são as elites, os bancos, os milionários. Quando os povos decidem fazer a diferença, eles têm medo e recuam. Podemos todos juntos fazer a diferença.